17/05/2010

2.683. Eugénio Rosa explicita as consequências nefastas do acordo PSD/PS (Passos Coelho/ José Sócrates) no dia em que muitos estavam entretidos com Fátima e Papa.

o resumo:
Medidas anti-défice agravam desigualdades, crise social e situação económica

- Aumento do IRS este ano sobre trabalhadores e pensionistas: €586 milhões
- Aumento de IRC este ano para as grandes empresas: apenas €193 milhões

PONTOS MAIS IMPORTANTES DESTE ESTUDO




Sócrates e Passos Coelho, sem avaliar as consequências para os portugueses e para a economia do País, decidiram que, em 2010, o défice teria de ser reduzido de 9,3% para 7,3% e, em 2011, para 4,6%. E isto quando no PEC apresentado há poucas semanas na Assembleia da República se tinham comprometido a baixar para 8,3% e 6,6% respectivamente. Passar dos 9,3% para 4,6%, representa uma redução de mais de €7.800 milhões. É evidente, que numa economia em profunda crise que não cria emprego (até está a destruir), como é a nossa, e com trabalhadores a auferirem os mais baixos salários da Zona Euro, uma contracção tão brutal do défice orçamental só poderá levar a uma maior estagnação económica (Portugal está a crescer em média menos de 1% ao ano desde 2000), e ao aumento da miséria. Mas estas coisas parecem não incomodar nem o PS nem o PSD para agradar os chamados "mercados financeiros" cujos principais especuladores são os maiores bancos, precisamente aqueles que levaram o mundo à crise actual.

Embora o governo não tenha divulgado dados precisos sobre quanto custarão aos portugueses e à economia do País as várias medidas que aprovou, e embora os defensores do pensamento neoliberal dominante e os patrões estejam de acordo com tais medidas, e cada órgão de informação tenha divulgado a sua estimativa diferente, o que tem levado à confusão sobre o seu custo, vamos procurar quantificar pelo menos as medidas com maior impacto social e económico.

A 1ª medida e mais importante, porque é aquela que reduzirá mais o já baixo poder de compra dos trabalhadores e reformados é a criação de um adicional de 1% sobre os rendimentos sujeitos a IRS até ao 3º escalão de IRS (inclui trabalhadores, pensionistas e todos os que estão sujeitos a IRS), e de 1,5% para os rendimentos superiores. Para se poder ficar com uma ideia do aumento de imposto que determinará interessa referir o seguinte. Segundo os últimos dados disponibilizados pela Direcção Geral de Impostos, a matéria colectável, ou seja, o rendimento sujeito a imposto é, em média, 6,9 superior ao IRS que se tem de pagar. Como o governo prevê arrecadar em 2010 cerca de 9.441 milhões € (este valor inclui o IRS para as Autarquias e admite-se que não incorpora nada resultante do combate à evasão e fraude fiscal, já que o PEC não inclui qualquer medida com esse objectivo, contrariamente ao de todos os países do Sul da Europa); repetindo com base naquele valor de IRS a receber, e também com base no coeficiente de 6,9 obtém um valor para a matéria colectável de 2010 que, aplicando-se a taxa média ponderada de 1,4% (é a que resulta dos adicionais 1% e 1,5% aprovados pelo governo), dá, para um ano, mais €912 milhões de IRS. Como o imposto não pode ser aplicado retroactivamente por imperativo constitucional, terão de ser deduzidos os rendimentos referentes aos cinco primeiros meses deste ano, o que determinará que o aumento do IRS este ano ronde os €586 milhões e em 2011 seja superior a €912 milhões. Qualquer português poderá calcular o aumento de IRS que terá. Basta que pegue na sua declaração de IRS, que veja qual é o valor que está na linha com a designação "Rendimento Colectável" e que depois multiplique esse valor por 0,01 no caso do seu rendimento colectável não ultrapassar o limite do 3º escalão, e 0,015 no caso contrário. Para se poder avaliar os verdadeiros efeitos deste aumento, interessa ainda referir que, de acordo com a DGCI, 87% dos rendimentos declarados para efeitos de IRS são do trabalho e pensões.



