respiguei do blogue do Prof. António Delgado:
James Murphy e uma visita a Alcobaça
http://ecosecomentarios.blogspot.com/2010/10/james-murphy-e-uma-visita-alcobaca.html
Francisco Zagalo...Bernardino Lopes Oliveira...ruínas...vende-se...
http://ecosecomentarios.blogspot.com/2010/09/1873-alcobaca-e-alcobacenses-vistos-por_28.html
(apesar da bicada injusta na CDU)
O texto que abaixo publico é um extracto de um livro singular, que considero dos mais interessantes que se escreveram sobre Alcobaça após a saída dos monges, e que é pouco conhecido pela maioria das pessoas da terra.
Na sequência dos Olhares de Estrangeiros em tempos idos sobre Alcobaça, que venho publicando conforme a minha disponibilidade, decidi incluir a visão de um nosso conterrâneo, por ser actual em alguns aspectos e demonstrar como Alcobaça se mantém parada no tempo. É um olhar cirúrgico que deveria fazer reflectir.
O conterrâneo em causa é Bernardino Lopes de Oliveira. Um nome conhecido, mas que poucos saberão quem foi ou o que fez.
Antes de prosseguir esta introdução do meu comentário, devo dizer que o extracto é retirado do livro a “ História da Misericórdia de Alcobaça”, publicado em Alcobaça em 1918, oito anos após a morte do autor, Francisco Zagalo. Um destacado médico proeminente da vida social e cultural de Alcobaça no virar do S. XIX para o S. XX, cuja memória foi perpetuada na toponímia da povoação. Precisamente numa artéria que nunca mais tem os melhoramentos anunciados vezes sem fim pelo elenco camarário, como remate que falta na configuração do terreiro que foi feito em frente ao mosteiro.
Bernardino Lopes de Oliveira tem também o seu nome na toponímia de Alcobaça, e como outros alcobacenses abastados do século XIX, deixou-nos uma enorme casa, que é em termos arquitectónicos uma das mais significativas da povoação no panorama da arquitectura da terra. De linhas sóbrias e estilo neoclássico tardio, está longe do género abrasileirado e neocolonialista, tão típico e adoptado por alguns novos-ricos de então, como se podem ver exemplos na povoação. Bernardino Lopes, não optou pela ostentação, apesar de ter sido emigrante de sucesso no Brasil, onde amealhou uma fortuna considerável.
Pela sua experiência vivida no estrangeiro e por um cosmopolitismo que demonstrou em atitudes políticas posteriores, quis dotar Alcobaça de um ar moderno, longe daquele que o chocara numa viagem para matar saudades da terra e que era do mais atrasado. Custou-lhe ver o aspecto das pessoas e das casas da povoação, que eram da “mais repugnante decadência” e o “estado intelectual e moral dos moradores (…) em geral ignorantes e grosseiros”. Mais tarde, quando decidiu voltar para Alcobaça, insere-se na vida social, cultural e política da terra, promovendo actos e associações, onde se destacam a antiga “Associação Recreativa Clube Alcobacense” e o “Clube de leitura” anexo a ela. Promoveu o teatro, foi provedor da Misericórdia, vereador da Câmara e seu presidente em 1873. A ele se deve, enquanto provedor da Misericórdia, a iniciativa da construção do Hospital que tem o seu nome. Esta é uma das maiores infra-estruturas sociais de que alguma vez se dotou a terra após a saída dos monges.
Na vida política cedo se empenhou em resolver os problemas que impediam a povoação ter uma imagem condigna com os seus pergaminhos. Entre esses problemas, ele considerava ser a pouca urbanidade dos seus habitantes, a sujidade que se via a cada passo pelas ruas, a maledicência, os vícios da influência na politica, o interesse mesquinho e o amiguismo, que deturpavam a coisa pública, já que uns quantos beneficiavam do município em detrimento dos demais.
Apesar dos anos decorridos, esta última realidade ainda não foi banida da terra, e o aspecto de povoação abandonada e decadente continua. São bem visíveis por todo o lado, nos imóveis e lojas, tabuletas e cartazes a anunciar “trespassa-se”, “vende-se” ou “aluga-se”, como se não se quisesse viver por aqui ou quisessem abandonar o lugar. As tabuletas que adornam janelas, portas, varandas , montras… dão um ar pitoresco à terra e os mesmos dizeres quando são pintados directamente nas paredes dos próprios edifícios, à mão livre, tornam-se mesmo patuscos. Suponho até que a Câmara irá brevemente promover um concurso sobre “ o slogan mais bem pintado” ou “ o lugar mais imaginoso para se expor uma tabuleta". Tudo com direito a um subsídio e um júri composto pelo PS e a CDU, as associações de defesa do património e os “defensores do mantenham isto assim”. A esta imagem da vitalidade local, juntam-se ainda as muitas casas e paredes em ruínas e leprosas, escaqueiradas, que se vêem a cada passo na povoação e que servem, nalguns casos, de mictórios e outros propósitos afins, e onde abundam dejectos, lixo, maus cheiros, ratazanas e bicharada rastejante que promovem uma vida salubre e atraente para quem vive nas imediações ou passa por lá, especialmente crianças e idosos.