1jun2021
Nasceu a 5ab1956...Lisboa
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VOZES
Eterno é este instante, o dia claro, as cores das casas desenhadas em aguada rasa, castanhos e vermelhos quase em declive, as janelas limpíssimas, de vidros muito honestos.Este instante que foi e já não é, mal pousei a caneta no papel: eterno Sonhei contigo, acordei a pensar que ainda eras, como é esta janela, como o corpo obedece a este vento quente, e é ágil, mas tudo: tão confuso como são os sonhos Agora, neste instante, recordo a sensação de estares, o toque. Não distingo os contornos do meu sonho, não sei se era uma casa, ou um pedaço de ar. A memória limpíssima é de tie cobriu tudo, e trouxe azul e sol a esta praça onde me sento, organizada a esquadro, como as casas E agora, o teu andar acabou de passar mesmo ao meu lado, igual, e agora multiplica-se nas mesas e cadeiras que cobrem rua e praça, e eu vejo-te no vidro à minha frente, mais real que este instante, e se Bruegel te visse,pintava-te, exactíssima e aqui.E serias: mais perto de um eterno(Eu, que nada mais sei, só o fulgor do breve,eu dava-te palavras –)
ODE À DIFERENÇA
Felizmente.Somos todos diferentes. Temos todos o nosso espaço próprio de coisinhas próprias, como narizes e manias,bocas, sonhos, olhos que vêem céu sem daltonismos próprios. Felizmente.Se não o mundo era uma bola enorme de sabão e nós todos lá dentro a borbulhar, todos iguais em sopro:pequenas explosões de crateras iguais.Assim e felizmente somos todos diferentes. Se não a terapia em grupo era um sucesso e o que é certo é sermos mais felizes a explorar solitários o nosso próprio espaço de manias, de traumas, de unhas dos pés invaloradas pela nossa cultura(que lá no Oriente o pé é o caso sério,motivo sensual e explorativo). Começa por aí: o mundo dividido por atávicos ritmos–e outras coisas somenos como guerras ou fomes (Note Bem:a criatura é céptica e tem um gosto péssimo,mas veja-se outros textos que redimem em sério o que aqui diz. Cf. por ex.o que quiser, mas deixe a criatura regalar-se por se pensar–coitada –incómoda e sonora). Prova evidente de que somos diferentes, felizmente.Começa por aí: no mundo dividido –e continua em raças e raízes. Nós somos portugueses,tão felizes, com tanta história atrás e tantos feitos, tantas coisinhas próprias de delícia: o mar que nos gerou,e o resto tudo, são bolas pequeninas de sabão a atestar da diferençado nosso irmão do lado, esse infeliz cheio de recalques de tradições e línguas,paella e calamares. Tem boca como nós: não canta o fado. Tem pernas como nós: não dança o vira. Contenta-se–coitado –com flamencos chorados e falanges doridas. Somos todos diferentes, felizmente (Note Bem:[se a sua paciência ainda não
fugiu despavorida –é sem dê,mas ela insiste em respeitar o ritmo –]: isto que a criatura repete e reafirma, quando em quando,não deve ser tomado em ligeireza como sinal senil [alterou!],mas como tentativa suicida de oferecer unidade ao que o não tem,moralizar o texto a pouco e pouco,dar-lhe uma ideia igual, ser um mote formal a contrabalançar a tal prova evidente. Que de diferenças estamos todos cheios e isto pretendia-se uma ode e não foi). Felizmente.
IMAGENS
Estragas-me a paz.E eu preciso das minhas solidões,de bocados mentais sem ti.***Começo a ser doença obsessiva ao repetir-me por poemas isto:as tuas invasões à minha paz.(Podia até em jeito original pôr aqui umas notas sobre ti:cf., vide: textos tal e tal)Mas é que a minha paz fica toda estragada quando te penso amor.***Interrompi os versos por laranjas.E volto sempre a ti mesmo que não.É estranho que pacíficas laranjas não me consigam afastar de ti.E que senil te pendure outra vez na mesma corda, as molas sempre iguais e que se chove corra a apanhar-te,não te vás desbotar ou romper,ou sei lá, por húmida metáfora ou bolorenta imagem de cordel.***Mas é que não és tu:sou eu que ando estragada:as minhas solidões não as preciso e a minha paz, coitada,já teve a mesma sorte que os bocados mentais de que falava no verso três da página anterior.
