História dos Concílios Gerais da Igreja
Há muitas maneiras de estudar a História
da Igreja Católica, é uma delas é olhar as decisões conciliares nestes
dois milênios da Igreja. Um Concílio Geral consiste numa reunião formal
de representantes da Igreja, junto com o Papa (mas nem sempre), para
tomar decisões dogmáticas e pastorais, que possam ajudar no crescimento
da Igreja, na eliminação dos erros e na difusão das verdades da fé. Em
dois mil anos de existência, a Igreja reconhece 21 Concílios Gerais e
ainda acrescenta o chamado “Concílio de Jerusalém”, reunião narrada nos
Atos dos Apóstolos (At 15,1-40), como parte da Tradição da Igreja e dos
seus ensinamentos. Não há nenhuma regra para que um Papa convoque um
Concílio, ou seja, a constituição de um Concílio geralmente nasce de uma
necessidade eclesial ou do desejo do Papa em solucionar certas crises
na Igreja.
Pedagogicamente podemos dividir os 21
Concílios Gerais da Igreja em quatro períodos. Os Concílios ficaram
conhecidos pelos nomes das cidades onde o Papa, bispos e outros
representantes da Igreja se reuniam para discutir os assuntos de fé e
doturina.
1. Concílios do Primeiro Milênio:
Niceia I (325), Constantinopla I (381), Éfeso (431), Calcedônia (451),
Constantinopla II (553), Constantinopla III (680-681), Niceia II (787),
Constantinopla IV (869-870).
2. Concílios Medievais: Latrão I
(1123), Latrão II (1139), Latrão III (1179), Latrão IV (1215), Lyon I
(1245), Lyon II (1274), Vienne (1311-1312).
3. Concílios da Reforma: Constança
(1414-1418), Basileia-Ferrara-Florença-Roma (1431-1445), Latrão V
(1512-1517), Trento (1545-1548/1551-1552/1562-1563).
4. Concílios da Idade Moderna:
Vaticano I (1869-1870), Vaticano II (1962-1965). Vamos falar um
pouquinho sobre cada um deles. Não é nosso objetivo aqui descrever
detalhadamente cada um desses concílios, mas apenas ilustrar alguns
fatos ocorridos em cada um deles. Para maiores informações, no final,
oferecemos uma bibliografia sobre o assunto.
1.
Concílios do Primeiro Milênio: a Igreja Católica reconhece oito
Concílios Gerais desse período. Os seis primeiros estão ligados entre
si, uma vez que os assuntos de um se arrastavam para o outro. Eles
trataram de assuntos de ordem doutrinal e teológica, na definição das
grandes verdades da fé, como a divindade e humanidade de Jesus, o
mistério da Trindade, a relação de Maria e Jesus. Os outros dois
trataram de assuntos distintos, como o culto aos santos (Niceia II) e a
estrutura da interna da Igreja (Constantinopla IV).
a) Niceia I: o assunto central desse
concílio foi combater a heresia do Arianismo, que pregava a humanidade
de Jesus e quase desconsiderava sua divindade. Foi convocado pelo
Imperador Constantino e o Papa Silvestre I nem compareceu, mas mandou
dois delegados. Havia grande problema com definições dogmáticas por
causa da língua (grega e latim) e a questão do Arianismo, ainda que
considerada herética, não foi resolvida e ainda levantou outras
perguntas referentes a natureza de Jesus e da Santíssima Trindade.
b) Constantinopla I: foi convocado
pelo imperador Teodósio. O texto original desse concílio se perdeu no
tempo. Houve discussão sobre o arianismo e novamente foi escrito um
credo cristão (niceno-constantinopolitano), colocando o Espírito Santo
no mesmo patamar do Pai e do Filho. O papa Dâmaso não compareceu nem
mandou delegados do ocidente cristão, mas ainda assim este concílio é
considerado legítimo e parte da história da Igreja.
