22/12/2013

7.275.(19dez.21.12') Há 52 anos...Não podemos esquecer!!! Dias Coelho foi assassinado pela PIDE...Ler como foi o julgamento dos criminosos!!!

via blogue de Sérgio ribeiro 


QUINTA-FEIRA, DEZEMBRO 19, 2013


19 de Dezembro, a lembrança. hoje como todos os anos, como quase todos os dias

Há 52 anos!


A MORTE DESCEU À RUA

Ao recordar o “caso Dias Coelho”, o seu assassinato quando a morte desceu à rua e o pintor morreu, confronto-me com sentimentos e informação verdadeiramente essencial para entender o que era o fascismo.
Depois do 25 de Abril, esperava-se justiça. Os agentes da PIDE assassinos de Dias Coelho estavam identificados, e foram presos e julgados. O recurso sobre o julgamento em primeira instância, por parte da filha de Dias Coelho face à quase absolvição dos réus, terminou em princípio de 1977, pelo que tudo correu ainda no período de que memória dos mais novos está envenenada com “informação histórica” completamente contrária ao que estes factos ajudam a conhecer.
A luta de classes nunca teve tréguas em Portugal (nem noutro lado qualquer), e os autores da sentença serviram uma classe, a mesma que era servida pelos agentes da PIDE que prendiam, torturavam e matavam, e que, quando a relação de força obrigou a que fossem julgados, tiveram quem os defendesse em vez de os julgar, com neutralidade na aplicação das leis.
Foi António Domingues que, segundo a revista SubJudice 25-Justiça e Memória, disparou sucessivamente os (cito)“dois tiros de um agente da Direcção Geral de Segurança sobre um suspeito, militante do Partido Comunista Português, sendo o segundo tiro com a arma muito próxima da roupa da vítima, perfurando a bala o esterno, a cartilagem da 5ª. costela, o pericárdio e o coração, provocando a sua morte.”

O libelo acusatório, sobre o qual os juízes deveriam julgar, dizia:
«O Ex.º Promotor de Justiça (…) acusa o réu António Domingues (…) de ter cometido um crime previsto e punido pelo art.º 349.º do Código Penal, concorrendo as agravantes 11.ª (espera), 25.ª (noite) e 28.ª (arma) do art.º 34.º do mesmo diploma porquanto, no dia 19 de Dezembro de 1961, os então agentes da PIDE António Domingues, Manuel Lavado e Pedro Ferreira (…) foram encarregados pelo seu chefe de brigada da mesma polícia, José Gonçalves, de localizar e prender José António Dias Coelho, também identificado nos autos e militante do Partido Comunista Português. Para tal efeito, deslocaram-se à zona da Rua dos Lusíadas, desta cidade de Lisboa, onde se colocaram já de noite, pelas 19 horas, a uns cem metros uns dos outros, aguardando a vinda do referido José António Dias Coelho. Tendo este passado pela Rua dos Lusíadas cerca das 20 horas e tendo-se apercebido até da presença dos referidos agentes, começou a correr pela mesma artéria, derivando depois para a Rua da Creche no sentido do Largo do Calvário. Em sua perseguição correram os agentes referidos. Já na Rua da Creche, sensivelmente em frente do nº 30 de polícia, foi o José António Dias Coelho agarrado pelo agente Manuel Lavado. Entretanto, chegou junto dele o réu que desfechou dois tiros de pistola marca “Star” – calibre 7,65 mm, examinada nos autos e que lhe estava distribuída – sobre o referido José António Dias Coelho
Mas, se foi este o libelo acusatório, isto é, acusação, com base na legislação, para os factos provados, suas agravantes e atenuantes, a sentença não deu como provada a intenção de matar para poder convolar (o que quer dizer passar rapidamente de um estado a outro) a acusação do crime de homicídio voluntário para a do crime do art. 361.º do mesmo Código, que éapenas o de “ofensas corporais voluntárias de que resulta privação de razão, impossibilidade permanente de trabalhar ou a morte”.
Se o libelo acusatório referia agravantes – esperanoite e arma–, o tribunal militar que julgou o recurso decidiu que não existia a agravante espera… “pois até à chegada da vítima o réu não formulou o propósito de sobre ele disparar” o que é verdadeiramente inacreditável, uma vez que, existindo espera, se poderia perguntar como formularia o réu o propósito de disparar e de matar (ou de causar ofensas corporais…)? Disparando tiros para o ar, ou treinando-se atirando sobre outros alvos que não Dias Coelho?
Para mim, ainda mais inconcebível é o apagamento deste agravamento por sido eu testemunha privilegiada da espera, pois dela tive toda a percepção quando, pouco antes das 20 horas, circulava pelas cercanias para tomar posição para o encontro com o camarada de que só conhecia o pseudónimo, no lugar que antes marcáramos e a que ele faltou por ter sido assassinado! Depois da espera…
Por outro lado, o mesmo tribunal acrescentou quatro atenuantes,que deu como provadas,

