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ENTREVISTA ao Alcoa
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“Estamos a trabalhar em condições muito desiguais em relação ao ano anterior”
Leia na íntegra a entrevista a Gaspar Vaz, diretor do Agrupamento de Escolas de Cister – Alcobaça
O agrupamento mantém o número de alunos?
Felizmente, o número de alunos do Agrupamento, ao contrário do que parecia ser uma “débacle”, está a tomar contornos muito mais aceitáveis. Embora a quebra da taxa de natalidade esteja a fazer os seus estragos ao nível do pré-escolar e do 1º ciclo, nos outros níveis de ensino, temos conseguido manter, ou mesmo aumentar ligeiramente, o número de alunos do ano letivo transato, no período homólogo: cerca de 3900 alunos. Isto quer dizer, grosso modo, que houve engenho para contrariar a curva demográfica com uma política de atração de públicos escolares que não seriam dom seu natural raio de influência. Contudo, a realidade nunca é linear e reconheço que há zonas na área de influência do Agrupamento de Escolas de Cister em que não estamos a ser tão eficazes.
Que zonas? Pode concretizar?
Não querendo entrar em pormenores, é forçoso admitir que a zona norte do concelho é uma área que merece uma atenção muito especial. Muito particularmente, em Pataias, não estamos a ser tão eficazes na fidelização dos «clientes». É verdade que a crise económica, sobretudo naquilo que era a matriz dessa zona – o mobiliário, nomeadamente –, fez estragos muito severos. É também verdade que a localização geográfica de Pataias, no contexto do concelho de Alcobaça, não é nada favorável: basta recordar o processo de secessão da freguesia da Moita em relação a Alcobaça. Há uma série de fatores que concorrem para alguma estranheza de algumas zonas do concelho e relação à sua sede. Por exemplo, de Pataias para Alcobaça, há uma estrada “manhosa” que passa entre pinhais, que funcionam como a “Avenida Central” de algumas localidades, fazendo atrasar os transportes; entre Alcobaça e Pataias, o fluxo comunicacional nada tem a ver com o fluxo que existe entre Nazaré – Pataias – Marinha Grande. Se Alcobaça quiser manter a unidade com aquela zona norte, o município terá de investir mais: em transportes, em vias de comunicação, de modo a que o tempo gasto nas viagens Pataias-Alcobaça e Pataias-Marinha seja equivalente. Terá, porém, sobretudo, de fazer com que o concelho tenha mais emprego, no seu centro, para oferecer aos seus munícipes. Por outro lado, terá de haver, subsidiariamente, uma política de transportes que Alcobaça como centralidade estratégica. O que se diz de Pataias terá de se dizer de S. Martinho e da Benedita: qualquer uma destas localidades terá de estar a menos tempo (a distância mede-se, hoje, em tempo, e não em quilómetros), do centro do que das centralidades concorrentes (Caldas ou Rio Maior). Se isto não for conseguido, Alcobaça será reduzida, mais tarde ou mais cedo, a uma curiosidade turística. E pouco mais.
A Academia de Música deixou de ter a seu cargo AEC no agrupamento. Os critérios foram meramente económicos?
Não foram, sobretudo, económicos. Aliás, nunca foi equacionada esta hipótese.
É preciso dizer com toda a veemência, e de uma vez por todas: o Agrupamento de Escolas de Cister foi confrontado com a necessidade de assumir a gestão das AEC. Nunca as reclamou. Continuo, de facto, a pensar que as AEC são um conceito equívoco que responde mais a uma necessidade social do que a um conceito pedagógico. Há muito boa gente que defende que os meninos / alunos passam tem de mais nas escolas e que precisam de brincar mais. Posso estar de acordo. No entanto, a questão que se coloca a seguir é: e aqueles que não têm para onde ir depois da escola? Ficam “fechados na rua”? E é, na resposta a esta questão, num estado com preocupações sociais, que as AEC devem ser equacionadas.