(*) EM CRETA, COM O DINOSSAURO
Nunca lá estive,mas gostava.Também de me sentar a mesa de café descontraída (mesa e eu)e ter à minha frente o dinossauro.Pata traçada sobre a rocha,aquela onde Teseu não descobrira entrada de caverna.Conversaríamos os dois, euna cadeira, ele altamente herbívoro e escamoso,olho macio e muito social.Depois, o fio!Que Ariadne traria, pouco solene e debaixo do braço.Um fio de seda ou prumo ou aço.E o dinossauro,de pouco habituado (ainda assim)a um tempo tão nosso,perguntaria para que era aquilo."Para guiar Teseu", era resposta de Ariadne. E depois,piscando o olho, ainda mais macio que o do monstro escamado,"Ou para o confundir"Convirá referir neste momento que Teseu: entretido no palácio a estudar labirintos com o rei,ignorante de tudo.Na rocha, cheia de algas macias de veludo,abriria o dinossauro em gesto largo as patas dianteiras, aprovando a ideia.Estávamos bem, os três,beberricando calmos o café servido por meteco -bem cheiroso.Enquanto no palácio, o labirinto inchava
e Teseu, ansioso por agradar ao Rei,queimava, de frenético, nobres pestanas gregas.No ar minóico, rescendi ao perfume a laranjas,e, entre vários cafés e golos de retsina,o dinossauro mastigava calmo quatro quilos (à vez) de ameixas secas e doces tangerinas,narrando a nobre paz que se seguira ao caos:não sabia se estrelas em cósmica viagem de chuva de brilhantes,se glaciar medonho reconcertando o ritmo da Terra,se só o seu tamanho –imenso e desumano -a dar lugar ao mito.Em labirinto de muitos milhões de anos, tinha chegado ali. Sem saber como."E como o fio que eu trago aqui, para Teseu", Ariadne diria, "O de aço, seda, ou prumo,que conduz ou confunde, conforme ocasião."–A traição!Derivaria Ariadne, então,falando de Teseu: da traição que,julgava ela,o levaria a abandoná-la em Naxose do compasso incerto do que fora anterior à traição.Poseidon pelas águas reluzia,o destino de Minos e de Cnossos ainda por marcar;só o monstro sabia como deuses e homens:comuns a odiar.Sabia, mas calava. Que silêncio:a virtude maior de sáurio que se preza.E a conversa seria tão calma, tão amena,
que esquecia Ariadne derivações de mito,juntando-se à retsina."Um brinde", proporia o dinossauro,em gesto social."Um brinde", repetiríamos nós (princesa e eu). E o fio de renda fina voaria qual pássaro pré-histórico,até ao mar Egeu.Pata a tapar a boca de franjas inocentes,palitaria então o Dinossauro os dentes...(E do palácio já saiu Teseu.Mapa e espada na mão.Mas sem o fio.)
ENTRE AS DUAS E AS TRÊS
Queria falar do que não tem concerto: as letras desenhadas e compostas com que confundo o espaço do papel, a angústia compassada no contar e a súbita alegria de ser eu penosamente, às duas da manhã Queria escrever do que não tem lugar: a branca, doce e sonolenta estrada onde espaçadas as palavras crescem, suavizadas pelo lento sono que devagar percorre as coisas todas penosamente, às duas da manhã Queria dizer do que não tem conserto: ou seja, eu; ou seja, o papel branco sombrio agora por já ser demais, as letras excedentes e sonoras desmembrando o silêncio e a noite toda penosamente, às duas da manhã Só então falarei do que ficou: compassada alegria desenhada na angústia de dizer sem me contar, o papel confundido de impotente e todavia prontas as palavras. Quase às três da manhã. Penosamente.
