31/03/2014

7.741.(31mar2014.8.18') David Mourão-Ferreira

Nasceu a 24fev1927
e morreu a 16jun1996
***
https://www.facebook.com/photo.php?fbid=1981178365243210&set=a.104287922932273.9419.100000531976043&type=3&theater
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24feVER2018
via Graça Silva
  in "Infinito Pessoal"
"Desvio dos teus ombros o lençol,
que é feito de ternura amarrotada,
da frescura que vem depois do sol,
quando depois do sol não vem mais nada...


Olho a roupa no chão: que tempestade!
Há restos de ternura pelo meio,
como vultos perdidos na cidade
onde uma tempestade sobreveio...

Começas a vestir-te, lentamente,
e é ternura também que vou vestindo,
para enfrentar lá fora aquela gente

que da nossa ternura anda sorrindo...
Mas ninguém sonha a pressa com que nós
a despimos assim que estamos sós!"

 https://www.facebook.com/photo.php?fbid=1709398362436966&set=a.211013438942140.52240.100001004569506&type=3&theater
***
24seTEMBRO2012

2 pitadinhas de David Mourão - Ferreira
Orquestra, flor e corpo

Orquestra, flor e corpo:
doravante direi
como do corpo a música se extrai,
como sem corpo a flor não tem perfume,
como de corpo a corpo o som se repercute.

Orquestra, sim: orquestra. E flor. E noite.
Doravante dizendo orquídea negra
é logo o violoncelo nomeado;
e logo, logo, os instrumentos de arco
arremessando vão a flecha ao alvo;
e é logo o alvo peito;
e é logo amor,
e é logo a noite
murmurando "Até logo!" à outra noite...

De corpo a corpo a noite se transmite.
Orquestra, sim: orquestra. E flor. E vaga.
E a noite é sempre o corpo anoitecido,
e o corpo é sempre a noite que se aguarda.

De corpo a corpo o som se repercute,
de vale em vale,
de monte a monte,
de címbalo, de cítara, et coetera,
ao tímpano sensível que o recebe.

Sem concha do ouvido,
o mar não tem rumor.
Sem asa do nariz,
não voa a maresia.
E o mundo só é mundo enquanto houver o corpo,
de música e de flor universal medida.

(David Mourão- Ferreira)

Presídio


Nem todo o corpo é carne... Não, nem todo
Que dizer do pescoço, às vezes mármore,
às vezes linho, lago, tronco de árvore,
nuvem, ou ave, ao tacto sempre pouco...?

E o ventre, inconsistente como o lodo?...
E o morno gradeamento dos teus braços?
Não, meu amor... Nem todo o corpo é carne:
é também água, terra, vento, fogo...

É sobretudo sombra à despedida;
onda de pedra em cada reencontro;
no parque da memória o fugidio

vulto da Primavera em pleno Outono...
Nem só de carne é feito este presídio,
pois no teu corpo existe o mundo todo!

David Mourão-Ferreira, in “Obra Poética”, in O Citador
***
"Nós temos cinco sentidos: 
são dois pares e meio de asas. 

- Como quereis o equilíbrio?"
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***
https://www.facebook.com/photo.php?fbid=132990743541685&set=a.132986236875469.26081.100004922801250&type=3&theater
***
https://www.facebook.com/112890882080018/photos/a.114014221967684.7650.112890882080018/867705216598577/?type=1&theater

DAVID MOURÃO-FERREIRA, in INFINITO PESSOAL (Guimarães Ed., 1962), in OBRA POÉTICA (Presença, 2006)

CASA

Tentei fugir da mancha mais escura
que existe no teu corpo, e desisti.
Era pior que a morte o que antevi:
era a dor de ficar sem sepultura.

Bebi entre os teus flancos a loucura
de não poder viver longe de ti:
és a sombra da casa onde nasci,
és a noite que à noite me procura.

Só por dentro de ti há corredores
e em quartos interiores o cheiro a fruta
que veste de frescura a solidão...

Só por dentro de ti rebentam flores.
Só por dentro de ti a noite escuta
o que sem voz me sai do coração.


