24/03/2017

6.497.(24mar2017.7.7') Dia do Estudante


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Dia do Estudante
24mar1962
Crise académica
estudantes em luta contra o fascismo
DIA NACIONAL DO ESTUDANTE
Foto de Helena Pato.
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Foto de Helena Pato.
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Foto de Helena Pato.
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24mar2017

Do «decreto 40 900» ao luto académico – a crise de 62

Há 55 anos, os estudantes de Lisboa eram brutalmente reprimidos pela polícia, dando início ao luto académico e à crise de 62. A greve alcançou 25 mil estudantes, de acordo com relatos da época.
http://www.abrilabril.pt/node/115?from=onesignal
A 24 de Março de 1962, os estudantes de Lisboa começam um desfile da Cidade Universitária em direcção ao Campo Grande, onde, numa manobra para desmobilizar o protesto estudantil, o reitor Marcello Caetano prometera um jantar.
É sobre este desfile que cai uma violenta repressão da polícia que tinha entrado no recinto da Universidade, como conta Albano Nunes, à época secretário-geral da Reunião Inter-Associações (RIA), em artigo no Militante.
No dia seguinte realizam-se grandes reuniões e no dia 26 dá-se início ao luto académico sob a palavra de ordem «Ofenderam-te? Enluta-te!», com enormes plenários, reuniões, desfiles, greves às aulas. O governo fascista responde com mais violência da polícia de choque, resultando na prisão e expulsão de centenas de estudantes. A partir desse ano, o 24 de Março passa a ser o Dia do Estudante, sendo reconhecido pela Assembleia da República em 1987.

O movimento estudantil e a democratização do ensino

As lutas estudantis dos anos 60, nomeadamente a crise de 62, beneficiaram da experiência acumulada e da luta durante a ditadura fascista, desde os anos 30: com oComités de Defesa Académica, a eleição de Álvaro Cunhalpara o Senado da Universidade de Lisboa, o relançamento das Associações de Estudantes nos anos 50 e a criação das Comissões Pró-Associação ondeestas eram proíbidas e encerradas.
A luta contra o «decreto 40 900» em 1957, que pretendia esvaziar e governamentalizar todo o movimento associativo estudantil, permitiu que, pela primeira vez, a Assembleia Nacional fascista revogasse um decreto governamental após a intervenção do movimento estudantil.
A par da experiência acumulada, surgiam ecos da luta anti-imperialista em Cuba, na Argélia ou no Vietname, enquanto em Angola eram dados os primeiros passos na luta contra o colonialismo português. As eleições presidenciais de 1958, com a candidatura de Humberto Delgado, e as lutas dos trabalhadores contra o fascismo (que culminaram no 1.º de Maio de 1962) criaram condições favoráveis ao protesto estudantil.
Mas as reivindicações estavam intimamente ligadas com a vida da Universidade, como hoje acontece. Naquele ano de 1962, os estudantes lutavam pela democratização do acesso ao ensino - em 1959 apenas 2,9% dos estudantes universitários eram filhos de trabalhadores - e igualmente pela liberdade de organização dos estudantes nas suas Associações.

1962: iníco da onda de lutas estudantis que atravessaram a Europa nos anos 60

As lutas estudantis de 62 são inseparáveis do clima de ascenso da luta popular e democrática contra o fascismo: das manifestações contra a farsa eleitoral de 1961 em Almada, na Covilhã e em Alpiarça; das lutas dos assalariados agrícolas do Sul pelas 8 horas; das manifestações do 31 de Janeiro e do 8 de Março no Porto; da manifestação do 1.º de Maio em Lisboa.
O ano de 1962 é ainda marcado pela ocupação das instalações da Associação Académica de Coimbra (decidida em reunião magna, em Maio) e da Cantina da Universidade de Lisboa, em solidariedade com 80 estudantes que faziam greve da fome.
A repressão com que as forças fascistas responderam a todas as formas de luta e reinvidicações dos estudantes tiveram como efeito o seu contacto, em muitos dos casos pela primeira vez, com a verdadeira face do regime. Esta tomada de consciência levou a uma crescente politização dos estudantes e a uma identificação da sua luta e dos seus objectivos com a luta dos trabalhadores e do povo português pela liberdade e a democracia.
Ao contrário do que o regime tentou através dos seus instrumentos (nomeadamente dos órgãos de comunicação que tinha na mão), os estudantes sempre contaram com a simpatia e mesmo solidariedade da população, de diversos sectores, e mesmo de vários professores.
A crise de 62 inaugurou a onde de lutas estudantis que atravessaram a Europa nos anos 60. Cinquenta e cinco anos depois, o Dia do Estudante em Portugal permanece como dia de luta, das reivindicações dos estudantes do Ensino Superior.
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O DIA DO ESTUDANTE – por ANSEMO ANÍBAL (*)
https://www.facebook.com/groups/helenapato/permalink/1400616550012054/

