Via Gazeta das Caldas. Artigo de há 1 ano
Aprender na escola da mãe e da avó na Ribafria Publicado a 17 de Setembro de 2010 . Avó, mãe e neta. Três gerações ligadas à Escola da Ribafria, onde a pequena Constança vai aprender o ‘bê-à-bá’
Na manhã do passado dia 13 de Setembro, Patrícia Azinhaga voltou à escola onde há 25 anos fez amigos, esfolou os joelhos e passou os primeiros anos de um percurso académico que a tornou professora. Pela mão levava a filha, Constança, uma menina de cinco anos, que iniciava nesse dia a sua vida escolar. Ao lado a avó da menina, Maria Glória, que foi professora naquela escola durante mais de duas décadas.
A escola da Ribafria, com cerca de 80 alunos, é a única da freguesia da Benedita que não fechará para o ano, quando o grande Centro Escolar que está a ser construído no centro da vila abrir as suas portas. E Patrícia Azinhaga agradece poder ter a sua filha numa escola que lhe é tão familiar, mesmo ciente dos males de que o estabelecimento padece e das obras de que necessita.
Constança sabe que aquela é a escola onde a avó ensinou muitos meninos a ler e a escrever, há muito tempo, antes dela nascer, e onde andaram os tios e a mãe. Embora tímida, a menina não está nervosa. A professora é nova, a sala é nova, mas conhece bem os colegas que a acompanham nesta nova etapa – quase todos andavam com ela no Jardim-de-Infância que fica logo ali ao lado. Além disso, esta é também a escola onde anda a prima, Maria Inês.
Na mochila, vermelha e com um grande Rato Mickey e uma Minnie – bonecos que já há 30 anos faziam as delícias da mãe – traz os lápis, as canetas, os cadernos que há tanto tempo desejava ter. E apesar deste ser o primeiro dia de aulas, Constança está deserta para começar a fazer os trabalhos de casa, que foi exigindo à mãe e á avó durante as férias de Verão. O primeiro dia foi de muita brincadeira, “mas também trabalhei”, conta. A partir de agora, será a campainha a marcar o ritmo dos seus dias, o mesmo som estridente que na segunda-feira acabou com “um bocadinho de nada de intervalo”.
Já dentro da sala de aula, e acompanhada da mãe, Constança ouviu as regras da sua nova professora. “Não podemos fazer queixinhas, não podemos bater nos outros meninos e para falar temos que pôr o dedo no ar”, conta no final do dia. “Gosto muito da minha escola nova e da sala e tenho muita vontade de trabalhar”, garante.
Uma escola que deixa a mãe tranquila
Patrícia Azinhaga não era uma mãe nervosa no primeiro dia de escola da filha. “O facto de ser a mesma escola onde eu andei deixa-me um bocadinho mais tranquila”, diz. É que “a melhor escola é aquela que foi a nossa” afiança. Mesmo assim, lá admite: “deixamos um filho na escola, e é um bocadinho do nosso coração que fica lá, mas faz parte da vida”. E daqui a alguns anos, espera voltar à Ribafria com o mesmo sentimento, para o primeiro dia de escola da filha mais nova, a Emília que tem 13 meses.
Quando lhe perguntamos se não gostaria mais que a sua filha fizesse o primeiro ciclo num moderno Centro Escolar, Patrícia diz que os novos estabelecimentos têm muitas vantagens, mas que as poucas desvantagens pesam mais. Por um lado, dispõe das mais modernas tecnologias, de mobiliário novo, instalações eléctricas sem problemas. Por outro, “são muitas crianças num espaço muito grande”.
Já na ‘sua’ escola, “todos se conhecem, há um ambiente mais calmo, mais familiar, onde as professoras conhecem os alunos todos, mesmo os das colegas. Acho que este ambiente pode ser melhor para a formação das crianças”, explica.
Mas há coisas que precisam de mudar. A escola da Ribafria beneficiou recentemente de algumas melhorias, nomeadamente nas casas-de-banho. Mas falta a intervenção na rede eléctrica e há mais de um ano que o estabelecimento está sem cortinas. No ano passado as professoras remediaram-se com plásticos pretos nas janelas. A autarquia promete agora que as novas cortinas serão colocadas na próxima semana. “É inadmissível começar mais um ano lectivo sem que isto esteja resolvido”, aponta a mãe, professora do 3º ciclo e Ensino Secundário.
“É preciso restabelecer a ligação entre escola e comunidade”
A necessidade de obras é também apontada pela avó da Constança, Maria da Glória, que conhece a escola da Ribafria como a palma da sua mão. Há mais de três décadas, a professora, agora aposentada, estreou as salas onde agora se sentam as duas netas mais velhas.
Já no ano passado, a avó marcou presença no primeiro dia de aulas da Maria Inês, a neta mais velha. “Apercebi-me de muita frustração na cara dos professores”, diz. Agora voltou a presenciar a entrada da Constança na vida escolar e é ela que vai ajudar as duas meninas com os trabalhos de casa. “Estou reformada há oito anos, mas hei-de ser professora toda a vida”, garante.
Maria da Glória nunca se desligou por completo daquela escola, onde leccionou durante mais de vinte anos. Pela sua sala chegaram mesmo a passar filhos de antigos alunos. A saudade dos tempos da bata branca e do quadro de giz esteve sempre presente e agora diz reviver “uma série de coisas que me deixam a pensar se o ensino hoje caminha para melhor, se terá mais sucesso, se professores e alunos são mais felizes”.
Na sua altura, o primeiro dia de aulas era uma autêntica festa. As professoras, colegas durante anos e anos, passavam semanas a preparem actividades para receberem alunos e pais, e faziam-no “com gosto, sem precisar da motivação de pessoas de fora”. Hoje, “os professores têm muito pouca autonomia, perde-se muito tempo com papéis”, e isso vê-se logo no primeiro dia, quando os meninos são logo metidos na sala de aula.
“Fazíamos da escola a nossa casa. Os nossos filhos passavam horas naquele espaço, enquanto nós preparávamos as actividades, e ninguém se importava”, lembra. E salienta a grande ligação que há uns anos havia entre a escola e a comunidade. “Muitas das coisas que se compraram para aquela escola foi com o apoio dos pais”. Uma ligação que, diz, urge restaurar. “A escola da Ribafria não vai fazer parte do Centro Escolar e estou convencida que, se esta ligação não for restabelecida, existirão ali muitas carências”, acredita. Não há um espaço para a actividade desportiva das crianças, falta equipamento. “É preciso que os pais se mexam”, alerta.
Joana Fialho
jfialho@gazetacaldas.com