A 2ª medida , com efeitos para as pessoas e empresas, é o aumento do IVA em 1 ponto percentual, a aplicar também a medicamentos e produtos essenciais (pão, leite, batatas, arroz, etc) o que dá um aumento de imposto de €600 milhões/ano. Como se aplicará apenas a 7 meses de 2010, isso determina que este ano os portugueses sofrerão uma redução nos seus rendimentos em €350 milhões (e em 2011, €600M). Como a maioria dos consumidores portugueses são trabalhadores e reformados, serão também estes que pagarão a maior parte da factura.



A 3ª medida aprovada por Sócrates e Passos Coelho é um adicional de 2,5% a aplicar não aos lucros efectivos das grandes empresas, mas apenas aos lucros fiscais, portanto depois de deduzidos os benefícios fiscais, e mesmo assim só aquelas que tiverem lucros fiscais superiores a €2 milhões. Utilizando uma metodologia semelhante à usada para o IRS, e tomando como base os últimos dados divulgados pela DGCI conclui-se que, no máximo, se poderá obter um acréscimo de receita de €193 milhões de IRC. Este valor é irrisório, se se tiver presente que só nos primeiros três meses de 2010, os cinco maiores bancos portugueses tiveram €492 milhões de lucros líquidos, o que dá €5,5 milhões/dia (a previsão para o ano é de €2.000 milhões).

E como tudo isto já não fosse suficiente, Sócrates e Passos Coelho decidiram reduzir ainda mais o investimento público ( 4ª medida ), o que dificultará a criação de emprego, assim como a diminuição das indemnizações compensatórias às empresas públicas. Isto poderá determinar aumentos maiores nos preços dos transportes colectivos e eliminar antecipadamente as medidas anti-crise sociais e de apoio às empresas (inclui a diminuição do prazo de garantia de 450 dias para 365 dias para se poder ter acesso ao subsidio de desemprego constantes do DL 324/2009, a condição de recursos, e as medidas constantes da Iniciativa de Emprego – Resolução do CM 5/2010).

É evidente que, face a este quadro, não basta criticar, embora a critica – desde que objectiva e tecnicamente fundamentada – seja também necessária. Mas o mais importante é apresentar propostas tecnicamente críveis e claras para que os portugueses vejam que existe outra alternativa de politica económica, possível no quadro actual — que o PS e o PSD recusam apenas por interesses egoístas de classe. É precisamente com esse objectivo que se apresentam seguidamente algumas propostas. Elas são apenas contributos para essa politica económica alternativa, que agruparemos da seguinte forma: (1) Como aumentar as receitas fiscais; (2) Que despesas do Estado podem ser imediatamente reduzidas; (3) O que entendemos por bom investimento público tão necessário nesta altura.

As propostas para aumentar as receitas passam pela introdução nomeadamente das seguintes medidas:

(1) Criação de uma taxa extraordinária sobre os lucros da banca e das grandes empresas (um adicional extraordinário de 10% daria certamente uma receita superior a €500 milhões, deixando ainda uma parcela significativa dos lucros para serem investidos);

(2) Tributação de todas as mais valias obtidas na bolsa e não apenas de 25%, como resulta da proposta do governo. Segundo o governo, a tributação de 25% das mais valias dará um acréscimo de receita de €200 milhões. Portanto, se se tributasse todas as mais valias o aumento de receita seria certamente superior ao triplo. De Jan/Abril de 2010 as transacções bolsistas atingiram €44.813 milhões, mais do dobro de igual período de 2009;

(3) Um combate eficaz à evasão e fraude fiscal já que o descalabro verificado nas receitas fiscais resulta, em parte, do abandono desse combate — até porque o governo tem empurrado prematuramente para a aposentação os quadros mais qualificados da Administração Fiscal (aqui poder-se-ia obter certamente mais €1500 milhões de receita, o que adicionados aos €1.100 anteriores daria €2.600 milhões).

A nível de redução de despesas uma medida que devia e podia ser facilmente tomada, com efeitos importantes, seria reduzir significativamente a aquisição de serviços a empresas privadas e a contratação a empresas de trabalho temporário para menos de metade. A redução da despesa seria certamente superior a €700 milhões, já que o governo prevê gastar este ano com tais aquisições a privados cerca de €1.400 milhões (é a verba inscrita no OE2010). Isto exigiria uma nova atitude do governo em relação aos trabalhadores da Administração Pública que têm sido empurrados prematuramente para a aposentação.