ILUSIONISMOS
Repara, meu amor: são duas da manhã e eu ainda aqui a começar (na minha hora que tem sido a hora onde poemas são e se entrelaçam) São duas da manhã e sem luar: não sei atravessar-te pelo vidro e criar-te metáfora de brilho São duas da manhã e o céu tão escuro como carvão-carvão: onde vou inventar pequenos seixos para fazer fogueira que te escorra? Estamos dentro da noite que é mais noite e que é que eu trago para te acordar? Olha: ponho esta lâmpada a fingir de estrela mais polar do que a polar, e, vês, o vidro em frente: não me vejas enrolada a escrever: é espelho mágico e agora eu era o verso mais perfeito e tu a mais perfeita das palavras e às duas da manhã trago-te: um céu, são estrelas e mil luas, são seixos mais galácticos que a luz, mais velozes que a luz e no teu corpo, vês, a minha mão é chão feito de luz e estrelas e do carvão-carvão nasceu um sol e do meu pé, repara nesse céu: fogueira interestelar e o que eu tinha escondido atrás do Tempo e Deus: um tempo a sério para tu entrares em bola de cristal feita de espelhos
AMENDOINS
Não sou capaz. Bem tento que ele venha, o tal olhar diagonal das coisas, mas as pessoas surgem-me tão sérias, tão capazes nos seus discernimentos. À minha frente agora, por exemplo, um grupo com cerveja e amendoins. Se fosse um tempo antes, conseguia fazer de amendoins um qualquer tema, descascar um poema devagar feito de amendoins, cerveja e gente. Mas tudo me parece tão normal e os amendoins coisas sensatas [apanhados do prato vorazmente, entre gestos nervosos e correntes conversas baloiçadas]
MAL PENSO, LOGO EXISTO
Penso que sim, que o verso desejado é o que mais resiste ao vendaval da letra, que a dor mais rente a tudo a que se insiste e vive no bolso do poeta.Penso que sim, que ao pôr a mão no bolso, de lá tirando a dor em vez de rebuçado,berlinde de mil cores ou minúsculo fósforo quebrado,esse dirá também: Penso que sim.Que as coisas se repetem infinitas em círculo de lua,que a minha dor, não sendo igual à tua, é rente a bolso igual.Assim existo. Porque penso mal, já que pensar que sim em negação é forma de negar inevitável conta de hospital após doença longa em quarto a flores.[E todavia, às vezes,bem no fundo do bolso:cristalizado mundo.Minúsculo berlinde a cores.]
WHAT’S IN A NAME
Pergunto: o que há num nome? De que espessura é feito se atendido, que guerras o amparam, paralelas?Linhagens, chãos servis,raças domadas por algumas sílabas,alicerces da história nas leis que se forjaram a fogo e labareda? Extirpado o nome, ficará o amor,ficarás tu e eu –mesmo na morte,mesmo que em mito só
E mesmo o mito (escuta!),a nossa história breve que alguns lerão como matéria inerte,ficará para o sempre do humano
E outros o hão-de sempre recolher , quando o seu século dele carecer
E, meu amor, força maior de mim, seremos para eles como a rosa –Não, como o seu perfume:ingovernado livre
ALEPPO, CALAIS, LESBOS, OU, POR OUTRAS PALAVRAS,
quero falar do que antes eram ruas, avenidas bordadas a casas e palmeiras, dos tapetes que outrora, em imaginação nossa, voavam de magia e que agora se esfumam de outras formas, as mais rasas
Ou do tempo da poesia antes, quando os barcos entravam, esguios, e a palavra se fazia a nitidez de imagem, da violência depois e deste tempo,porta de entrada em rudes barcas para a violência em séculos agora
Ou ainda dos carreiros de gente a parecerem oceanos a lentes de distância, grandes planos, mas que, partida a gente em gente singular, sobra em nomes inteiros, gostos próprios, distintos sofrimentos, músculos de sorrir diferentes todos, ah, se a amplíssima lentes e transformasse, estreita, em microscópio de vida
Do que vejo de longe e num écran, não consigo falar usando redondilha, versos redondos, uma sintaxe igual e certa
Só consigo estas linhas em que queria falar das outras linhas feitas de outra matéria, real e dura, explodida, essa, detida por coletes e armas cor de fumo, e, ao lado dos oceanos de gente,os sedimentos que vivem noutras gentes,as vizinhas a mim, o ódio construído lentamente a rasar a abominação
Do que chega e molhar, das camadas de séculos em que tudo parece mercadoria fácil de esquecer,ou então que o desterro nos ficou raso aos genese só ele é lembrado, e ele sozinho serve para insistir o horror,de tudo isso não há forma de verso que me chegue porque nada chega de conforto ou paz
Mas que o furor persista, e que neste recanto ao canto desta Europa,mesmo sem vergonha de estar quente e longe, e protegida sob uma lente amplíssima que só deixa passar, finíssimas, meia dúzia de imagens:ou, por outras palavras, a cegueira –mesmo sem palavras: o furor –
NÚ: ESTUDO EM COMOÇÃO
Em que meditas tu quando olhas para mim dessa maneira,deitada no sofá diagonal ao espaço onde me sento,fingindo eu não te olhar?Em que pensa o teu corpo elástico, alongado,pronto a vir ter comigo se eu pedir?As orelhas contidas em recanto,as patas recuadas,o que atravessa agora o branco dos teus olhos:lua em quarto-crescente,um prado claro?E quando dormes, como noutras horas,que sonhos te viajam:a mãe, a caça, a mão macia, o salto muito perfeito e alto, muito esguio?