É um facto indesmentivel que esse Dia do Estudante (de 1962) é sequência de uma luta organizada e de anos de trabalho conjunto dos universitários portugueses e das suas associações de estudantes na procura da adopção de um modelo de organização da Universidade, diverso do ditado pelas autoridades da ditadura.
1. No período posterior à publicação do dec-lei 40.900 (decreto de 12 de Dezembro de 1956, que “tentava” actualizar a legislação circum-escolar de 1932), lutou-se claramente contra tal diploma que consignava um conjunto de atentados a elementares princípios de tradição associativa: aboliam-se as assembleias gerais, exigia-se a autorização do director de escola para quaisquer realizações, determinava-se a presença de uma delegação permanente do director da escola junto de cada associação. Essa luta assumiu formas não previstas pelas autoridades: foram estabelecidos contactos com Ordens e Sindicatos, com os Conselhos Escolares das diversas escolas, com a Imprensa, distribuindo-se o texto do diploma e promovendo-se a sua discussão em assembleias gerais. Na chamada Assembleia Nacional a presença dos estudantes quando da discussão do decreto e as manifestações públicas em Lisboa e Coimbra, exemplificam bem o clima vivido e os problemas que trouxe às autoridades de então.
O próprio 40.900 e a luta a que conduziu as associações e o conjunto dos estudantes, originou um passo decisivo para “a real identificação do pensamento de todos os dirigentes associativos de Lisboa, fortalecendo substancialmente as estruturas de cúpula e foi o primeiro passo importante para a unidade da base estudantil de toda a Universidade”.
De 1958 a 1960 sublinhe-se uma actividade organizativa, na continuidade ao processo criado pelo 40.900. A luta consciencializara camadas mais latas de estudantes. Lembre-se aliás, o que não foi publicamente invocado em alguns Seminários de Estudos Associativos dos anos 60, mas que estava, como é evidente, na mente de todos: a campanha de massas de 1958 quando da “eleição” presidencial. Os textos “a Universidade e o momento político actual” é o nome dum texto da responsabilidade da Comissão Cívica Eleitoral dos Estudantes Universitários publicado nessa altura: nele se salientavam, com dados e números em apoio, que “o fim cultural da Universidade não se realiza actualmente” que “os órgãos universitários são ineficientes” que “a universidade é tecnicamente ineficaz” alheando-se “da integração na Nação”: que “o acesso à Universidade não é livre, por os estudantes serem apenas representantes de uma pequena parte das forças vivas da Nação”. Sublinha-se, então, que não “existe extensão universitária”, por os “interesses militares de sobreporem aos da formação universitária” e por o orçamento da Educação ser mínimo (8,8% do total do OGE em 1957 e 8.4% em 1958).
Este texto que tem muitos outros aspectos reveladores e ricos assume, como é evidente, a dimensão claramente política que, entretanto, os textos subscritos pelas A.E. não podiam ter, embora expressassem também um conteúdo claramente assumido contra a política educativa e universitária da ditadura. Aliás, em 1958, no V Dia do Estudante (19 de Março de 1958), entre outras manifestações, destacou-se a do plenário para discussão dos temas relativos às organizações circum-escolares universitárias.
Foram presentes 6 teses sob o tema geral “Para um melhor enquadramento das organizações de estudantes”.
Sublinhe-se, ainda, que em 1960 o Dia do Estudante é repartido por três dias de trabalho e comemoração, mostrando já uma nova movimentação do trabalho na área da Universidade: a eleição de uma “diferente” Direcção-Geral da A.A.C. em Coimbra e o sinal de um movimento cada vez mais generalizado aos estudantes portugueses.
2. Em 1961 já o Dia do Estudante é composto por 4 dias (16 a 19 de Março). Há colóquios, festival desportivo, sarau cultural, jantar (no ginásio da associação do Técnico), há uma participação crescente de todas as academias e de um número maciço de estudantes. Como se sublinha na tese já citada, tal movimentação é resultante, também, de um conjunto de iniciativas: da “tomada da Bastilha” (25 de Novembro em Coimbra, com delegados de Lisboa e Porto), à reunião nacional de Organismos Associativos Estudantis Portugueses (16 e 17 de Dezembro de 1961), à realização do 1.º Encontro Nacional de Imprensa Universitária (11 e 12 de Março de 1961).