Knees, photograph | gelatin silver print: by Edward Weston

*(LT)
***
https://www.facebook.com/112890882080018/photos/a.114014221967684.7650.112890882080018/805448349490931/?type=1&theater
 in NO VEIO DO CRISTAL (1988), in OBRA POÉTICA 1948-1988 (Presença, 4ª ed., 2001)
SEGREDO
Nem o Tempo tem tempo
para sondar as trevas
deste rio correndo
entre a pele e a pele
Nem o Tempo tem tempo
nem as trevas dão tréguas
Não descubro o segredo
que o teu corpo segrega
***
Documentário da RTP2
"Duvidávida", um documentário sobre a vida e obra de David Mourão-Ferreira, emitido na RTP2.
Poeta, ficcionista, ensaísta, professor, divulgador, tradutor e dramaturgo. Este documentário dá a conhecer passagens da sua vida, episódios caricatos, outros dramáticos, testemunhos de quem o conheceu de muito perto e testemunhos de quem, com a distância necessária, consegue avaliar a dimensão da sua obra... múltiplos retratos de um homem que, acima de tudo, amava a vida. Como ele próprio escreveu "Que dúvida Que dívida Que dádiva/ Que duvidávida afinal a vida".
Com testemunhos de Vasco Graça Moura, João Lobo Antunes, Urbano Tavares Rodrigues, Eugénio Lisboa, Maria Barroso, entre outros.
 https://www.youtube.com/watch?v=747cpYBTZCg&feature=youtu.be
***
 Via Eulália Valentim:
"A BIOGRAFIA NÃO EXPLICA A OBRA, MAS ESCLARECE-A, ILUMINA-A"
Poeta, ficcionista, tradutor, dramaturgo, ensaísta, cronista, crítico literário, conferencista, professor. NASCEU em FEVEREIRO DE 1927. Faleceu em Junho de 1996.
BIOGRAFIA
Licenciado em Filologia Românica pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa em 1951, onde mais tarde em 1957 foi professor, tendo-se destacado como um dos grandes poetas contemporâneos do Século XX.

Mourão-Ferreira trabalhou para vários jornais, dos quais se destacam a Seara Nova e o Diário Popular, para além de ter sido um dos fundadores da revista Távola Redonda.
Entre 1963 e 1973 foi secretário-geral da Sociedade Portuguesa de Autores.
No pós-25 de Abril, foi director do jornal A Capital e director-adjunto do O Dia.

No governo, desempenhou o cargo de Secretário de Estado da Cultura (de 1976 a Janeiro de 1978, e em 1979).
Foi por ele assinado, em 1977, o despacho que criou a Companhia Nacional de Bailado.

Foi autor de alguns programas de televisão de que se destacam "Imagens da Poesia Europeia", para a RTP.
Na sua obra, são famosos alguns dos poemas que compôs para a voz de Amália Rodrigues, como: Sombra, Maria Lisboa, Nome de Rua, Fado Peniche e sobretudo Barco Negro, entre outros

Em 2005 é celebrado um protocolo entre a Universidade de Bari e o Instituto Camões, decidindo, como homenagem ao poeta, abrir naquela cidade o Centro Studi Lusofoni - Cátedra David Mourão-Ferreira que, dirigida pela Professora Fernanda Toriello e com a colaboração do professor Rui Costa, tem como objectivo o estudo da obra de David Mourão-Ferreira, assim como a divulgação da língua portuguesa e das culturas lusófonas. Promove também o Prémio Europa David Mourão FERREIRA
CASAMENTOS
. Em 1953 casou com Maria Eulália Barbosa Valentim de Carvalho. Teve dois filhos: David João e Adelaide Constança, que lhe deram 11 netos e netas..Em 1966 acontece o segundo casamento com Maria do Pilar de Jesus Barata.