Onde: a noite sem frio que nos abrigará um dia e que há-de ser (só pode ser)igual?
DAS SAGAS E DAS LENDAS: PEQUENÍSSIMA FÁBULA DO CONTEMPORÂNEO
Para BenO seu nome era Octavius,que quer dizer oitavo em descendência,um nome que serviu muito depois a homem de mil rostos falar do mais volátil: os humanos ofícios nas marés que, quando aproveitadas, conduz e mà fortuna Casou com Agripina, herdou tribuna, tiveram filhos, terras que lhe herdaram o nome –o nome dele, que o nome dela de pouca serventia:nem rito de passagem
E a linhagem (parecia)foi clara e sossegada Astrid veio uns séculos depois, em embarcação esguia coberta de plumagens e dragões,desembarcou com Igor e guerreiros,ali chegados não só para pilhagem de terras e mulheres, mas para as bem lavrar(às mulheres e às terras)
E límpida (parecia)lhes foi progenitura
Mas por certo algum curto vórtice de luz, ou deus de natureza, ou deus qualquer, não fez perfeita a história acontecida,e ao baralhar os naipes de outra forma criou pares novos numa arca nova:a descendência muito ameaçada,filhos meio alourados, outros sem cor distinta, nalguns casos sombria, ou alva como a neve em baixa temperatura
O filho de Igor: baixo, íris escura Igor bramando a Thor e a Odin,ah, os trovões clamados, Astrid sussurrando-lhe ao ouvido, dizendo-lhe nem sei, não compreendo como aconteceu, mas ele era tão hábil e gentil,tinha uns olhos rasgados, falava-me de estrelas,e o seu perfil, um pouco estonteante,e tu estavas na guerra –E um dos filhos de Octavius, seu herdeiro por lei,com olhos muito azuis ah os murros fincados sobre a pedra do lar,
Agripina dizendo-lhe nem sei, perdoa, meu amor,não compreendo como se passou,mas ele tinha tranças e eram louras,e chegou devagar, não fez estrondo de trovão nenhum(como disseste que eles sempre fazem)e trazia uma pedra cintilante, dizia ser o deusque o protegia e que o acompanhava,e tu estavas na guerra –E assim por aí fora,assim deve ter sido, assim foi, de certeza mais segura Célticos imigrantes, índios, africanos, alguns árabes fugidos sorrateiros do fim do continente,mas que a lenda parece ter esquecido dos efeitos futuros,e quanto a isso tentou ser obscura
E godos, visigodos, pictos, germanos, hunos,alguns casando por amor e terras, outros por terras e talvez amor, outros porque ordenados pela ordem das terras e dos usos, mas na verdade amando o vizinho do lado em vez da doce esposa, alguma esposa ansiando das ameias a aia cumpridora e desejante –mas todos dando filhos, pretexto para saga,mais tarde literatura
E sempre eles em guerra –Ah como sabe bem,como é reconfortante pensar que nesta circular e comum terra há os limpos e puros!