Tudo isto tem lugar num clima político de grande tensão. A guerra colonial eclodira em Angola (4 de Fevereiro). Em Abril de 61 teve lugar, aliás, uma tentativa de golpe de Estado. Movimentos populares tinham variadas expressões. A “campanha” de Out. 61 é, mais uma vez, momento de luta contra o regime e denúncia alargada do que o caracteriza.
3. Conhecem-se as razões imediatas da “crise” estudantil de 1962. Acentuara-se, desde o inicio de 62, uma situação de luta nas Escolas: os estudantes não aceitam cooperar nas comemorações dos cinquenta anos da Universidade Clássica pelas restrições feitas à participação estudantil, manifestando-se perante o então chamado Presidente da República. A Cantina Universitária de Lisboa que fora entregue a particulares (sendo a sua administração ridicularizada, visando-se os administradores e as autoridades académicas), acaba por ser gerida por uma comissão mista de estudantes e professores.
A 24.3.62, data do Dia do Estudante, a Cidade Universitária, ao Campo Grande, em Lisboa, apareceu bloqueada pela Policia. O ministro da Educação fora avisado (desde meses antes) da realização do “Dia do Estudante”. Esse bloqueamento e as provocações que se lhe seguem estão na razão directa da concentração de milhares de estudantes e do luto académico que se vai seguir nos meses seguintes. Quem viveu esses momentos e a sequência dos acontecimentos, recorda-se, sem dificuldade, do trajecto de muitos estudantes para o restaurante do Lumiar onde se iriam discutir os problemas e as agressões que foram vitimas.
As adesões, dos primeiros momentos, de Conselhos Escolares, a demissão do Reitor da Universidade Clássica – em conflito com a orientação do ministro do Interior e em busca de certa imagem de “liberdade” que lhe terá servido em 68-69 para a chamada “primavera marcelista” – o próprio recuo – aparente – do Governo, são bem significativas da amplitude e da força do movimento estudantil. As Assembleias Plenárias tinham – em regularidade e em convocação sumária – milhares de presenças, a decisão democrática impôs-se como metodológica de acção e a criação, na luta de muitos quadros, era elemento fundamental que decorria da acção dos estudantes que se colocavam, assim “numa das primeiras filas do movimento antifascista”. Refiram-se os movimentos de Maio de 62 contra as 1500 prisões em Lisboa e Coimbra e ligue-se isto às lutas de operários agrícolas e industriais, designadamente aquelas que, embora vindas de longe, tiveram uma importante expressão de massas, exactamente em Maio de 62: a luta pelas 8 horas e, em vários locais, pelos 40$00 de jorna. Refiram-se as prisões de dirigentes e as expulsões e ligue-se isto à política descarada de mentira que as autoridades fascistas prosseguiam na comunicação social e à política de repressão que prosseguiam em Portugal e em Angola, designadamente.
Não se pode deixar de concluir daqui, que houve uma direcção de luta estudantil que não só coexistiu com a luta geral contra o fascismo e o colonialismo, como se inseriu nela e lhe deu a força da sua expressão própria: para mais salienta-se (e reitera-se) que a ligação entre dirigentes e estudantes assumiu formas de auscultação muito capazes, dando uma expressão de reforço democrático ao movimento estudantil. A condução da luta, nas circunstâncias difíceis que se conheceram então, teve em conta amplas camadas estudantis e a sua disposição à defesa dos interesses globais dos estudantes portugueses, procurando-se também o apoio da grande maioria do corpo docente – mas denunciando- -se, sem hesitações, os docentes que hostilizavam e caluniavam os estudantes – e da população – tanto em Coimbra (visível no apoio do comércio de Coimbra) como em Lisboa (a nível de petições e comunicados de intelectuais, médicos, etc.).
A análise demorada – e devidamente documentada – da crise de 1962 continua a fazer-se. Os documentos da época e os depoimentos necessários são ainda um ponto de reflexão para fazer uma aproximação mais sistematizada ao assunto, de tantos reflexos, na sequência do processo político português.