PRÉMIOS E CONDECORAÇÕES
.1954 Prémio de poesia Delfim Guimarães ao seu livro “Tempestade de Verão”
.1960 Academia das Ciências de Lisboa atribui a David Mourão-Ferreira o Prémio Ricardo Malheiros pela publicação “Gaivotas em Terra”
.1965 Prémio de Teatro da Casa da Imprensa, pela peça de teatro “O Irmão”
.1972 Prémio Nacional de Poesia da Secretaria de Estado da Informação e Turismo atribuído ao livro de poesia “Cancioneiro de Natal”
.1973 Grau de Chevalier de L´Ordre des Arts et des Lettres (França)
.1976 Grã-Cruz da Ordem de Rio Branco (Brasil)
.1980 Prémio da Crítica da Association Internationale des Critiques Littéraire pelo livro “As Quatro Estações” (2ª edição)
.1986 Prémio de Narrativa do Pen Clube Português; Prémio D. Dinis da Fundação da Casa de Mateus e o Prémio de Ficção Município de Lisboa, pelo romance “Um Amor Feliz”
.1988 Grande Prémio Inasset de Poesia atribuído a “No Veio de Cristal”
.Prémio Jacinto Prado Coelho atribuído a “Nos Passos de Pessoa”
.1987 Grande Prémio de Romance da Associação Portuguesa de Escritores.
No Brasil recebe a Medalha Oskar Nobiling atribuída pela Academia Brasileira de Letras
.1996 David Mourão-Ferreira é homenageado por todo o país.
Recebe a Grã-Cruz de Santiago de Espada.
Condecorado pela Câmara Municipal de Cascais com o título de Cidadão Honorário.
Medalha de Ouro da Câmara Municipal de Oeiras.

WIKIPÉDIA
 https://www.facebook.com/photo.php?fbid=1988010607892977&set=a.282097105151011.82379.100000521703651&type=3&theater
***

E POR VEZES, David Mourão-Ferreira - Teresa Coutinho

https://www.youtube.com/watch?v=xb60diwkPQU
E por vezes as noites duram meses
E por vezes os meses oceanos
E por vezes os braços que apertamos
nunca mais são os mesmos. E por vezes

encontramos de nós em poucos meses
o que a noite nos fez em muitos anos
E por vezes fingimos que lembramos
E por vezes lembramos que por vezes

ao tomarmos o gosto aos oceanos
só o sarro das noites não dos meses
lá no fundo dos copos encontramos

E por vezes sorrimos ou choramos
E por vezes por vezes ah por vezes
num segundo se evolam tantos anos.

***
primavera Amália Rodrigues
**
contraste entre cenas felizes e violência 

*** 
Desejei-te pinheiro à beira-mar
para fixar o teu perfil exacto.

Desejei-te encerrada num retrato
para poder.te contemplar

Desejei que tu fosses sombra e folhas
no limite sereno dessa praia

E desejei: " Que nada me distraia
dos horizontes que tu olhas!"

Mas frágil e humano grão de areia
não me detive à tua sombra esguia.

(Insatisfeito, num corpo rodopia
na solidão que te rodeia.)
in "A Secreta Viagem"
Via Susana Duarte
***
A Maravilha que Deve Ser Escrever um Livro
(...) a maravilha que deve ser escrever um livro: a invenção dentro da memória; a memória dentro da invenção; e toda essa cavalgada de uma grande fuga, todo esse prodígio de umas poligâmicas núpcias, secretas e arrebatadas, com a feminina multidão das palavras: as que se entregam, as que se esquivam; as que é preciso perseguir, seduzir, ludibriar; as que por fim se deixam capturar, palpar, despir, penetrar e sorver, assim proporcionado, antes de se evaporarem, as horas supremas de um amor feliz. Não há matéria mais carnalmente incorpórea; nem outra mais disposta a por amor ser fecundada.
Como se pode interpretar de outro modo esse velho lugar-comum de ter um filho, plantar uma árvore, escrever um livro? Só se em todos os casos se tratar de grandes e inevitáveis actos de amor: com a Mulher, com a Terra, com a Língua. Mas de plantar árvores e ter filhos haverá sempre muita gente que se encarregue. De destruir árvores também; de estragar filhos igualmente. Em compensação, um livro, um livro que viva, multiplicado, durante alguns anos ou alguns séculos, e que depois vá morrendo, sem ninguém dar por isso, mas nunca de uma só vez, até ser enterrado na maior discrição ou até se ver de súbito renascido, inesperadamente ressuscitado, um livro com semelhante destino - luminoso por mais obscuro, obscuro por mais luminoso -, isto é que foi sempre o que me empolgou.
 in 'Um Amor Feliz'
***
Via Susana Duarte
http://terradencanto.blogspot.pt/2014/12/o-teu-corpo.html
O teu corpo O meu corpo E em vez dos corpos 
que somados seriam nossos corpos 
implantam-se no espaço novos corpos 
ora mais ora menos que dois corpos 

