Escultor José Aurélio tem suportado todos os custos de funcionamento da Fundação Cultural
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Armazém das Artes pode fechar portas se não surgirem apoios públicos ou privados
José Aurélio
O Armazém das Artes, inaugurado em 2007, em Alcobaça, pode fechar portas se não aparecerem apoios públicos ou privados que sustentem o seu funcionamento. Idealizado pelo escultor José Aurélio, que investiu quase dois milhões de euros na reconstrução do centenário armazém e oficina, que chegou a abrigar conspiradores republicanos durante a monarquia, tem atraído milhares de pessoas de todo o País durante os quase 4 anos de vida, que se completam no dia 24 de Março, para verem os trabalhos de dezenas dos mais consagrados artistas portugueses. Contudo, o modelo mecenático do Museu de Serralves não tem granjeado adeptos entre os empresários locais e as relações com a autarquia continuam sem dar frutos, pelo que José Aurélio admite fechar portas se a situação não se alterar a curto prazo.
Para tentar reverter a situação, foi recentemente criada a Associação de Amigos do Armazém das Artes. Os estatutos já foram aprovados e espera-se que a associação tenha uma dinâmica paralela ao Armazém das Artes, alavancando uma série de iniciativas que se venham somar às da Fundação Cultural. “Gente nova e mais ideias serão bem-vindos para conseguirmos novos projectos num futuro próximo”, adiantou José Aurélio.
O escultor admite que o seu relacionamento com o actual Executivo da Câmara Municipal de Alcobaça tem sido “impecável”, mas, na sua opinião, tem pecado por não ter concretizado nenhuma das ideias que avançou. “Há uma série de ideias de projectos que foram discutidas com o presidente da Câmara, mas que ficam estagnadas, sem sequência e sem resposta e isso a mim incomoda-me um bocado. Não vejo um futuro risonho, como eu cheguei a imaginar, nas nossas relações com a Câmara e penso que, assim, não vamos a parte nenhuma. Eu não tenho condições para acompanhar o ritmo que a Câmara me está a querer impor. Ou a Câmara arranja condições para me acompanhar ou então não há hipótese, tenho que me virar para outro lado ou fechar, inclusivamente. É uma hipótese que eu mantenho em aberto, quando o Armazém das Artes não tiver condições para funcionar, fecho a porta. É um local óptimo para eu guardar as minhas coisas, para eu ter o meu trabalho e, nesse caso, passará a ser o meu espaço privado, que só abrirei aos amigos ou a quem me pedir para ver. E, nesse dia, eu reduzo para dez vezes menos as despesas que tenho actualmente.
José Aurélio assume parte da responsabilidade pela situação difícil por que passa a instituição, nomeadamente, por ter acreditado ser possível reproduzir em Alcobaça o modelo de financiamento do Museu de Serralves, no Porto.
“Sempre acreditei que na minha terra, que temos de considerar uma terra rica, com tantos industriais, houvesse possibilidade de vir a ter apoios, até privados. E é uma questão tão linear: em vez de pagarem impostos, dão um contributo que depois é descontada nos impostos, mas os nossos industriais não têm nada a ver com os industriais do Porto, que são bairristas e estão interessados em ter um museu que é conhecido em toda a parte, não só no País como no mundo inteiro. Ali o mecenato funciona, à entrada existe uma parede onde consta o nome de centenas de empresas que contribuem com muitos milhares de euros para o funcionamento do Museu de Serralves”, recorda o artista.
“Eu sempre pensei que poderíamos viver com essa participação de mecenas, mas as pessoas aqui têm uma certa indiferença para com a cultura e é difícil fazer entender que isto é um organismo que tem uma função de divulgação cultural de interesse público e que, portanto, merece todo o tipo de ajuda. Agora, eu já não tenho condições para continuar sozinho, fui até ao limite das minhas forças, não só no investimento de quase dois milhões de euros, como nas despesas de funcionamento: são cinco pessoas a trabalhar connosco, temos custos com as exposições, os seguros, os transportes, a água e a electricidade, que são elevados porque o consumo é muito. Já pedi um apoio à EDP, através da Câmara Municipal, mas até hoje ainda não houve consequências e a nossa situação vai-se degradando”, alerta José Aurélio.
Até ao momento, também não houve nenhuma candidatura a fundos comunitários. “Tentámos uma candidatura ao QREN para equipamento, que nos interessava muito, mas o concurso não abre há dois anos e não nos pudemos candidatar. Por outro lado, as candidaturas são muito burocratizadas e eu não tenho muita paciência para tanta burocracia, mas pode ser que a Liga de amigos do Armazém das Artes nos ajude nessa tarefa. Apenas a associação Pouco de Branco conseguiu um apoio estatal para uma exposição realizada no Armazém das Artes, mas foi o único e por intermédio de outra entidade”, concluiu.
Para já, a programação do Armazém das Artes não pára, continuando patente ao público, até 27 de Fevereiro, quatro novas exposições em Alcobaça: Pintura e Desenho, de Rogério Ribeiro, Escultura e Desenho, de Alberto Carneiro, Siglas do Mosteiro de Alcobaça, de José Aurélio, e tornos do acervo do Armazém das Artes.
Consulte também as notícias sobre a inauguração e a última exposição.
Mário Lopes
03-01-2011