4. Lembro-me que, numa das RIAS de 64-65 – em conversa de corredor – se lembrava o facto de a greve da Universidade de Coimbra de 1907, ter procedido, em 3 anos, a queda da monarquia e o advento do regime republicano...Não partíamos daí – naturalmente – para o esquematismo primário de que as coisas “aconteceriam em determinado momento: mas não duvida que a crise de 62 e os seus prolongamentos até 65 – e, posteriormente, os movimentos de 69-72 até à queda do fascismo – contribuíram largamente para a compreensão – por parte de muitos e muitos – de que lado estavam em relação ao problema político. Os movimentos estudantis – assumindo uma importante expressão de massas, criando e estruturando uma consciência antifascista que muitos assumiram, forjando quadros e técnicos que, para além da dimensão profissional e cientifica, ganharam no ano do seu percurso pelas Universidades, uma largueza de horizontes que a ditadura, que se abatera sobre o Pais não queria, manifestamente, que existisse – foram importantíssima escola de formação de quadros que ajudaram ao amplíssimo movimento de resistência que fez eclodir variados tipos de lutas, com o consequente alargamento da consciência a novas camadas e grupos sociais.
5. Os anos seguintes, com vitórias e inêxitos, continuam 1962.
O Decreto-Lei 44632 (de 15 Outubro de 1962) vem estabelecer um novo regime das actividades circum-escolares procurando ainda, aparentemente, ter conta a situação das organizações circum-escolares cujos “corpos gerentes foram privados de funções em consequência de despacho ministerial de 13 de Abril de 1962”. A luta contra tal decreto-lei esteve na primeira linha da preocupação dos estudantes de 63, 64, 65. Numa carta aberta colectivamente assinada por presidentes das Associações e Pró-Associações da Universidade de Lisboa nos inícios de 1965 situava-se bem o problema, face ao destinatário da carta o então ministro da Educação Nacional, Galvão Teles. Dizia-se nessa carta – e referindo-se a um discurso desse ministro de finais de 1964 – que as tentativas de recuperar a Mocidade Portuguesa eram vás. Aliás, sublinhava-se também que “vários são os agrupamentos de minorias activistas que a Universidade tem conhecido, extinguindo-se todos eles em curto prazo de tempo, não por falta de encorajamento do exterior, mas por falta de audição no interior. Assim é que, por cá, têm desfilado o Movimento Jovem Portugal, o Movimento dos Estudantes Universitários de Portugal (conhecido por Meu Portugal), a Acção Académica e a Frente dos Estudantes Nacionalistas – os quais são apenas sucessivas e precárias tentativas de salvar as ideias do desprestigio das organizações. A sua eficácia é diminuta e a sua vida é efémera – mas a da Mocidade Portuguesa nem isso: na Universidade, a MP não tem vida é uma mera tabuleta”.
Ligado directamente ao problema da legislação situa-se o problema da legalização das Pró-Associações. Mas para além destes problemas claramente estudantis abordam-se nesses anos – continuam a ser abordados – problemas como os das estruturas institucionais nas Universidades: é assim que, na carta aberta já referida, são apresentados como pontos 1 e 2 de pontos a resolver o “da eleição dos reitores e directores pelos órgãos universitários representativos” e o da “representação dos estudantes nos Conselhos Escolares e Senado Universitário”.
A repressão, entretanto, alargara-se e dezenas de estudantes foram presos. As reacções foram vigorosas – designadamente as do inicio de 1965, que respondem à actuação policial – tendo, entretanto, menor capacidade de mobilização de massas. O recrutamento para as Forças Armadas era uma das armas utilizadas para desviar quadros associativos; a intimidação e a hostilidade, de professores para com estudantes com cargos associativos – mesmo quando excelentes estudantes – eram outras armas de tentativa de desmobilização e descrença.
6. Relendo, hoje, 40 anos depois, boletins, jornais, comunicados das
associações é inegável a importância de tudo quanto se fez nesses anos difíceis. O fascismo sofreu aí variados percalços, que tiveram variadíssimos ecos e um dos que não foi menor foi aquele que atingiu as Forças Armadas e que veio a permitir o 25 de Abril de 1974. Na efeméride do 24 de Março de 1962, entende-se bastante do que foi e é a história do Pais, antes e depois da viragem histórica de 1974 – 1975.
(*) O texto é da autoria de Anselmo Aníbal, falecido em 2009 aos 66 anos e foi escrito em 2002, a pedido da comissão organizadora das comemorações naquele ano, mas nunca chegou a ser publicado. Porque a sua actualidade se mantém, agora se publica. É também uma homenagem ao corajoso dirigente académico e ao cidadão com uma lúcida e permanente intervenção cívica.
In http://anselmoanibal.blogspot.pt/
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Dez anos de lutas estudantis, 1951/1961 (continuação)
A propósito do Dia do Estudante de 1962
Uma interpretação pessoal dos acontecimentos da altura, por quem os viveu
