onde trabalha como tradutor.
Publicou as seguintes obras: Um mover de mão (2000), Imo (2003), Lúcifer (2003), 47 (2005), A prisão e paixão de Egon Schiele (2005), Omertà (2007), Cerco Voluntário (2009), Rusga (2010), Napule (2011), A Fábrica (2013), Fera oculta (2014).
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“segredo segreda-me a canção dos dias sem que nos oiça a noite terrível e deixa que dance em mim a voz, a voz azul que é o lugar onde o mundo não pára de nascer. segreda-me o teu nome, agora, e farei de nós o amor, a constelação, o sonho de uma estação”
Vasco Gato fala-nos de um lugar de figurações, tensões abstractas, ambiguidades, analogias, predomínio de um Eu impessoal sobre um Eu empírico. Tudo aí é significativo, recíproco, convertível, correspondente Esta poesia afirma o primado da imagem metafórica.
https://escritores.online/livros/imo/
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(…) Falo de um homem que possuía livros de poemas. Foi talvez o único real leitor de poesia. Ele abria os livros, um livro. Escolhia um poema. Era um ritual misterioso. Porque ele raspava as letras da página, cuidadosamente, como para conservar a integridade do papel. Raspava e reunia os pedaços negros. Aquecia então água com o vagar próprio da vertigem. Uma estranha ciência de vapores. (…) Veio de muito longe o homem que me pagou todas as dívidas na cidade. Tinha cabelo liso e não falámos muito. Eu estava calmo. Dormi uma última noite antes de partir. A última noite é para o homem que veio de muito longe poder afastar-se. A última noite, não tenhas ilusões, é para ficar a dever. (…)
https://escritores.online/livros/omerta/
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9dez2017
UM DIZER AINDA PURO
imagino que sobre nós virá um céu
de espuma e que, de sol em sol,
uma nova língua nos fará dizer
o que a poeira da nossa boca adiada
soterrou já para lá da mão possível
onde cinzentos abandonamos a flor.
dizes: põe nos meus os teus dedos
e passemos os séculos sem rosto,
apaguemos de nossas casas o barulho
do tempo que ardeu sem luz.
sim, cria comigo esse silêncio
que nos faz nus e em nós acende
o lume das árvores de fruto.
diz-me que há ainda versos por escrever,
que sobra no mundo um dizer ainda puro.
https://escritores.online/escritor/vasco-gato/
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Via Graça Silva
Que não se enganem
os que compram as horas por atacado
para do teu suor extraírem
a bandeira de um país que nunca será o da atenção
que nunca será o da morada
mas sempre e sempre
o território homeopático da extinção
em que os troféus são
joelhos vergados à condição de cera
para os soalhos do progresso
cujo verdadeiro nome é
despovoamento
Vender-te-ão o conforto
a perseverança o brio
como se tivéssemos por fito
a acumulação do tempo
sem o fruirmos boca a boca
desesperadamente
garantir o futuro dir-te-ão
sem repararem na estupidez do repto
pois que poder temos nós
sobre as válvulas biológicas
do nosso prazo
pra nos arrogarmos a garantir
o que quer que seja
quanto mais o sumo fruto da inexistência
esse futuro-cano-enfiado-na-boca
para ser disparado sem falta
de manhã e ao deitar
Em volta sucedem-se clarões
e abismos inóspitos
os elementos torcem-se na pesca à linha
dos lugares fundamentais
há uma convulsão de panorama
para o brevíssimo turismo
dos olhos
mas o importante é a matemática mesquinha
do sangue que furtamos uns aos outros
a medalha de carne pútrida
com que esperamos aparecer
na fotografia da época
Que se foda a época
digo-te já
que se foda a sépia dos futuros
eu quero aparecer no dia
do teu nascimento
desarmado como uma árvore
sem outra missão que não
amparar-te o susto
e dizer-te baixinho
bem-vindo ao continente dos frágeis
podes parar de nadar
Fera Oculta IV..." é um livro pequeno escrito para o filho quando este estava para nascer"