O que aconteceu, não apenas em Alcobaça, mas um pouco por todo o lado, é que os Municípios não quiseram continuar com esta responsabilidade. E, sendo uma posição legítima, é preciso que se digam duas coisas: 1) que esta decisão, sendo ancorada na lei, acontece num período em que os municípios, de um modo geral, estão confrontados com dívidas gigantescas; 2) que esta decisão aparece num contexto em que as AEC sofreram uma diminuição de financiamento especialmente severa: passaram de 262 euros/ano/aluno para 150 euros por/ano/aluno…
Quer isto dizer que houve um tempo em que as AEC, não pagando especialmente bem aos seus profissionais, conseguiam financiar as instituições que as disponibilizavam. Talvez por isso, por não perceberem o novo quadro da sua efetivação, algumas instituições, mesmo não podendo ser “entidades promotoras”, se puseram em bicos de pés, esperando grandes prebendas. No entanto, este é, agora, um “negócio” no fio da navalha, em que um pequeno deslize pode acarretar grandes prejuízos.
Reitero, por isso, o que disse: motivos económicos, agora, são absolutamente de excluir. Pelo contrário, o que motivou a escolha – forçada, volto a enfatizar – foi a existência de um projeto unificador para as AEC, e não apenas a partilha de um bolo que, ainda por cima, não tinha quase nada de doce para distribuir…
Como têm corrido as AEC com a nova empresa?
Muito bem, devo dizer. Pode ser que nem todos estejam de acordo, o que é natural porque a verdade é que nunca houve consenso em relação às AEC: nem em relação ao conceito, nem em relação aos horários. Nem em relação à qualidade ou à escolha das «disciplinas» a incluir no programa.
Estamos, mesmo assim, a trabalhar em condições muito desiguais em relação ao ano anterior. Por exemplo, há um ano, a Câmara tinha uma equipa sua a coordenar as AEC. Tinha uma frota de autocarros a transportar alunos para as atividades que requeriam deslocação: natação, nomeadamente. Neste momento, é zero o compromisso da CMA neste domínio. É verdade que, entendendo-nos muito bem, estamos a negociar a continuação de algum esforço da autarquia, no sentido de assegurar o transporte, a partir do segundo período, das escolas para as piscinas (Alcobaça e Pataias). Sem isso, será absolutamente impossível assegurar a valência de natação na dimensão AFD – o que seria uma lástima.
Além disso, creio poder assegurar que a assiduidade dos professores de AEC, até este momento, é de cem por cento, coisa que nunca aconteceu no passado que eu conheço.
De resto, apenas uma precisão: quem está por trás desta atividade (a entidade promotora) não é uma empresa; é justamente o “cliente” natural deste serviço: as associações de pais de todo o agrupamento, representadas, por consenso e por delegação, na Associação de Pais e Encarregados de Educação do Centro Escolar de Alcobaça – uma estrutura, diga-se a talhe de foice, que foi constituída devida e legalmente no último ano, após uma ausência de, pelo menos, dois anos…
Com o fim da tutela das AEC por parte da câmara, as associações de pais foram chamadas a novas responsabilidades. Houve alguma situação problemática na renovação das associações de pais ou na assunção desse papel?
Não houve nenhuma questão problemática, para além dos aspetos logísticos: congregar, convocar e pôr a funcionar mais de quinze associações de pais não é tarefa fácil, em termos teóricos. Devo dizer, contudo, que, na prática, foi muito mais simples do que se poderia supor. De Pataias ao Casal dos Ramos, houve uma admirável consonância no que diz respeito aos pontos estratégicos. A escolha, por exemplo, do projeto vencedor foi tomado por unanimidade. Só tenho de louvar o admirável comportamento que as associações de pais tiveram na implementação deste processo. Claro que essa unanimidade não garante a aprovação automática de todos os aspetos subsequentes: qualidade das atividades e, sobretudo, horários. Mais uma vez, estaremos todos de acordo em relação ao óbvio: como atividades de enriquecimento que são, as AEC, deveriam surgir apenas depois das atividades letivas. Lanço-lhes, porém, um desafio: tentem fazer horários que as pessoas aceitem e que signifiquem, para pessoas licenciadas, um rendimento mensal de cerca de 200 euros / mês, antes de descontos…
Quais são as principais dificuldades e avanços na gestão do mega-agrupamento?