(Hoje, 55 anos após estes acontecimentos, cerca de 150 participantes desta luta, reúnem-se num jantar comemorativo na Cantina da Cidade Universitária.)
E eis-nos chegados a 24 de Março de 1962. Os acontecimentos são, de uma forma geral, conhecidos de todos: proibição governamental do Dia do Estudante, invasão policial da Cidade Universitária e encerramento da Cantina Universitária. Os autocarros que transportavam estudantes de Coimbra são impedidos de entrar em Lisboa. Os estudantes que vinham de comboio, são interceptados na estação da Amadora e transportados de regresso a Coimbra, em carrinhas da Polícia. Reunidos em plenário no Estado Universitário, os estudantes sofrem a primeira carga policial. No dia seguinte é decretado o Luto Académico com greve ás aulas, a que os estudantes aderem massivamente a partir de 26 de Março. Tinha início a Crise Académica de 1962 que ia durar 100 dias e que seria a mais longa luta de contestação ao regime, durante a sua vigência. Pelo caminho ficaram diversas manifestações e reuniões plenárias, muitas delas sujeitas a violentas cargas policiais, a suspensão das direcções das Associações de Estudantes de Lisboa e da AAC e a proíbição das actividades das Comissões Pró-Associação de Letras, Medicina e Belas-Artes. Até um jogo de futebol, o Académica-Beira Mar, foi suspenso por causa do Luto Académico. A 9 de Maio dá-se o que será, talvez, o momento mais alto desta luta e que perdura na memória de todos: é decretado o Luto Académico total, com greve às aulas, às frequências e aos exames e um grupo de 80 alunos inicia uma greve de fome na cantina. Em solidariedade com estes, cerca de 1.200 estudantes ocupam as instalações. À noite, a polícia invade a cantina e prende todos os que se encontravam no interior. Transportados em autocarro da Carris fretados para o efeito, são conduzidos ao quartel da Polícia de Choque, na Parede, uns, enquanto outros vão par o Forte de Caxias. As raparigas vão para os calabouços do Governo Civil, onde são encerradas nas mesmas celas onde se encontravam, prostitutas, carteiristas, alcoólicas e outras.
Há dois aspectos desta luta que são muito relevantes, mas pouco falados. O primeiro é que todas as decisões eram democraticamente tomadas em reuniões abertas a todos os estudantes, quer em plenários de toda a Universidade, quer em reuniões por faculdade. O outro é que, apesar de toda a repressão, a ditadura nunca conseguiu abafar a voz dos estudantes: a PIDE nunca descobriu onde eram impressos os comunicados que as associações distribuíam aos estudantes e à população dando conta dos diversos acontecimentos, assim como nunca conseguiu destruir a sua rede de distribuição. O movimento estudantil venceu a batalha da informação, o que foi de uma importância vital para o prosseguimento da luta. Por esta razão, a luta estudantil recebe o apoio de vários sectores da população, das classes mais baixas aos intelectuais. Os estudantes, por sua vez, têm uma participação muito activa nas grandes manifestações populares de 1 e de 8 de Maio, em Lisboa.
O governo não podia ficar-se só pela repressão policial bruta, tinha de ir mais além para tentar quebrar a espinha ao movimento. Assim, em 29 de Junho, um despacho do Ministro da Educação, Lopes de Almeida, determina as penas de expulsão aplicadas a estudantes de Coimbra e de Lisboa. Vinte dos estudantes protagonistas da greve de fome são expulsos da Universidade de Lisboa por 30 meses. Em Coimbra, 39 estudantes sofrem penas diversas, alguns com expulsão de todas as Universidades por dois anos. Era o fim da Crise Académica de 1962.
E, no entanto, a ditadura nunca conseguiu abafar a voz dos estudantes ou destruir as suas associações. Como se veria nos anos seguintes. A luta estudantil teve um papel essencial na formação de uma consciência cívica e democrática em muitos jovens e amplificou a luta contra o regime. Abalou fortemente o regime, desestabilizou a estrutura da sociedade portuguesa, despertou muitas consciências para a realidade social e política do país e deixou uma marca indelével em todos os estudantes e professores das três universidades. A Universidade nunca mais foi a mesma, as Associações de Estudantes tornaram-se centros de contestação ao regime, onde se forjaram muitos combatentes anti-fascistas e de onde saíram muitos dos quadros políticos que haveriam de emergir após o 25 de Abril.
“Temos de tomar estas medidas ou daqui a dez anos são eles que estão aqui sentados” Afirmação de Salazar ao Ministro da Educação de então, quando da proibição. Enganou-se por pouco.

