19/01/2015

9.427.(19jan2015.18h) Fiama Hasse Pais Brandão

Nasceu a 15ag1938
e morreu a 19jan2007
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http://cvc.instituto-camoes.pt/poemasemana/19/lugares1.html
Nasceu em Lisboa, em 1938.
O seu primeiro livro, Em Cada Pedra Um Voo Imóvel, é de 1958. Em 1961, comMorfismos, 
participou na publicação colectiva Poesia 61 (designação dada a um conjunto de cinco
 «plaquettes» de poesia então publicadas, com a intenção de contribuir para a renovação 
da linguagem poética). No mesmo ano, foi editada a sua primeira peça de teatro, distinguida 
com o Prémio Revelação da Sociedade Portuguesa de Escritores.
Além da poesia e do teatro, a obra de Fiama estende-se aos domínios do ensaio, da ficção
 e também da tradução.

Fiama foi distinguida por duas vezes com o Grande Prémio de Poesia da Associação 
Portuguesa de Escritores (1996 e 2000).
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15aGOSTO2019
Via Susana Duarte:
 EPÍSTOLA PARA OS MEUS MEDOS, de Fiama Hasse Pais Brandão (15 de Agosto de 1938 — 19 de Janeiro de 2007).
.
Sois: os sons roucos, a espera vã, uma perdida imagem.
O coração suspende o seu hálito e os lábios tremem
sinto-vos, vindes ao rés da terra, como ventos baixos,
poisais no peitoril. Sois muito antigos e jovens,
da infância em que por vós chorava encostada a um rosto.
Que saudade eu tenho, ó escuridão no poço,
ó rastejar de víboras nos caniços, ó vespa
que, como eu, degustaste o figo úbere.
Depois, mundo maior foi a presença e a ausência,
a alegria e as dores de outros que não eu.
E um dia, no alto da catedral de Gaudì,
chorei de horror da Queda, como os caídos anjos.

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Foto:
Pormenor da Sagrada Família, de Gaudì.
CC0 - via www.maxpixel.net

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https://www.facebook.com/photo.php?fbid=912990418755915&set=a.107207769334188.12956.100001348957610&type=3&theater
Nada tão silencioso como o tempo
Nada tão silencioso como o tempo
no interior do corpo. Porque ele passa
com um rumor nas pedras que nos cobrem,
e pelo sonoro desalinho de algumas árvores
que são os nossos cabelos imaginários.
Até nas íris dos olhos o tempo
faz estalar faíscas de luz breve.
Só no interior sem nome do nosso corpo
ou esfera húmida de algum astro
ignoto, numa órbita apartada,
o tempo caladamente persegue
o sangue que se esvai sem som.
Entre o princípio e o fim vem corroer
as vísceras, que ocultamos como a Terra.
Trilam os lábios nossos, à semelhança
das musicais manhãs dos pássaros.
Mesmo os ouvidos cantam até à noite
ouvindo o amor de cada dia.
A pele escorre pelo corpo, com o seu correr
de água, e as lágrimas da angústia
são estridentes quando buscam o eco.
Mas não sentimos dentro do coração que somos
filhos dilectos do tempo e que, se hoje amamos,
foi depois de termos amado ontem.
O tempo é silencioso e enigmático
imerso no denso calor do ventre.
Guardado no silêncio mais espesso,
o tempo faz e desfaz a vida.
in cenas vivas - relógio d'água (2000)
***
DOMUS
Ouvirei os ruídos (dos) vivos, percurso de mortos, passadas
horas de afastamento e das visões nítidas;
a ciência dos náufragos, eterno retorno; a vaga
do início das águas, primeiros sentidos da terra
ou hespérida. Hinos (era de ouro) ao sangue
que no atrito circula; à seta, em sua árvore
de arco; à espécie, o primeiro nado. Hóspede
de solo, humano, ergui o corpo; saúda
em Atlântida a ágora; saúda a urbe (onírica).
Onde penetram os membros, esse cortejo. Congregue
os animais; na praça a cúpula vibre. Seus dons exerça
em exílio — numa estação adversa ou oiço
em fontanários e harpas o mesmo
brado: o desejado sítio, ó espera."
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http://lugardaspalavras.no.sapo.pt/poesia/fiama/do_mar.htm
Do mar
Aqueles de um país costeiro, há séculos,
contêm no tórax a grandeza
sonora das marés vivas.
Em simples forma de barco,
as palmas das mãos. Os cabelos são banais
como algas finas. O mar
está em suas vidas de tal modo
que os embebe dos vapores do sal.

Não é fácil amá-los
de um amor igual à
benignidade do mar.
*
http://lugardaspalavras.no.sapo.pt/poesia/fiama/do_amor.htm
Do amor IV





Esta vista de mar, solitariamente,
dói-me. Apenas dois mares,
dois sóis, duas luas
me dariam riso e bálsamo.
 arte na natureza pede
o amor em dois olhares.
*
http://lugardaspalavras.no.sapo.pt/poesia/fiama/da_fala.htm
Da voz das coisas





Quando ainda não sabia as palavras possíveis
para passar entre voz e silêncio dos outros,
tal como entre troncos das florestas mudas,
eu falava com as nuvens que vinham
sobre nós a cantar, de trémulas asas,
e aspergiam os aromas do êxtase.
*
http://lugardaspalavras.no.sapo.pt/poesia/fiama/dancam.htm
Dançam; dançam





Como se no mar as ondas
não se arqueassem o bastante.