c) Éfeso: continuam as discussões
cristológicas, sobre a natureza e vontade de Jesus Cristo. Também surge a
questão relacionada com Maria e o Nestorianismo, que negava a
maternidade divina da mãe de Jesus. O papa Celestino delegou Cirilo para
representá-lo e a tese que venceu foi que Maria era também Mãe de Deus -
“Theotokos” - ou seja, a unidade de Jesus foi garantida. Também foi
decidido que nenhuma mudança no Credo Católico poderia ser feita
posteriormente.
d) Calcedônia: este concílio
reuniu-se para tentar ainda dizimar dúvidas que surgiram na doutrina
sobre Jesus e a Santíssima Trindade. Foi um momento conturbado, no qual o
papa Leão I apresentou um documento que resumia as principais doutrinas
da Igreja até então. A principal decisão desse encontro foi a afirmação
já feita anteriormente que Jesus é uma pessoa com duas naturezas
distintas, humana e divina. Também reafirmou-se o Credo
Niceno-Constantinopolitano. O papa Gregório I irá dizer mais tarde que
estes primeiros quatro Concílios deveriam ter o mesmo prestígio dos
Evangelhos pois são a coluna da fé católica.
e) Constantinopla II: convocado pelo
Imperador Justiniano, este concílio foi conturbado e politicamente
complicado. Havia ainda ranços heréticos do nestorianismo e do
monofisismo para serem descartados. O papa Vígilio não compareceu, por
que ele mesmo, extraoficialmente, parecia ser adepto da heresia do
monofisismo. Acuado pelo imperador, o papa precisou voltar atrás e ceder
em suas posições heréticas.
f) Constantinopla III: pode parecer
absurdo, mas o centro desse concílio foi a vontade de Jesus: ele tinha
vontade humana ou divina? A heresia do monotelismo, que afirmava que
Jesus fundia em si as duas vontades foi derrotada. Assinado pelo Papa
Agatão, este concílio fortaleceu ainda mais a tradição doutrinal que
vinha sendo construída desde Niceia I.
g) Niceia II: passado o período
crítico das heresias, o concílio de Niceia II abordou uma questão
litúrgica prática: a veneração dos ícones e imagens dos santos e de
Maria, situação conhecida com Iconoclastia. O papa Adriano I defendeu o
uso das imagens como forma “artística” para ajudar na difusão do
evangelho e de seus valores. Também foi aprovada a veneração de
relíquias nas Igrejas.
h) Constantinopla IV: momento
conturbado, este concílio foi mais político que eclesial ao colocar como
questão de fundo o verdadeiro patriarca de Constantinopla, Fócio ou
Inácio. As disputas foram acirradas e até hoje este concílio é
considerado o mais irrelevante da história.
2.
Concílios Medievais: o poder do papado atingiu seu auge na Idade
Média e os concílios desse período foram dedicados à organização da
Igreja e ao controle de suas estruturas internas. Os documentos
conciliares são aprovados exclusivamente pelo Papa, que passa a convocar
e coordenar os trabalhos com pulso de ferro. Uma linguagem legalista e
menos teológica invade os documentos conciliares e reafirma uma
monarquia papal. O conjunto desses sete concílios pode ser visto dentro
de um único conjunto de fortalecimento da hierarquia eclesiástica.
a) Latrão I: Latrão era a residência
do Papa em Roma. Nessa residência acontecerão quatro concílios, todos
reafirmando o poder papal na Igreja. O papa Calisto II impôs um ritmo
formal ao encontro, que decidiu sobre as “investiduras”, ou seja, a
nomeação de cargos eclesiásticos por leigos. Outro assunto foram as
cruzadas à Terra Santa, que entrariam na pauta nos próximos concílios.
b) Latrão II: sem muita novidade,
este concílio simplesmente reforçava a autoridade papal sobre a vida da
Igreja local pelo mundo afora. A readmissão e o castigo aos heréticos
entraram em pauta e este concílio começou a descrever com detalhes como
deveriam ser tratados os infiéis. Foi convocado por Inocêncio II.
