e morreu a 13junho2005
***
4dez2011...postei:
A boca,
onde o fogo
de um verão
muito antigo
cintila,
a boca espera
(que pode uma boca
esperar
senão outra boca?)
espera o ardor
do vento
para ser ave,
e cantar.
***
Eles voltaram, com o rumor da chuva aquecem as mãos.
Aos lábios de pouca idade volta o sorriso extraviado.
A verdade é que nunca soube o nome dessa flor
que nalguns olhos abre logo de madrugada.
Agora para saber é tarde.
O que sei é que mesmo no sono
há um rumor que não dorme,
um jeito da luz pousar, um rasto de lágrima acesa
É sobre o meu corpo que chove
https://www.facebook.com/FabricaEscrita/photos/a.462529847093435.111436.462489187097501/981373871875694/?type=3&theater
***
https://www.facebook.com/poesiapinturamusica/photos/a.680630855305186.1073741844.672663006101971/1401074823260782/?type=3&theater
***
https://www.facebook.com/photo.php?fbid=319552731460416&set=a.531054650310222.1073741825.100002170750922&type=3&theater
Os Amigos
Os amigos amei
despido de ternura
fatigada;
uns iam, outros vinham,
a nenhum perguntava
porque partia,
porque ficava;
era pouco o que tinha,
pouco o que dava,
mas também só queria
partilhar
a sede de alegria —
por mais amarga.
in Coração do Dia
***
ver 2.743
***
https://www.facebook.com/559343457434706/photos/a.559507790751606.1073741828.559343457434706/956725934363121/?type=3&theater
É urgente o amor
É urgente um barco no mar
É urgente destruir certas palavras,
ódio, solidão e crueldade,
alguns lamentos, muitas espadas.
É urgente inventar alegria,
multiplicar os beijos, as searas,
é urgente descobrir rosas e rios
e manhãs claras.
Cai o silêncio nos ombros e a luz
impura, até doer.
É urgente o amor, é urgente
permanecer.
***
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Em Louvor das Crianças
Se há na terra um reino que nos seja familiar e ao mesmo tempo estranho, fechado nos seus limites e simultaneamente sem fronteiras, esse reino é o da infância. A esse país inocente, donde se é expulso sempre demasiado cedo, apenas se regressa em momentos privilegiados — a tais regressos se chama, às vezes, poesia. Essa espécie de terra mítica é habitada por seres de uma tão grande formosura que os anjos tiveram neles o seu modelo, e foi às crianças, como todos sabem pelos evangelhos, que foi prometido o Paraíso.
A sedução das crianças provém, antes de mais, da sua proximidade com os animais — a sua relação com o mundo não é a da utilidade, mas a do prazer. Elas não conhecem ainda os dois grandes inimigos da alma, que são, como disse Saint-Exupéry, o dinheiro e a vaidade. Estas frágeis criaturas, as únicas desde a origem destinadas à imortalidade, são também as mais vulneráveis — elas têm o peito aberto às maravilhas do mundo, mas estão sem defesa para a bestialidade humana que, apesar de tanta tecnologia de ponta, não diminui nem se extingue.
O sofrimento de uma criança é de uma ordem tão monstruosa que, frequentemente, é usado como argumento para a negação da bondade divina. Não, não há salvação para quem faça sofrer uma criança, que isto se grave indelevelmente nos vossos espíritos. O simples facto de consentirmos que milhões e milhões de crianças padeçam fome, e reguem com as suas lágrimas a terra onde terão ainda de lutar um dia pela justiça e pela liberdade, prova bem que não somos filhos de Deus.
***
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Impetuoso, o teu corpo é como um rio
onde o meu se perde.
Se escuto, só oiço o teu rumor.
De mim, nem o sinal mais breve.
Imagem dos gestos que tracei,
irrompe puro e completo.
Por isso, rio foi o nome que lhe dei.
E nele o céu fica mais perto.
Arte - Felix Más
***
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Somos como árvores
só quando o desejo é morto.
Só então nos lembramos
que dezembro traz em si a primavera.
Só então, belos e despidos,
ficamos longamente à sua espera.
em "As Mãos e Os Frutos", 1948
***
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É apenas o começo. Só depois dói,
e se lhe dá nome.
Às vezes chamam-lhe paixão. Que pode
acontecer da maneira mais simples:
umas gotas de chuva no cabelo.
Aproximas a mão, os dedos
desatam a arder inesperadamente,
recuas de medo. Aqueles cabelos,
as suas gotas de água são o começo,
apenas o começo. Antes
do fim terás de pegar no fogo
e fazeres do inverno
a mais ardente das estações.
***e se lhe dá nome.
Às vezes chamam-lhe paixão. Que pode
acontecer da maneira mais simples:
umas gotas de chuva no cabelo.
Aproximas a mão, os dedos
desatam a arder inesperadamente,
recuas de medo. Aqueles cabelos,
as suas gotas de água são o começo,
apenas o começo. Antes
do fim terás de pegar no fogo
e fazeres do inverno
a mais ardente das estações.
https://www.facebook.com/349094905211303/photos/a.349115855209208.1073741828.349094905211303/578905378896920/?type=1&theater
Não, não encontro o retrato.