Como se na terra as pedras
não se elevassem o bastante.

Como se no ar as nuvens
não rodassem o bastante.

Como se o azul planetário
não fosse o longe bastante.

Dançam.
***
Via face

https://www.facebook.com/pages/Fiama-Hasse-Pais-Brand%C3%A3o/279224368757108
A Matéria Simples
Os brilhos que na noite vêm
são dos olhos dos que sonham,
viagens pelos mares de outras águas.
São os que não gostam de se elevarem
no ar sobre os antigos oceanos
e amam os pequenos riachos
e o fundo invisível dos poços.
(in: Fábulas)
**
O Nada. Sobretudo na Fase de Exaltação
Os ramos de árvores despidos que nos lembram
o nada. Sobretudo na fase de exaltação
do espírito. Com a cabeça encostada
aos vidros altos.
Simultaneamente procurar o centro
da irradiação. O Sol matinal com os seus hiatos
preenchidos por casas. Ameias onde se
invertem os vértices do horizonte.
Sol magnânimo
fixo sobre as árvores abençoadas sem
folhas. Infinitos pormenores visíveis e
espaços audíveis preenchem a hora exaltada.
Ponto profusamente cheio. Um fino
silêncio exterior
sinal do nada circundante. Graveto
junto de graveto cruzados para além do fim
da perspectiva. Um significado diverso
naquelas ameias em outros planos. O nada
sempre coeso. Uma respiração intangível
e sem sombras.
 Três Rostos, Lisboa: Assírio e Alvim, 1989.
***
via infopédia
***
Livros:

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biografia:
http://www.netprof.pt/netprof/servlet/getDocumento?id_versao=16831
***
http://poesiaseprosas.no.sapo.pt/fiama_h_pais_brandao/poetas_fiamahpbrandao_asvesezas01.htm
Às vezes as coisas dentro de nós
O que nos chama para dentro de nós mesmos
é uma vaga de luz, um pavio, uma sombra incerta.
Qualquer coisa que nos muda a escala do olhar 
e nos torna piedosos, como quem já tem fé.
Nós que tivemos a vagarosa alegria repartida
pelo movimento, pela forma, pelo nome,
voltamos ao zero irradiante, ao ver
o que foi grande, o que foi pequeno, aliás
o que não tem tamanho, mas está agora 
engrandecido dentro do novo olhar.


                       Para Maria de Lourdes Pintasilgo
                                em breve homenagem


As Fábulas
edições quasi
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Via
http://lugardaspalavras.no.sapo.pt/poesia/fiama.htm
Do amor IV





Esta vista de mar, solitariamente,
dói-me. Apenas dois mares,
dois sóis, duas luas
me dariam riso e bálsamo.
 arte na natureza pede
o amor em dois olhares.
***
Via Lusa:
 poetisa, escritora, dramaturga, ficcionista, ensaísta e tradutora. 
Entre as obras de poesia contam-se "O Texto de João Zorro", "Novas Visões do Passado", "Homenagem à Literatura", "Área Branca", "Três Rostos", "Epístolas e Memorandos" e "F de Fiama", enquanto no campo da prosa escreveu "O Retratado", "Falar sobre o Falado" e "O Movimento Perpétuo", 
e para o teatro ""Os Chapéus de Chuva", "O Testamento", "Põe ou o Corvo", "Quem Move as Árvores" e "Noites de Inês Constança". 
Prémio de Revelação de Teatro da Sociedade Portuguesa de Escritores, Prémio D. Dinis de Poesia, Grande Prémio de Poesia da Associação Portuguesa de Escritores e Prémio da Associação de Críticos Literários com o seu último livro "Contos da Imagem" (2005).
***

Via Citador:
Viveremos sempre pela metade enquanto não tivermos um olhar que complemente o nosso, pelo amor:
***

(Vincent van Gogh)
http://jardimdasdelicias.blogs.sapo.pt/poema-fiama-hasse-pais-brandao-617167
Todo o Ser, na sequência
das transformações, apela
um dia para ser outro.
Em Setembro, na pequena casa
de troncos e dúbio colmo,
apaga-se o alvor da manhã
em janelas, porventura poças.
Da soleira desce-se então
para um berço da caruma,
chão que inebria o olfacto.
Depois do sol, as nuvens
insistem uns dias em espelhar-se
nos resíduos de chuva.
(in Setembros)
***
http://contosdiaadia.blogspot.pt/2010_04_01_archive.html

Apocalipse - Fiama Hasse Pais Brandão

Poema


.
Quando passa o tempo, as coisas
retornam aos elementos. E as cria-
turas. Para a transformação
final. Mas nem o fim
permanece. O cardume dos lagos
que morre embranquecido
por fim é de água. Os boquilobos
multicolores na beira das áleas
caem na terra e são terra. 

.
.

in "Três Rostos - Ecos"