c) Latrão III: contou com um
participação inédita em termos de concílio, conseguindo reunir
participantes de quase todas as partes da Europa e delegados orientais. A
afirmação da unidade papal foi discutida pois haviam cisma na Igreja e
presença de antipapas. Neste concílio definiu-se as primeiras regras
para a eleição papal a partir do colégio dos cardeais. Este concílio
condenou os heréticos Cátaros e reafirmou suspensão de penitências para
que se dispusesse a ajudar nas Cruzadas.
d) Latrão IV: concílios cada vez mais
esplendorosos tomavam conta da Igreja e nesse encontro mais de 400
representantes de igrejas locais compareceram, além de mais de
oitocentos representantes de instituições religiosas diversas. Neste
concílio temos um “instantâneo” da Idade Média, descrito nos seus
documentos e decisões. Houve grande discussão sobre penas aos heréticos e
como investigar heresias entre as pessoas. Este concílio convocou mais
uma Cruzada à Terra Santa e definiu relações entre cristãos, judeus e
muçulmanos. Foi usada a palavra “transubstanciação” para falar do
mistério eucarístico e estabelecido o dever de comungar ao menos na
Páscoa de cada ano.
e) Lyon I: o objetivo desse concílio
era político, derrubar o imperador Frederico II, acusado de heresia. Na
verdade o papa Inocêncio IV não admitia o sucesso de negociações que
Frederico havia conseguido com os muçulmanos. Este concílio se preocupou
com o financiamento das Cruzadas e prometeu indulgências aos ricos que
doassem dinheiro para as incursões da igreja no Oriente.
f) Lyon II: conduzido pelo Papa
Gregório X, este concílio trabalhou com material trazido pelos bispos de
suas dioceses de origem. Novas regras da eleição papal foram definidas.
A unificação da Igreja Ocidental e Oriental esteve na pauta, com a
retomada da questão do “filioque” (doutrina que afirma que o Espírito
Santo procede do Pai e do Filho e que é rejeitada pelo Oriente Cristão).
A primazia de Roma sobre os patriarcado Orientais também foi pauta, mas
sem solução clara. Outra conquista de Lyon II foi a definição do
Conclave para a eleição do Papa.
g) Vienne: reunido num período em que
o papado residiu em Avinhão (na França) este concílio teve forte
influência secular. O rei francês Filipe queria que o atual papa,
Clemente V, excomungasse seu antecessor, Bonifácio, por heresia, pois
este tinha contrariado o rei francês com relação ao Ordem dos
Templários, ricos cavaleiros medievais. Clemente aparentemente cede, mas
não passa os bens dos Templários para o rei francês e ainda faz um
elogio a Bonifácio no concílio. Também houve a condenação do movimento
das beguinas, uma espécie de vida religiosa paralela na Igreja. Este
concílio também decidiu pelo ensino de idiomas clássicos e quase
extintos nas universidades cristãs, para melhorar o estudo da Bíblia
Sagrada.
3.
Concílios da Reforma: A Alta Idade Média trouxe o maior desafio para
a fé católica, o surgimento de conflitos sobre a autoridade papal e o
começo do movimento protestante. Nesse período temos quatro concílios,
entre eles o concílio de Trento, talvez o mais importante para a Igreja
em todos os tempos. Uns dos temas mais discutidos nesse período foi o
próprio poder dos concílios e se estes tinham autoridade maior do que o
Papa. Esta questão foi chamada de Conciliarismo.
a) Constança: tinha como tarefa unir a
Igreja do Ocidente, que se encontrava numa posição tão frágil que havia
três papas ao mesmo tempo, cada um deles afirmando-se o legítimo
sucessor de Pedro. Convocado pelo Papa João XXIII (este será deposto e
considerado ilegítimo, e seu nome será depois assumido no século XX por
outro papa, aquele que irá convocar o Vaticano II), o Concílio tinha que
enfrentar o cisma para evitar que a Igreja se fragmentasse ainda mais.