COMUNS FORMAS OVAIS E DE ALFORRIA: OU OUTRA (QUASE) CARTA A MINHA FILHAFoi de repente,eu semi-reflectida por janela oval:uma emoção que me lembrou o dia em que disseste inteiro o nome do lugar onde vivíamos sem lhe trocar as letras de lugar
No céu visto daqui,desta janela oval e curta de avião,mais de vinte anos forampor sobre a linha azul daqueles montes e esse recorte puro dos verbos conjugados no presente errado,mas as palavras certas
Ainda hoje,não me é fácil falar-te em impiedade,ou nisso a que chamamos mal,e que existe, e emerge tantas vezes da idiotia mais rasa e primitiva
Dizer-te unicamente destas coisas neste poema a ti seria como assaltar a própria casa,queimar móveis e livros, matar os animais que como nós a habitam,estuprar a calma que por vezes se instala na varanda
Deixo-te só a desordem maior do coração sentida há pouco dessa janela oval,os momentos raríssimos,como só os milagres se diz terem,e que às vezes cintilam:cósmicas cartas de alforria que nos podemos dar,nós, humanos aqui:Só isto eu desejava para tie nesta quase carta –
O ASTRÁGALO:
IMPRESSÕES
A impressão digital de uma estrelaé mais que um fio de luz:fala de um cálcio igual ao que irá preservar a memória do astrágalo,esse pequeno osso com nome de universo,vizinho ao calcanhar
Comum ele também a espécies várias,a nossa, ou a de pássaro ou sapo,que em terra e água imprimem os seus passos,um lentíssimo voo pelo espaço a ser sonhado –nosso
Como a estrela que morre, agonizante,e é somente uma outra dimensão da dor,ângulo outro em perda,ignorante ela mesma do profundo dever de que outra estrela nasça:responsabilidade sem contrato, acordo tácito do fogo transportado Tal como o sapo, o pássaro,óvulo, ovo, ou larva, lançado ao rio num cesto de matéria, o vime feito trança,se pressente imortal, quando criança
Mas a espreitá-lo o ponto frágil da fractura igual: desabrigado astrágaloà mercê do futuro feito flecha,deixando no deserto, e digital, nova impressão,grão de cálcio e de mundo, ali suspenso
Além do fio de luz que nos condena,enquanto nos transporta além do tempo para outras guerras, outra pazquem sabe
DAS IMPOSSÍVEIS SEMELHANÇAS
É quando a morte se instalaà nossa volta entre os que mais amámos:os que nos foram vida, os nossos,os amigos –e de repente, também os que seguimosdesde jovens e só reconhecemos por jornais, e tornaram o mundo um lugar mais ameno como o mundo poderia realmente ser
Ouvi pela primeira vez Take this Waltzna mesma altura em que escrevi um poema com cavalos de pedra e uma fotografia que tirei a seu lado, não de Leonard Cohen, mas de alguém por quem me apaixonei, e tão eficazmente como acontece a um míssil de precisão absoluta
Ainda vive (e bem), mas é como se tivesse quase desaparecido, uma fotografia antiga levemente a esbater-se,desmanchando-se em cinza com a luz do sol, o que é muito parecido com morrer(Mas, por muito que eu tente imaginar que é semelhante, de facto não é a mesma coisa. Não, não é a mesma coisa)
GALILEU, A SUA TORRE E OUTRAS ROTAÇÕES
Sandamento 1 Olhando agora a mesma torreo nde há trezentos e tal anos ele subiu,estaria um pouco mais na vertical, e o sonho em fio de prumo –O que dele disseramfoi o ter contemplado estrelas e mais estrelas,incomodando togas não de lume,mas de uma obliterada fé em fumo
Os séculos haviam de contar da celeste estrutura,mais azul que os vestidos da Virgem em menina,haviam de mostrar como esta outra estrutura cede a outros olhares:os do flash rompendo movimentos,tentando aprisionar–umsentimento? o registo de um diaou de uma hora?
O que dele contaram perdeu-se pelo brilho das estrelas,e assim o resguardaram em poemas, museus, guias turísticos,nomes de ruas e de hotéis sem nome,o seu nome rodando quase a repetição
Sobre mortos vagamos,como a Terra, numa veste diferente e ainda igual,e nela nos movemos, como ela,como ele e outras alturas
Custa mais que um salário
em terras que são quase ao pé de nós,divididas por súbita península e um mar tão morno,custa mais que um salário
subir a esta torre onde ele foi
https://feq.pt/wp-content/uploads/2018/08/2018_ALAmaral_Poemas_CETTormes.pdf
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https://www.portaldaliteratura.com/autores.php?autor=876
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https://www.youtube.com/watch?v=qFlQAdiT95Q
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https://www.youtube.com/watch?app=desktop&v=qFlQAdiT95Q&fbclid=IwAR2bHG9dzXwsFa5cq6AcuGQVaBgkb-Zq6wkOV-sx0XB6S3wead3vtVQ77WU
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Postei:
Bravíssimooooo para Ana Luísa Amaral....”Editora Assírio & Alvim felicita Ana Luísa Amaral, hoje galardoada com o XXX Prémio Rainha Sofia de Poesia Ibero-Americana, que reconhece uma obra poética que contribua de forma significativa para o património cultural dos países de línguas portuguesa e espanhola.