Que escorpião de súbito estes corpos 
quando um espelho reflecte os nossos corpos 
e num só corpo feitos os dois corpos 
ao mesmo tempo somos quatro corpos 

Não indagues agora se o meu corpo 
se contenta só corpo no teu corpo 
ou se busca atingir todos os corpos 

que no fundo residem num só corpo 
Mas indaga sem pausa além do corpo 
o finito infinito destes corpos 

 in “Obra Poética”
***
E POR VEZES
E por vezes as noites duram meses
E por vezes os meses oceanos
E por vezes os braços que apertamos
nunca mais são os mesmos E por vezes
encontramos de nós em poucos meses
o que a noite nos fez em muitos anos
E por vezes fingimos que lembramos
E por vezes lembramos que por vezes
ao tomarmos o gosto aos oceanos
só o sarro das noites não dos meses
lá no fundo dos copos encontramos
E por vezes sorrimos ou choramos
E por vezes por vezes ah por vezes
num segundo se evolam tantos anos
https://www.youtube.com/watch?v=qIMsbBscvoQ

dito por Mafalda Jara

***
https://www.facebook.com/349094905211303/photos/a.349115855209208.1073741828.349094905211303/635484599905664/?type=1&theater
Praia do Esquecimento 

Fujo da sombra; cerro os olhos: não há nada. 
A minha vida nem consente 
rumor de gente 
na praia desolada.

Apenas decisão de esquecimento:
mas só neste momento eu a descubro
como a um fruto rubro
de que, sem já sabê-lo, me sustento.

E do Sol amarelo que há no céu
somente sei que me queimou a pele.
Juro: nem dei por ele
quando nasceu.

em "Tempestade de Verão"
***
https://www.facebook.com/photo.php?fbid=783662918313458&set=a.462529847093435.111436.462489187097501&type=1&theater
Mais do que um sonho: comoção!
Sinto-me tonto, enternecido,
quando, de noite, as minhas mãos
são o teu único vestido.

E recompões com essa veste,
que eu, sem saber, tinha tecido,
todo o pudor que desfizeste
como uma teia sem sentido;
todo o pudor que desfizeste
a meu pedido.

Mas nesse manto que desfias,
e que depois voltas a pôr,
eu reconheço os melhores dias
do nosso amor.

 “Penélope”

***
Amália Rodrigues canta David Mourão-Ferreira
 FADO DE PENICHE ou abandono
Por teu livre pensamento
Foram-te longe encerrar
Tão longe que o meu lamento
Não te consegue alcançar
E apenas ouves o vento

E apenas ouves o mar
Levaram-te a meio da noite
A treva tudo cobria

Foi de noite numa noite
De todas a mais sombria
Foi de noite, foi de noite
E nunca mais se fez dia.

Ai! Dessa noite o veneno
Persiste em me envenenar
Oiço apenas o silêncio

Que ficou em teu lugar
E ao menos ouves o vento
E ao menos ouves o mar.

***
Luís Cília canta David mourão-ferreira:
https://www.youtube.com/watch?v=QueYKJ5So6U
TernuraDesvio dos teus ombros o lençol, que é feito de ternura amarrotada, 
da frescura que vem depois do sol, 
quando depois do sol não vem mais nada... 

Olho a roupa no chão: que tempestade! 
Há restos de ternura pelo meio, 
como vultos perdidos na cidade 
onde uma tempestade sobreveio... 

Começas a vestir-te, lentamente, 
e é ternura também que vou vestindo, 
para enfrentar lá fora aquela gente 
que da nossa ternura anda sorrindo... 