Sinceramente, penso que as maiores dificuldades que enfrentamos são “importadas”. A maior dificuldade que enfrentamos é de natureza social, e não de natureza pedagógica. É também verdade que o modelo de gestão da “escola democrática” não facilita muito as coisas. Sei que esta questão, sobretudo neste momento em que se quer diabolizar a “bolsa de contratação de escola” como a origem de todos os males por que passou este início de ano letivo, não é nada consensual. No entanto, não podemos continuar a desperdiçar excelentes profissionais, em troca e outros que nada fazem de relevante há muitos anos, em nome de uma famigerada Lista Nacional. É preciso ter a coragem para exigir as poucas coisas boas que vão aparecendo – e a capacidade de, numa parcela muito pequena, como é o caso, as escolas poderem escolher os melhores profissionais, em detrimento dos mais «pontuados» por uma carreira feita apenas de tempo transcorrido, é um bom princípio que deve ser aprofundado. É preciso que se diga que estou particularmente à vontade para defender um princípio de que não usufruo, em virtude de não ter, ainda, nenhum contrato de autonomia assinado.
Os professores continuam a queixar-se de muito trabalho burocrático. O agrupamento tem alguma autonomia para criar melhores condições de trabalho aos professores? E aos alunos?
Creio que, já há algum tempo, temos feito o possível para aligeirar, ao máximo, o trabalho burocrático dos professores. Gostava de saber, por exemplo, em que Agrupamento os professores têm, na sua componente não letiva de estabelecimento, tempos destinados a reuniões. Gostava de saber que outra escola utiliza menos tempo em reuniões de conselhos pedagógicos, por exemplo. Por outro lado, desde há alguns anos, que temos a questão das faltas, das avaliações e dos sumários, por exemplo, informatizados, evitando os clássicos livros de ponto que tinham de ser carreados para as salas de aula pelos professores. Há, contudo, atividades que não podem ser delegadas, mesmo que sejam “burocráticas”: avaliar tem muito de formal (“burocrático”), mas apenas o professor / conselho de turma o pode fazer. Justificar faltas tem um aspeto formal (“burocrático”), mas apenas o diretor de turma o deve fazer. Uma avaliação / planificação das atividades letivas tem de ter muito de “burocrático” para não se transformar o processo de ensino-aprendizagem numa lotaria, comandada pelo génio do professor.
O ensino de massas, democrático, não pode ser deixado à inspiração e ao improviso: ao contrário do que muitos pensam, os improvisos do jazz, as invenções da música dita “clássica”… têm muito de escola, de teoria, de sofisticação. Quando um músico não preparado se põe a improvisar ou é um génio ou desafina. Ora, génios são exceções, e não a regra.
É importante haver uma associação de estudantes na escola?
Numa escola secundária, penso que é muito importante porque prepara os alunos para uma vida de natureza diferente, marcada pela autonomia, pela exploração pessoal de possibilidades, pelo empreendedorismo, pelo mergulho na vida real. É verdade que tem havido boas, normais e menos boas associações de estudantes. É verdade que as eleições são momentos de um certo caos, de desordem relativa no normal acontecer das coisas. É verdade que, pelo ponto de vista dos “grandes”, as eleições deveriam ser domesticadas, metidas dentro de critérios mais estritos, sem barulho, sem campanhas publicitárias, sem faltas às aulas. Haverá gente que defende que as eleições deveriam ser feitas em silêncio, com ações de elevada comunicação entre espíritos superiores, com muitos cumprimentos e pancadinhas nas costas. Acontece, porém, que tal não é possível. Nem desejável. A escola não tem de ser uma “bolha protetora”, higienizada e inerte, em que os alunos estão ao abrigo de qualquer ventania, desordem ou imperfeição. Pela associação de estudantes têm passado dos melhores alunos da escola. Também têm passado os outros. Mas nunca têm passado os piores.
A paixão com que vivem estes momentos, a alegria que sentem, a deceção que experienciam… são lições de vida, fortes, que lhes fazem muito bem.
E sempre houve debate de ideias – pelo menos, nos últimos, dezoito anos, o ato final da campanha é um debate formal, moderado por um professor – que tem sido, invariavelmente, o Sr. Prof. Paulo Silva. E, depois, disso, a escola volta à normalidade: os alunos limpam a escola, arrumam o lixo, devolvem-nos as instalações como as receberam… Tem valido muito a pena, embora à custa de muita mão-de-obra, também, nossa.
Se fosse ministro da Educação, qual seria a primeira medida que tomava?
Tentaria resistir à tentação de tomar mais uma medida. Seria muito bom que conseguisse não fazer mais uma reforma, mas dar consistência ao que existe.