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PCP diz que o Orçamento de Estado para 2010 não contempla “nem um cêntimo” para a modernização da linha do Oeste
A exigência e urgência da requalificação da linha do Oeste foi o tema de uma sessão organizada pelo PCP na passada sexta-feira, no qual estiveram presentes destacados dirigentes locais do PSD, CDS e BE. O debate foi estimulante e a convergência de ideias quase total, mas o público presente no auditório da Câmara limitou-se meia centena de pessoas, a maioria ligada ao partido que organizou o evento.
“Apesar das promessas do governo, a proposta do Orçamento de Estado não tem nem um cêntimo para a linha do Oeste”. Bruno Dias, deputado do PCP na Assembleia da República, lembrou que a modernização desta infra-estrutura tem sido uma promessa sucessivamente adiada pelos partidos do bloco central (PS e PSD), mas que esperava que desta vez o governo assumisse os seus compromissos para com a região quando assinou as compensações pela deslocalização do aeroporto da Ota para Alcochete.
Afinal, não é isso que se está a verificar, continuando o governo a privilegiar os investimentos em auto-estradas, tal como tem vindo a acontecer desde há uma década.
O deputado disse as populações têm direito à mobilidade e a ter transportes públicos e que estes fazem parte da política de ordenamento do território do país, coisa que não tem acontecido porque as decisões do governo nesta área têm vindo a privilegiar a segmentação e o favorecimento dos privados em detrimento do bem comum.
Bruno Dias diz que “a rede de transportes tem de ser gerida como um todo” e criticou as decisões que têm levado à segmentação da CP, dividindo esta empresa pública – “que deveria estar ao serviço das populações” – em unidades de negócios com o objectivo de serem privatizadas. A consequência disso, avisou, é que as tarifas serão mais caras, as pessoas ficarão mais mal servidas, o investimento cairá porque o objectivo será o lucro imediato e o país e as pessoas ficará a perder, excepto os grupos privados que ficarem com o negócio.
Contra as privatizações e as concessões
Francisco Asseiceiro, do Organismo de Transportes de Lisboa do PCP, disse que a modernização da linha do Oeste tem impacto não só na região como em todo o país, uma vez que a rede ferroviária é arbórea, constituída por um tronco comum que é a linha do Norte a partir do qual irradiam as outras linhas férreas. Por isso, os comboios deveriam ser directos a Lisboa para entroncar na rede para sul. Já para norte, a alta velocidade a passar por Leiria constitui uma oportunidade única para a linha do Oeste que poderá assim ficar ligada a toda a rede nacional.
Este engenheiro, especialista em caminhos-de-ferro, disse ainda que a modernização da linha do Oeste tem sido preterida porque a agenda de investimentos dos governos têm estado associadas à privatização de sectores-chave, nos quais os direitos dos trabalhadores ficam fragilizados. “Tudo o que não esteja associado ao sector privado fica para trás”, disse.
A defesa do investimento público e da CP como empresa pública nacional e a recusa de quaisquer concessões a privados foi, aliás, uma tónica em todo o debate.
José Raposo, dirigente regional do PCP, lembrou logo no início que a modernização da linha do Oeste foi uma promessa do governo no âmbito das compensações pela Ota e exigiu a electrificação desta infra-estrutura, bem como a reconfiguração dos horários, novo material circulante e “preços mais justos e acessíveis para tornar o comboio mais atractivo”.
Durante o debate, o arquitecto caldense Jaime Neto (que foi candidato independente pelo PS nas listas para a autarquia caldense) chamou a atenção para a importância das estações enquanto nós dos sistema de transportes, dizendo que não basta modernizar a linha, sendo necessário agir também nesses pontos da rede para aumentar a mobilidade das pessoas.
Um tema para unir e não para dividir
Sinal de maturidade da democracia portuguesa, estiveram num debate do Partido Comunista, dirigentes do PSD, CDS/PP e BE. Deste último, Fernando Rocha (deputado municipal nas Caldas) referiu que o estado actual da linha do Oeste é um “escândalo” e Manuel Isaac lamentou que estivessem tão poucas pessoas presentes no debate, prova de que “a sociedade civil não se mexe” para defender esta causa.
O deputado centrista disse ainda que estava de acordo com tudo o que fora dito pelos comunistas, excepto no que se referia à recusa dos privados operarem nos sistemas de transportes.
Também a deputada social democrata na Assembleia da República, Maria da Conceição Pereira, usou da palavra, agradecendo o convite do PCP para estar presente, mas mostrou estar a milhas do tema, confundindo - num discurso muito pouco escorreito - a CP com a Refer. Sublinhou, no entanto, que a modernização da linha do Oeste era um tema que deveria “unir-nos a todos e não dividir-nos” e que não se devia “atirar pedras”, respondendo assim às acusações dos comunistas contra o PSD e o PS pelas promessas não cumpridas.
Bruno Dias disse estar de acordo, mas referiu que os governos são constituídos por pessoas e que foram delas as decisões emanadas que levaram à actual situação da linha do Oeste. E contou que o seu partido propôs em sede de Orçamento do Estado uma verba para a reabilitação daquela infra-estrutura e que alguns dos que agora assinaram uma petição para defender a linha, votaram contra essa proposta.
Especialista diz que Caldas pode ficar na rede de alta velocidade
Fransciso Asseiceiro, engenheiro com experiência em empresas da Refer e agora a trabalhar num grupo privado ligado à ferrovia, contou a curiosa aproximação do projecto português de alta velocidade às teses defendidas pelo PCP de considerar o caminho-de-ferro com um todo:
“Primeiro achava-se que o TGV deviam ser uma coisa desligada do resto da rede, sem qualquer interferência com a rede convencional. Depois pensou-se, e bem, que as estações deveriam ser comuns para permitir a intermodalidade entre os dois tipos de comboios e por fim descobriram que com a tecnologia espanhola dos intercambiadores [aparelhos que permitem adaptar os rodados das composições aos dois tipos de bitola], o TGV pode circular também em todas as linhas, tirando partido das velocidades ganhas nos corredores de alta velocidade”.
É graças a isso que será possível, por exemplo, um comboio de alta velocidade vir do Porto para Lisboa passando por Leiria e vindo depois pela linha do Oeste. O mesmo pode acontecer em sentido contrario: uma composição de alta velocidade sair de Lisboa, parar nas Caldas e em Leiria e seguir para o Porto. Ou seja: o TGV nas Caldas é possível.
Carlos Cipriano