Mas ninguém sonha a pressa com que nós 
a despimos assim que estamos sós! 

 in "Infinito Pessoal"




























***

RUA DE ROMA

Quero uma rua de Roma 
com seus rubros com seus ocres
com essa igreja barroca
essa fonte esse quiosque
aquele pátio na sombra
(…)
Em troca darei Lisboa
Londres Rio Nova Iorque
toda a prata todo o ouro
que não tenho em nenhum cofre
só no cotão do meu bolso
e no que a pátria me explora

Quero essa rua de Roma
Aqui onde estou sufoco
Aqui as manhãs irrompem
de noites que nunca morrem
(…)
Quero essa rua de Roma
Terá de ser sem demora
Sabemos lá quando rondam
abutres à nossa roda
(…)
Em troca darei o troco
do que por nada se troca
o florescer de uma bomba
o deflagrar de uma rosa

Quero essa rua de Roma
Amanhã Ontem Agora
Que importa saber-lhe o nome
se a trago dentro dos olhos

Há uma igual em Verona
Outra ainda mais a norte
(…)
Outra que apenas se encontra
onde a paixão a descobre
Mas rua sempre de Roma
(…)
Romana mesmo que em Roma
não haja quem a recorde
Onde quer que o sexo a sonhe
e o coração a coloque
é lá que todo sou todo
Aqui não
Aqui não posso

in 'Os Ramos Os Remos'
***

https://www.facebook.com/photo.php?fbid=605093189545641&set=a.107207769334188.12956.100001348957610&type=1&theater

Voo

Entre os olhos beijar-te
Fazer de tuas pálpebras

asas da minha boca

in Obra Poética, Presença, p.282
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https://www.facebook.com/349094905211303/photos/a.349115855209208.1073741828.349094905211303/569198956534229/?type=1&theater
Escolha 

Entre vento e navalha escolho o vento
Entre verde e vermelho aquele azul
que até na morte servirá de espelho
ao vento que por dentro me deslumbra.
Entre ventre e cipreste escolho o Sol
Entre as mãos que se dão a que se oculta
Entre o que nunca soube o que já sobra
Entre a relva um milímetro de bruma.

***

24 de Fevereiro de 1927: Nasce David Mourão-Ferreira, escritor e pedagogo, autor de "Entre a Sombra e o Corpo" e de "Um Amor Feliz".

Escritor português, nasceu em Lisboa, em 1927 e morreu, também nesta cidade, em 1996. Licenciou-se em Filologia Românica em Lisboa, onde chegou a ser professor catedrático, organizando e regendo, entre outras, a cadeira de Teoria da Literatura. Foi secretário de Estado da Cultura, entre 1976 e 1979; diretor do diário A Capital; diretor do Boletim Cultural do Serviço de Bibliotecas Itinerantes e Fixas da Fundação Calouste Gulbenkian, entre 1984 e 1996; diretor da revista Colóquio/Letras; presidente da Associação Portuguesa de Escritores (1984-86) e vice-Presidente da Association Internationale des Critiques Littéraires. A sua obra reparte-se pela poesia; pela crítica literária, como Os Ócios do OfícioVinte Poetas ContemporâneosHospital das Letras ou Lâmpadas no Escuro (de Herculano a Torga); pelo ensaio; pela tradução; pelo teatro; pelo romance; e também pelo jornalismo. Embora os seus primeiros poemas datem de meados dos anos 40, a sua atividade poética começou a ganhar relevo quando foi codiretor, a par com António Manuel Couto Viana e Luís de Macedo, da revista Távola Redonda (1950-1954), que, sem apresentar programa ou manifesto, se orientava para uma alternativa poética à poesia social, baseada na "revalorização do lirismo", exigindo ao poeta "autenticidade e um mínimo de consciência técnica, a criação em liberdade e, também, a diligência e capacidade de admirar, criticamente, os grandes poetas portugueses de gerações anteriores a 1950. Sem reservas ideológicas ou preconceitos de ordem estética" (VIANA, António Manuel Couto - "Breve Historial" in As Folhas Poesia Távola Redonda, Boletim Cultural da F. C. G., VI série, n.º 11, outubro de 1988), atributos a que acresciam como exigências a reação contra a "imediatez da inspiração e contra o impuro aproveitamento da poesia para fins sociais", através do equilíbrio "entre os motivos e a técnica, entre os temas e as formas" (cf. MOURÃO-FERREIRA, David - "Notícia sobre a Távola Redonda" in Estrada Larga 3, p. 392). Foi no primeiro volume da Coleção de Poesia das Edições "Távola Redonda" que publicou a sua primeira obra poética, A Secreta Viagem, onde se encontram reunidos alguns dos traços que distinguiriam a sua poética posterior, nomeadamente a preferência pela temática amorosa, o rigor formal, a continuidade e renovação da lírica tradicional como, por exemplo, a de inspiração camoniana, ou a abertura a experiências poéticas estrangeiras. No poema "Dos Anos Quarenta", relembra leituras nessa etapa de iniciação poética: Proust, Thomas Mann, Rilke, Apollinaire, a "constelação pessoana", Álvaro de Campos, "E Régio Miguéis Nemésio", bem como as circunstâncias que rodearam essa descoberta, como o "despertar do deus Eros", a guerra, a queda dos fascismos e a perseverança da ditadura salazarista.
Da sua obra poética, cuja poesia se distingue pelo lirismo culto, depurado e subtil, destacam-se os seguintes livros: A Secreta ViagemDo Tempo ao CoraçãoCancioneiro do NatalMatura Idade e Ode à Música.
A obra de David Mourão-Ferreira foi várias vezes reconhecida com prémios literários, como, por exemplo: Prémio de Poesia Delfim Guimarães, 1954, paraTempestade de verão; Prémio Ricardo Malheiros, 1960, para Gaivotas em Terra; Prémio Nacional de Poesia, 1971, para Cancioneiro de Natal; Prémio da Crítica da Associação Internacional dos Críticos Literários para As Quatro Estações; e, para Um Amor Feliz , os prémios de Narrativa do Pen Clube Português, D. Dinis, de Ficção do Município de Lisboa e o Grande Prémio de Romance e Novela da Associação Portuguesa de Escritores. Ao autor foi ainda atribuído, em 1996, o Prémio de Consagração de Carreira da Sociedade Portuguesa de Autores.
Fontes: Infopédia
Jornal I (imagem)