Este concílio trará as teses conciliaristas á tona, alegando que o
próprio Papa é sujeito ao Concílio. Constança ainda declarou heréticas
as ideias de Jan Hus, reformador sueco, e o condenou a morte. Este
conturbado Concílio destituiu ainda os outros dois pretensos papas e
elegeu, com cuidado, Martinho V. A última decisão conciliar foi aprovar a
reunião da igreja em concílios a cada cinco anos.
b) Basileia-Ferrara-Florença-Roma:
foi o papa Eugenio IV que convocou o concílio em Basileia, mas depois de
um ano tentou suprimi-lo. Entretanto, os bispo conciliares pressionaram
o papa e ele voltou atrás, acirrando a questão do poder do Concílio
versus o poder papal. A discussão passou pela relação entre a Igreja do
Ocidente e Oriente. Para resolver esta questão, Papa sugeriu a mudança
do concílio para Ferrara e depois para Florença. Alguns bispos
permaneceram na Basileia, e foram excomungados pelo papa. Em Florença a
discussão com a Igreja Oriental abordou questões litúrgicas e a antiga
questão do “filioque”. Estas questões somente aparentemente foram
resolvidas, mas pouco tempo depois tudo voltou a ser como antes e o
cisma permaneceu. O papa ainda transferiu o concílio para Roma onde o
encerrou depois de alguns anos de turbulência. Se Constança viu a
vitória do conciliarismo, em Basileia a força do papado centralizador
voltou a ser hegemônica.
c) Latrão V: Julio II, o papa
guerreiro, reuniu-se em Latrão no começo do século XVI para reafirmar a
força do papado. Seu sucessor, Leão X. continuou o concílio com o ataque
direto e duro contra as teses conciliaristas, afirmando que o concílio
só existe com a presença e confirmação do Papa. Assuntos de disciplina
eclesiástica também entraram na pauta, mas estes seriam mesmo
enfrentados no próximo concílio, o de Trento. Latrão V entra na história
como o concílio que levantou sérios problemas mas que não os enfrentou.
Esta lacuna será fatídica, pois dela brota as críticas protestantes,
sobretudo nas teses de Martinho Lutero. Neste Concílio, pela primeira
vez, um bispo do “novo mundo”, da América, participou das discussões.
d) Trento: este é talvez o concílio
mais falado, conhecido e questionado até hoje. Por mais de 300 anos as
decisões de Trento moldaram a fé católica ao redor do mundo. Trento
nasce de um momento de fraqueza da Igreja, pretende responder ao
crescimento protestante e acaba por afirmar uma eclesiologia
centralizada e centralizadora. Foram temas de Trento os grandes
alicerces da Igreja: hierarquia, sacramentos, Tradição e Escrituras,
costumes, devoções, formação intelectual do clero, poder papal, etc. Ao
mesmo tempo em que defendia a Igreja naquele momento, Trento lançou as
bases do que seria o catolicismo até o século XX. Suas decisões práticas
ajudaram a reorganizar o modo de ser da Igreja, mas ao mesmo tempo,
suas decisões não acompanharam o movimento da sociedade e a Igreja foi
ficando a margem da História.
4.
Concílios da Idade Moderna: entre os 306 anos que separam Trento do
Vaticano I o mundo mudou muito e a Igreja ficou isolada em si mesma.