Com nove anos de idade deixou Sintra e foi viver para Leça da Palmeira, distrito do Porto.
A
sua infância foi marcada pela leitura de obras de autores
anglo-saxónicos, como Walter Scott (1771-1832), Washington Irving
(1783-1859), Louisa Alcott (1832-1888) e Enid Blyton (1897-1968).
Entre os dez e os dezasseis anos de idade frequentou um colégio de freiras espanholas e, mais tarde, estudou Germânicas na Faculdade de Letras da Universidade do Porto, onde veio a lecionar.
Em 1985 realizou provas de aptidão pedagógica e capacidade científica na especialidade de Literatura Inglesa. Novamente na Faculdade de Letras da Universidade do Porto, em 1996, defendeu provas de doutoramento na especialidade de Literatura Norte-Americana, tendo sido aprovada com distinção e louvor. A tese que apresentou intitula-se Emily Dickinson: uma poética de excesso.
Durante a década de 80 deslocou-se pontualmente a Inglaterra. Viveu nos Estados Unidos da América entre 1991 e 1992.
A sua obra, povoada de referências a viagens e lugares, está representada em várias antologias, nacionais e estrangeiras, e traduzida em diversas línguas.
É autora dos livros de poesia: Minha Senhora de Quê (1990), Coisas de Partir (1993), Epopeias (1994), E Muitos Os Caminhos (1995), Às Vezes o Paraíso (1998), Imagens (2000), Imagias (2002), A Arte de ser Tigre (2003), A Génese do Amor (2005), Poesia Reunida 1990-2005 (2005), Entre Dois Rios e Outras Noites (2007), Se Fosse um Intervalo (2009), Inversos, Poesia 1990-2010 (2010), Vozes (2011), Escuro (2014), Todavia (2015), Em suma, Poesia 1990-2015 (2016).
Escreveu os livros infantis Gaspar, o Dedo Diferente e Outras Histórias (1.ª edição de 1999, edição revista de 2011), A História da Aranha Leopoldina (2000), A Relíquia (2008), Auto de Mofina Mendes a partir da peça de Gil Vicente (2008), A Tempestade (2011, que integra o plano nacional de leitura), Como Tu
(2012), acompanhado de um CD com música de António Pinho Vargas, piano
de Álvaro Teixeira Lopes e vozes de Pedro Lamares, Rute Pimenta e Ana
Luísa Amaral; integra o plano nacional de leitura) e Lenga-lenga de Lena, a Hiena (2016).
Publicou uma peça de teatro - Próspero Morreu (2011) e uma obra de ficção - Ara, Sextante (2013).
Fez traduções de poemas de Xanana Gusmão, Eunice de Souza, John Updike, Emily Dickinson, de sonetos de Shakespeare e da obra Carol de Patricia Highsmith.
Ana Luísa Amaral é também coautora do Dicionário de Crítica Feminista (2005) e coordenadora da edição anotada de Novas Cartas Portuguesas (2010).
Em 2007 foi-lhe atribuído o Prémio Literário Casino da Póvoa/Correntes d'Escritas, com o livro A Génese do Amor e foi galardoada em Itália com o Prémio de Poesia Giuseppe Acerbi. Em 2008, o seu livro Entre Dois Rios e Outras Noites alcançou o Grande Prémio de Poesia da Associação Portuguesa de Escritores. Venceu ainda o Prémio de Poesia António Gedeão com a obra Vozes (em 2010), o Prémio Narrativa PEN CLUB com Ara (2014) e a Medalha de Ouro da Câmara Municipal de Matosinhos, por serviços prestados à literatura (2015). Foi finalista do Prémio Portugal Telecom com A génese do Amor (2008) e Vozes (2014) e proposta para o Prémio Rainha Sofia em 2013. Em 2018 o seu livro Arder a palavra e outros incêndios foi um dos vencedores do Prémio de Ensaio Jacinto Prado Coelho, da Associação Portuguesa dos Críticos Literários e recebeu também o Premio Internazionale Fondazione Roma: Ritratti di Poesia. Em julho 2020 foi distinguida com o Prémio Literário Guerra Junqueiro (4.ª edição), entregue no âmbito da FFIL – Freixo Festival Internacional de Literatura 2020.
Ana Luísa Amaral é membro do Instituto de Literatura Comparada Margarida Losa.
Tem uma filha e continua a viver em Leça da Palmeira.
(Universidade do Porto Digital / Gestão de Documentação e Informação, 2017)