Resultado de imagem para david mourão ferreira
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Paraíso 

Deixa ficar comigo a madrugada,
para que a luz do Sol me não constranja.
Numa taça de sombra estilhaçada,
deita sumo de lua e de laranja.

Arranja uma pianola, um disco, um posto,
onde eu ouça o estertor de uma gaivota...
Crepite, em derredor, o mar de Agosto...
E o outro cheiro, o teu, à minha volta!

Depois, podes partir. Só te aconselho
que acendas, para tudo ser perfeito,
à cabeceira a luz do teu joelho,
entre os lençóis o lume do teu peito...

Podes partir. De nada mais preciso
para a minha ilusão do Paraíso.

***


Presídio

Nem todo o corpo é carne... Não, nem todo.
Que dizer do pescoço, às vezes mármore,
às vezes linho, lago, tronco de árvore,
nuvem, ou ave, ao tacto sempre pouco...?

E o ventre, inconsistente como o lodo? ...
E o morno gradeamento dos teus braços?
Não, meu amor... Nem todo o corpo é carne:
é também água, terra, vento, fogo...

É sobretudo sombra à despedida;
onda de pedra em cada reencontro;
no parque da memória o fugidio

vulto da Primavera em pleno Outono...
Nem só de carne é feito este presídio,
pois no teu corpo existe o mundo todo!
.
Imagem da web
 — com Margarida Canto.
***
http://www.youtube.com/watch?v=l2ToF1xfKL4&authuser=0
***
http://www.youtube.com/watch?v=QueYKJ5So6U&authuser=0
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http://www.youtube.com/watch?v=e1o1CI3Tqnk&authuser=0
***
Via:
http://observador.pt/especiais/os-melhores-poemas-de-amor-da-lingua-portuguesa-para-nove-escritores/
Eram, na rua, passos de mulher.
Era o meu coração que os soletrava.
Era, na jarra, além do malmequer,
espectral o espinho de uma rosa brava…
Era, no copo, além do gim, o gelo;
além do gelo, a roda de limão…
Era a mão de ninguém no meu cabelo.
Era a noite mais quente deste verão.
Era no gira-discos, o Martírio
de São Sebastião, de Debussy….
Era, na jarra, de repente, um lirio!
Era a certeza de ficar sem ti.
Era o ladrar dos cães na vizinhança.
Era, na sombra, um choro de criança…
 in Infinito Pessoal