Ideias iluministas, Revolução Industrial, mudanças políticas no mundo,
tudo foi acontecendo ligeiramente e a Igreja vendo tudo da sacristia,
alheia a realidade. A Igreja parecia ter medo do mundo.
a) Vaticano I: convocado pelo papa
Pio IX teve como principal objetivo, num mundo marcado pela mudança e
democratização das instituições, definir a infalibilidade papal. A
Igreja sentia-se pressionada por dois grupos, um mais reacionário e
outro mais aberto ao novo. Foram mais de 750 delegados neste concílio,
reunidos agora dentro da Basilica de São Pedro em Roma. Os meios de
comunicação, sobretudo o telégrafo, possibilitaram um alcance maior das
notícias conciliares pelo mundo afora. O auge desse concílio foram as
discussões para se chegar a definição que o papa tem “infalibilidade na
sua autoridade doutrinária”, ou seja, a pessoa do papa não é infalível,
mas somente as suas declarações feitas da cátedra de Pedro em questões
de fé e de moralidade.
b) Vaticano II: o último e mais
recente concílio geral da Igreja nasceu do espanto de todos. O velho
papa de transição João XXIII, já com 77 anos, resolveu “arejar” a Igreja
e provocou a maior revolução que a Igreja já conheceu na sua história.
Isolada do mundo, a Igreja, pelo Vaticano II, se viu obrigada a
reorganizar sua vida e recuperar o diálogo com a sociedade circundante.
Uma questão chave esteve presente no concílio: qual a relação entre o
papa e o colégio dos bispos? E qual o papel dos leigos na Igreja? E qual
a relação entre a Igreja e o mundo secular? Nos seus três anos de
trabalho, o Concílio, aberto por João XXIII e concluído por Paulo VI,
revolucionou o modo como a Igreja se via e como ela via o mundo. Passado
cinquenta anos de história, conquistas do concílio já foram
alicerçadas, como a liturgia em língua vernácula, outras parecem
retroceder, como a centralização das decisões em Roma. De qualquer
forma, ainda temos muito que aprender com as decisões conciliares do
Vaticano II, um concílio profundamente pastoral e inovador.
Imagens ilustrativas: Concílio Vaticano II.
https://www.a12.com/redacaoa12/igreja/historia-dos-concilios-gerais-da-igreja
***
19.º
13 de Dezembro de 1545 : Tem início o Concílio de Trento
Décimo nono concílio
ecuménico, reunido em
Trento, na Itália,
entre 1545 e 1563, convocado pelo papa Paulo III no sentido de redefinir aspetos doutrinais
e impor regras de disciplina conducentes
a uma reforma da Igreja.
A chamada Contrarreforma católica não foi uma simples reação à Reforma Protestante. Bem antigas, as suas origens nutriram no seio da Igreja todo um movimento contra os abusos, no sentido de se reencontrar a fé autêntica e desenvolver a instrução dos fiéis. Havia muito tempo que se impunha com urgência a reunião de um concílio ecuménico. Porém, a recordação amarga dos concílios do século XV, de Constança (1414-18) e Basileia (1431-48) particularmente, bem como as ambições políticas do imperador alemão Carlos V Habsburgo e de Francisco I de França, explicam a hesitação papal.
Contudo, na sequência da divisão da Cristandade trazida pela Reforma, que pôs em causa a maior parte dos valores religiosos, das iconoclastias, dos massacres e guerras civis de carácter religioso que dilaceravam a Europa Central (nomeadamente a França), o papa Paulo III (1534-1549) convocou em 1545 o 19.o concílio para Trento, cidade do Império Germânico, no norte de Itália. Era sua intenção acabar com o Cisma e reformar a Igreja Romana para lutar contra as heresias que encontravam terreno fértil na ignorância religiosa e na corrupção dos costumes. Este concílio foi interrompido de 1549 a 1561 e de 1552 a 1560 devido às guerras que assolavam a Europa. Terminou em 1563, tendo tido uma duração real de 8 anos, dos quais os três últimos foram os mais produtivos. Conheceu dez sessões (duas dela, em Bolonha) em três períodos (1545-1549; 1551-1552; 1562-1563), para além de três papas, Paulo III, Júlio III e Pio IV, e uma média de 250-300 delegados conciliares nos trabalhos. Os representantes da Reforma protestante, várias vezes convocados, não compareceram, o que impediu uma solução final em harmonia.