Finalmente o governo e o PSD anunciaram novas reduções no investimento público. Reduzir as despesas de capital é uma das medidas aprovadas pelo governo e constante do comunicado do Conselho de Ministros. Reduzir o mau investimento público como são as auto-estradas nomeadamente no interior do País, com tráfego reduzido, e mesmo o TGV e mais uma ponte sobre o Tejo numa altura destas, é, na nossa opinião necessária. E não será pelo facto da direita defender a mesma posição que nos deve impedir de expressar a nossa opinião, já que tecnicamente nos parece correcto. Mas há que substitui-lo rapidamente por bom investimento público, como são a modernização e electrificação da chamada ferrovia convencional, cujo investimento o governo decidiu reduzir para menos de metade; a aquisição das novas locomotivas para a CP cujo contrato o governo decidiu cancelar; aumentar os mini-metros de Lisboa e Porto que não satisfazem as necessidades de transporte nestas duas áreas metropolitanas; apoiar a reabilitação do parque habitacional urbano que está profundamente degradado nas grandes cidades; e apoiar fundamental e efectivamente a agricultura e as empresas que produzem para o mercado interno, a fim de substituir as importações, e assim reduzir o défice externo e o crescente aumento do endividamento do País ao estrangeiro.
Dominados pela obsessão do défice, o governo e o PSD decidiram, por um lado, reduzir o já baixo poder de compra da maioria da população, o que agravará a situação de muitas empresas, que enfrentarão maiores dificuldades em vender, o que provocará mais falências e mais desemprego e, por outro lado, cortar no já pouco (bom) investimento e despesa pública o que só poderá contribuir para agravar e prolongar a crise social e económica que o País enfrenta, e determinará o aumento do endividamento externo, e isto quando a divida bruta do país ao estrangeiro já atinge €488 milhões (três vezes o valor do PIB). As medidas aprovadas pelo governo e pelo PSD inevitavelmente provocarão a contracção da economia. Isto determinará que o défice da Balança de Pagamento do País, que anualmente ronda os 10% do PIB (muito superior ao défice orçamental, o que não preocupa nem Sócrates, nem Passos Coelho, nem os defensores do pensamento neoliberal dominante em Portugal) continue a agravar o crescimento rápido da já elevada divida externa. As consequências são graves para o desenvolvimento do País.

o estudo completo:
http://resistir.info/e_rosa/medidas_defice_14mai10.html
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10dez2009
“O governo acabou de apresentar na Assembleia da República um 2º Orçamento de Estado















