06/07/2009

Há tanto ano...Eça dixit


“O paiz perdeu a intelligência e a consciencia moral. Os costumes estão dissolvidos, as consciencias em debandada, os caracteres corrompidos. A prática da vida tem por única direcção a conveniencia. Não há princípio que não seja desmentido. Não há instituição que não seja escarnecida. Ninguém se respeita. Não há nenhuma solidariedade entre os cidadãos. Ninguém crê na honestidade dos homens públicos. Alguns agiotas felizes exploram. A classe média abate-se progressivamente na imbecilidade e na inercia. O povo está na miséria. Os serviços publicos são abandonados a uma rotina dormente. O desprezo pelas ideias augmenta em cada dia. Vivemos todos ao acaso. Perfeita, absoluta indifferença de cima a baixo! (…) As quebras succedem-se. O pequeno commercio definha. A indústria enfraquece. A sorte dos operarios é lamentavel. O salario diminui. O Estado é considerado na sua acção fiscal como um ladrão e tratado como um inimigo. N´este salve-se quem puder a burguezia proprietaria de casas explora o aluguel. A agiotagem explora o juro. A ignorancia pesa sobre o povo como uma fatalidade. (…) Não é uma existencia, é uma expiação. A certeza d´este rebaixamento invadiu todas as consciencias. Diz-se por toda a parte: o paiz está perdido! (…) E que se faz? Attesta-se, conversando e jogando o voltarete, que de norte a sul, no Estado, na economia, na moral, o paiz está desorganisado – e pede-se cognac!» – in “Farpas"

de 1871 de Eça de Queiroz e Ramalho de Ortigão, págs. 4, 5 e 6”