Relativamente aos trabalhos conciliares, os dois primeiros períodos caracterizaram-se por discussões teológicas destinadas a responder às teses protestantes, enquanto o último período se orientou para a reforma da Igreja Católica. Duas questões básicas presidiram às reuniões: o dogma e a disciplina da Igreja.
No que respeita ao aspeto dogmático, as conclusões mais importantes a retirar foram as seguintes: aceitação como texto oficial da Bíblia a tradução latina do texto grego feita por S. Jerónimo (Vulgata); manutenção dos sete sacramentos; afirmação da presença real de Cristo na Eucaristia; declaração de que as doutrinas da Igreja Católica, inicialmente baseadas nas Sagradas Escrituras, se completam com a tradição; imposição de obediência obrigatória de todos os católicos à autoridade papal no domínio espiritual. Defendeu-se também a justificação pelas obras e pela fé, o culto dos santos, imagens e relíquias, e o Purgatório, entre outras disposições. Estas e outras decisões foram mais tarde publicitadas com o nome de Profissão de Fé do Concílio de Trento.
Quanto à disciplina, manteve-se o uso do latim, considerado universal, para todos os atos de culto; impôs-se o celibato obrigatório dos padres; proibiu-se a acumulação de benefícios ou cargos; obrigou-se os bispos e sacerdotes a residir na respetiva jurisdição eclesiástica, bem como os primeiros a visitar regularmente as suas paróquias diocesanas; estabeleceu-se uma idade mínima para o exercício de cargos eclesiásticos, de forma a evitar abusos; por último, entre outras decisões, atendendo à exigência de preparação eficiente do clero (agora ao serviço dos fiéis, de acordo com as normas conciliares), foram criados os seminários.
Nunca antes um concílio promulgara um conjunto tão completo de definições doutrinais e de regras disciplinares e pastorais. O Concílio de Trento não marcou, todavia, nem novidade nem rutura; antes retomou, por meio de uma reformulação jurídica e precisa, as reflexões anteriores, sempre deixadas em aberto, codificando também práticas experimentadas.
Assistiu-se, após o concílio, a um renascimento católico havia muito desejado, ainda que demorasse cerca de um século a implantar-se nos vários países europeus. O sistema de organização e disciplina da Igreja ainda hoje se mantém em grande parte, como é o caso dos livros didáticos de ensino doutrinal (os catecismos), dos seminários e, particularmente, das inúmeras congregações e Ordens religiosas vocacionadas para assistir aos pobres e enfermos, para o ensino (colégios e escolas, como os dos Jesuítas) e para as missões ultramarinas.
Portugal, na figura de D. João III, apoiou firmemente o Concílio, enviando representantes do clero (como Fr. Jerónimo de Azambuja, D. João de Melo e Castro, Diogo de Gouveia, entre muitos outros), que assistiram e trabalharam nas várias sessões. A receção e a aplicação dos decretos coube já a D. Sebastião.
A chamada Contrarreforma católica não foi uma simples reação à Reforma Protestante. Bem antigas, as suas origens nutriram no seio da Igreja todo um movimento contra os abusos, no sentido de se reencontrar a fé autêntica e desenvolver a instrução dos fiéis. Havia muito tempo que se impunha com urgência a reunião de um concílio ecuménico. Porém, a recordação amarga dos concílios do século XV, de Constança (1414-18) e Basileia (1431-48) particularmente, bem como as ambições políticas do imperador alemão Carlos V Habsburgo e de Francisco I de França, explicam a hesitação papal.