Rectificativo com um défice de 13.800 milhões de euros, ou seja, mais do triplo que o inicialmente previsto (inicial: 2,2%; agora: mais de 8,5%), com a justificação da redução significativa da receita fiscal que, segundo ele, se deve quase exclusivamente à crise. A direita (PSD e CDS) afirma que o aumento do défice se deve ao “descontrolo da despesa”. Portanto ambos (governo e direita) procuram ocultar as suas intenções e ocultar também uma das causas mais importantes da grave situação orçamental como se mostra neste estudo. Ao tentarem reduzir todo o debate à “crise versus descalabro de despesas”, o que procuram é impedir qualquer outra explicação para o descalabro registado. Eles recorrem assim ao chamado enquadramento manipulatório, que é uma forma, típica de manipulação cognitiva mencionada por Philippe Breton na sua obra “A palavra manipulada”
Se se analisar a execução do OE para 2009 até Outubro deste ano, conclui-se que até esse mês, relativamente a idêntico período de 2008, as despesas do Estado aumentaram 5,8%. E a subida deve-se fundamentalmente ao aumento das despesas de capital (investimentos) que cresceram 32,3%, que são importantes para criar postos de trabalho e reduzir o aumento do desemprego; ao aumento das transferências para a Segurança Social, CGA, SNS, etc., que cresceram 21,4%, fundamentais no combate à pobreza (pensões sociais, RSI, acção social), no pagamento das pensões de aposentação e na prestação de cuidados de saúde à população As despesas com pessoal, cujos trabalhadores são tão atacadas, diminuíram nos dez primeiros meses em -18,2% (menos cerca de 2.000 milhões de euros do que em 2008). Portanto, o que a direita pretende ao falar no “descalabro das despesas” é reduzir as despesas do Estado que são fundamentais no combate à crise embora não tenha coragem para o declarar abertamente. Para isso ela oculta as suas intenções por trás de “palavras virtude” (combate ao descalabro das despesas) de aceitação fácil, imediata e generalizada. E isto porque é de prever que não esteja contra o gasto, só na Administração Central, de 677,7 milhões de euros nos primeiros 10 meses de 2009 na aquisição de serviços que beneficia fundamentalmente os grandes escritórios de advogados.
O governo, por sua vez, vem dizer que a quebra significativa das receitas fiscais (menos -4.740,8 milhões de euros do que foi cobrado em 2008) – o que provocou que o défice triplicasse (défice global inicial previsto: 3.851 milhões de euros; défice actual só orçamental: 13.800 milhões de euros) – se deve quase exclusivamente à crise, em que ele não teria responsabilidade.
No entanto, se se analisar a receita do IVA, que é aquela que cai mais (menos 2.541 milhões de euros, ou seja, menos 18,9%), conclui-se que a quebra da receita do IVA devida à redução do consumo interno se estima em 510 milhões de euros; a quebra de receita do IVA devido à redução da taxa de IVA de 21% para 20% (em 2008, a taxa de 20% só vigorou nos últimos quatro meses do ano) deverá rondar os 390 milhões de euros; e a quebra da receita do IVA devido à redução da receita do ISV, à baixa do preço do petróleo e das importações e a outros factores será certamente inferior a 400 milhões de euros. Somando todos valores obtém-se 1.300 milhões de euros. Como o governo prevê no Orçamento rectificativo que apresentou uma redução da receita fiscal só no IVA de 2.541 milhões de euros, ficam por explicar 1.241 milhões de euros, cuja redução só poderá ter como causa o aumento da evasão e da fraude fiscal. E certamente esta evasão e fraude também se verifica em outros impostos, embora possam ser de menor dimensão. E esta perda de receita é já da inteira responsabilidade do governo pois resulta do discurso permissivo governamental e do abandono, por parte da Administração Fiscal, a partir de 2008, do combate eficaz à evasão e fraude fiscal (os incumpridores até têm sido beneficiados através do alargamento dos prazos de pagamento dos impostos em falta anunciados pelo governo em Dez. 2009). Tudo isto poderá determinar a curto prazo o aumento dos impostos para reduzir o défice.
Como se tudo isto já não fosse suficiente existe uma passagem na página 5 do Relatório que acompanha o Orçamento Rectificativo em que o governo procura descaradamente iludir a opinião publica e a própria Assembleia da República. É aquela em que diz que aplicar a parte que não foi utilizada dos 20.000 milhões de euros que tencionava emprestar à banca ou utilizar para avalizar empréstimos obtidos por ela, para financiar o défice orçamental é a mesma coisa. Ora isso é totalmente falso. Só no caso de a banca não pagar esses empréstimos é que o Estado, como avalista, teria de os pagar, e só no caso de o banco não poder depois reembolsar o Estado desse dinheiro é que isso aumentaria a divida pública. No financiamento do défice orçamental como o governo pretende agora utilizar uma parte dos 15.000 milhões que ainda restam do montante aprovado pela Assembleia da República, ela será utilizada imediatamente no pagamento de despesas do Estado dando origem ao aumento imediato do défice e da Dívida Pública que terá de ser paga certamente pelos contribuintes. Uma situação diferente que o governo pretende ocultar.
Eugénio Rosa”
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como é que o PCP se vai abster???
respiguei do Público de 10.12.2009:
Pelo PCP, o líder parlamentar, Bernardino Soares, garantiu que a abstenção comunista não é uma cedência a “qualquer chantagem ou intimidação” da parte do Governo ou do PS. Trata-se de viabilizar uma alteração ao orçamento que é “um conjunto de aumentos sem alterações de fundo”.