  • o bom comportamento anterior do réu;
  • a confissão espontânea;
  • o possuir vários louvores;
  • o ter agido, com os seus disparos, para evitar que se frustrasse a missão que estava desempenhando.
Custa a acreditar!
Quanto à primeira “atenuante”, a argumentação do advogado da filha de Dias Coelho, invocando imagem comparativa com a quadrilha de Al Capone, sublinhou que só por ridículo se diria que um gangster, membro de uma quadrilha de assassinos, pudesse considerar-se bem comportado antes do primeiro assassinato pela simples razão de não ter antes cometido qualquer assassínio.
confissão espontânea não existiu, até porque, entre outras coisas, o Tribunal deu como provada a voluntariedade do disparo e o réu negou a voluntariedade do disparo… mas confessou (e não espontaneamente!) o que era de todo impossível negar: que disparou! E, em tudo o mais, foi falso e mentiroso. Como se comprovou.
 Relativamente à atenuante louvores, que o réu possuía, é absolutamente inacreditável. Continuando a usar a imagem comparativa da quadrilha de Al Capone (ou outra), é como se o louvor do chefe da quadrilha fosse atenuante a ter em devida consideração. É que os referidos louvores foram concedidos pela PIDE, e é escandaloso que o primeiro louvor tenha sido atribuído a 27 de Dezembro de 1961, oito dias depois do crime de assassinato para que veio servir de atenuante.
Ler esse louvor define bem a instituição criminosa que era a PIDE, e como era servida por assassinos: “…louvo o agente de 2ª classe António Domingues porque, cumprindo sempre com zelo, dedicação e espírito de sacrifício, as missões que lhe foram confiadas, contribuiu grandemente para que fossem capturados elementos subversivos na associação secreta denominada Partido Comunista Português desenvolvem larga actividade directiva e cuja acção representa ameaça e perigo para a ordem social estabelecida”. (Ordem de serviço nº 361/61 da PIDE, assinada por Homero de Matos).
Capturados, torturados e assassinados, acrescente-se!
Por último, a atenuante de que o réu teria disparado para evitar que se frustrasse a missão que estava desempenhando, é esclarecedora. O réu disparou dois tiros, o segundo à queima-roupa, sobre um homem agarrado por um seu “colega”… para que a sua missão não se frustrasse! Pelo que só se pode concluir que a missão era a de matar um homem por ser suspeito de pertencer ao Partido Comunista Português. Quase só faltou acrescentar que a culpa do assassinato foi do assassinado, de Dias Coelho, por ter tentado fugir à prisão e, assim, impedir os agentes da PIDE de cumprirem a missão de o prenderem.
Para os juízes que assim julgaram, José Dias Coelho era, acima de tudo, um comunista!... logo, alguém merecedor de ser assassinado. Ou cujo assassino não deveria ser condenado, mas sim louvado!