Contudo, na sequência da divisão da Cristandade trazida pela Reforma, que pôs em causa a maior parte dos valores religiosos, das iconoclastias, dos massacres e guerras civis de carácter religioso que dilaceravam a Europa Central (nomeadamente a França), o papa Paulo III (1534-1549) convocou em 1545 o 19.o concílio para Trento, cidade do Império Germânico, no norte de Itália. Era sua intenção acabar com o Cisma e reformar a Igreja Romana para lutar contra as heresias que encontravam terreno fértil na ignorância religiosa e na corrupção dos costumes. Este concílio foi interrompido de 1549 a 1561 e de 1552 a 1560 devido às guerras que assolavam a Europa. Terminou em 1563, tendo tido uma duração real de 8 anos, dos quais os três últimos foram os mais produtivos. Conheceu dez sessões (duas dela, em Bolonha) em três períodos (1545-1549; 1551-1552; 1562-1563), para além de três papas, Paulo III, Júlio III e Pio IV, e uma média de 250-300 delegados conciliares nos trabalhos. Os representantes da Reforma protestante, várias vezes convocados, não compareceram, o que impediu uma solução final em harmonia.
Relativamente aos trabalhos conciliares, os dois primeiros períodos caracterizaram-se por discussões teológicas destinadas a responder às teses protestantes, enquanto o último período se orientou para a reforma da Igreja Católica. Duas questões básicas presidiram às reuniões: o dogma e a disciplina da Igreja.
No que respeita ao aspeto dogmático, as conclusões mais importantes a retirar foram as seguintes: aceitação como texto oficial da Bíblia a tradução latina do texto grego feita por S. Jerónimo (Vulgata); manutenção dos sete sacramentos; afirmação da presença real de Cristo na Eucaristia; declaração de que as doutrinas da Igreja Católica, inicialmente baseadas nas Sagradas Escrituras, se completam com a tradição; imposição de obediência obrigatória de todos os católicos à autoridade papal no domínio espiritual. Defendeu-se também a justificação pelas obras e pela fé, o culto dos santos, imagens e relíquias, e o Purgatório, entre outras disposições. Estas e outras decisões foram mais tarde publicitadas com o nome de Profissão de Fé do Concílio de Trento.
Quanto à disciplina, manteve-se o uso do latim, considerado universal, para todos os atos de culto; impôs-se o celibato obrigatório dos padres; proibiu-se a acumulação de benefícios ou cargos; obrigou-se os bispos e sacerdotes a residir na respetiva jurisdição eclesiástica, bem como os primeiros a visitar regularmente as suas paróquias diocesanas; estabeleceu-se uma idade mínima para o exercício de cargos eclesiásticos, de forma a evitar abusos; por último, entre outras decisões, atendendo à exigência de preparação eficiente do clero (agora ao serviço dos fiéis, de acordo com as normas conciliares), foram criados os seminários.
Nunca antes um concílio promulgara um conjunto tão completo de definições doutrinais e de regras disciplinares e pastorais. O Concílio de Trento não marcou, todavia, nem novidade nem rutura; antes retomou, por meio de uma reformulação jurídica e precisa, as reflexões anteriores, sempre deixadas em aberto, codificando também práticas experimentadas.
Assistiu-se, após o concílio, a um renascimento católico havia muito desejado, ainda que demorasse cerca de um século a implantar-se nos vários países europeus. O sistema de organização e disciplina da Igreja ainda hoje se mantém em grande parte, como é o caso dos livros didáticos de ensino doutrinal (os catecismos), dos seminários e, particularmente, das inúmeras congregações e Ordens religiosas vocacionadas para assistir aos pobres e enfermos, para o ensino (colégios e escolas, como os dos Jesuítas) e para as missões ultramarinas.
Portugal, na figura de D. João III, apoiou firmemente o Concílio, enviando representantes do clero (como Fr. Jerónimo de Azambuja, D. João de Melo e Castro, Diogo de Gouveia, entre muitos outros), que assistiram e trabalharam nas várias sessões. A receção e a aplicação dos decretos coube já a D. Sebastião.
Trento. In
Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora,
2003-2013.
wikipedia(Imagens)
Obra que
ilustra uma sessão do Concílio de Trento
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