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2014
hj é dia do ESTUDANTE e tb dia mundial da Juventude!!!Dia de luta pelas causas específicas mas tb pela ESCOLA PÚBLICA, PELO EMPREGO contra a precariedade, contra a fuga de jovens para a emigração...A exploração desenfreada capitalista está a afectar tds os escalões etários...O mísero salário que os capitalistas portugueses "concedem" aos jovens é uma vergonhaaaaaaaa...A jovem deputada Rita Rato (PCP) dá 1 exemplo de luta institucional!!!

https://www.youtube.com/watch?v=PrB0aXnOFgc
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2012

Dia do Estudante - 50 anos depois


O 24 de Março de 1962 assinala um marco histórico da luta dos estudantes portugueses contra o fascismo e pela liberdade, pelo direito de reunião e de associação, pela autonomia da Universidade e a democratização do ensino. Durante meses, através de grandes plenários, concentrações, manifestações e greves, os estudantes enfrentaram corajosamente proibições, encerramento de associações e instalações académicas, cargas policiais, prisões em massa, processos disciplinares, expulsões, todo o arsenal da violência e repressão fascista, em jornadas memoráveis que contribuíram fortemente para desmascarar, isolar e enfraquecer o fascismo.
Não pode ignorar-se o contexto de afluxo da luta popular em que se desenvolveram as massivas e combativas jornadas estudantis que, tendo como motivação imediata a proibição do Dia do Estudante em Lisboa, se estenderam a Coimbra e também ao Porto conferindo ao movimento uma dimensão nacional. Aquele é também o tempo das históricas manifestações do 1º de Maio de 1962 que em Lisboa mobilizou mais de cem mil pessoas e das heróicas greves do proletariado dos campos do Sul que impuseram ao fascismo e aos latifundiários as 8 horas.
Simultaneamente é importante sublinhar que a “crise académica de 62” se inscreve numa longa tradição de luta estudantil que impôs a existência legal das Associações de Estudantes e derrotou as tentativas da ditadura para fascizar a Universidade. Numa ligação dialéctica com o movimento operário e a oposição democrática, o movimento estudantil afirmou-se como uma importante componente do movimento popular de massas que conduziu à revolução de Abril.
As lutas académicas de 1962 constituíram uma extraordinária afirmação de unidade na luta por liberdades fundamentais e outras reivindicações imediatas, de estudantes de diferentes opções políticas e ideológicas em que os dirigentes e activistas associativos membros do PCP tiveram reconhecidamente um papel fundamental, papel que muitos pretendem apagar e que, no interesse da verdade histórica, é necessário não deixar esquecer.
Esse é também um dos objectivos desta iniciativa com que assinalamos o 50º aniversário do 24 de Março de 1962 que, pelo seu significado e importância, passou a ser assinalado e comemorado em Portugal como o Dia do Estudante.