Estavas de perfil, a luz de cinza
caía-te dos braços,
da casa próxima o fumo
subia devagar os últimos degraus
do outono, um cachorro
saltava no terreiro, não tardaria
a escurecer.
Estavas de perfil, a mão acompanhando
no regaço a rosa que te dei.
Deixa-a ficar e ser,
a mão, rosa também.
Arte - Christiane Vleugels
***
https://www.facebook.com/282054545145829/photos/a.282056735145610.78181.282054545145829/822795847738360/?type=1&theater
"Toda a manhã
fui ave ou sol ou flor
secretamente
ao pé de ti."
_________________
Toda a manhã
fui a flor
impaciente
por abrir.
Toda a manhã
fui ardor
do sol
no teu telhado.
Toda a manhã
fui ave
inquieta
no teu jardim.
Toda a manhã
fui ave ou sol ou flor
secretamente
ao pé de ti.
***
avante 17.Junho.2005 após a sua morte:
Morreu Eugénio de Andrade,
ficamos com o Poeta
ficamos com o Poeta
Morreu Eugénio de Andrade, figura maior da poesia portuguesa no século XX, o «poeta solar», da palavra luminosa, que teve a sua estreia fulgurante para o grande público com o celebérrimo livro As Mãos e os Frutos no já longínquo ano de 1948, tinha o Poeta apenas 25 anos. Fizera há pouco 82 anos, faleceu de doença prolongada, mas há muito que a sua obra magnífica o lançara para a imortalidade, fazendo também dele o poeta mais traduzido do século XX, logo a seguir a Fernando Pessoa. De caminho, ganhara o Prémio Camões, o maior galardão em língua portuguesa que lhe foi atribuído em 2001, aos 78 anos.
José Fontinhas de seu nome civil, Eugénio de Andrade nasceu a 19 de Janeiro de 1923 na Póvoa da Atalaia, concelho do Fundão, Beira Baixa, mudando-se em 1932 para Lisboa com a mãe, figura crucial na sua vida e na sua poética. É em Lisboa que passa toda a adolescência, descobre a sua vocação poética e convive com alguns escritores e poetas. Em 1940 publica Narciso, o seu primeiro volume de poemas ainda assinado com o nome de baptismo, a que se seguem Pureza (1942) e Adolescente (1945), onde fixa para sempre o seu pseudónimo «Eugénio de Andrade». Destes três livros, depois de expurgados pelo autor, foram publicadas diversas composições numa antologia intitulada Primeiros Poemas, cuja primeira edição data de 1977.
Entre 1943 e 1946 Eugénio de Andrade encontra-se em Coimbra, onde estabelece relações de amizade com alguns dos maiores vultos da literatura e do pensamento portugueses da época, como Miguel Torga, Carlos de Oliveira e Eduardo Lourenço. Em 1947 torna-se funcionário público, exercendo durante os 35 anos que se seguiram as funções de inspector administrativo do Ministério da Saúde.
Poeta consagrado, o autor não se limitou, contudo, à poesia, escrevendo diversos ensaios e prefácios, colaborando em numerosas publicações, traduzindo Garcia Lorca, organizando as Cartas Portuguesasatribuídas a Mariana Alcoforado, seleccionando poesia de diversos autores estrangeiros, prefaciando antologias temáticas, etc. etc.
Privou com os grandes nomes da literatura portuguesa, tanto da sua geração como das seguintes, tendo sido amigo íntimo de poetas de estéticas muito diversas, como Sophia de Mello Breyner, Mário Cesariny ou Luís Miguel Nava, tal como de críticos consagrados, como Oscar Lopes, António José Saraiva, João Gaspar Simões ou Arnaldo Saraiva.
Em 1948 publica As Mãos e os Frutos, a obra que ele próprio considera a sua verdadeira estreia literária, tinha então apenas 25 anos. Até hoje, este primeiro volume já mereceu cerca de 20 edições e continua a deslumbrar sucessivas gerações de leitores.
Entretanto, por essa altura já vivera e trabalhara intensamente. Passara alguns anos em Coimbra, onde conheceu Carlos de Oliveira, Miguel Torga e Eduardo Lourenço, já traduzira Garcia Lorca, viajara por Espanha e França, encontrara-se com Sophia de Mello Breyner e começara a trabalhar como inspector dos Serviços Médico-Sociais.
Em 1950, por razões de serviço na sua actividade de funcionário público do Ministério da Saúde, muda-se para o Porto, cidade que adoptará e que também por ela será adoptado, aí vivendo até ao fim dos seus dias, primeiro na Rua Duque de Palmela, 111, depois na «casa da Foz», que se tornará a sua residência até ao final. Esta casa tem uma história. Em finais de 1993, alguns amigos portuenses do Poeta criaram a Fundação Eugénio de Andrade, que abriu ao público em Janeiro de 1995. Situada na Foz do Douro, numa casa recuperada na esquina da Rua do Passeio Alegre com a Calçada de Serrúbia, a Fundação passou a servir também de residência do poeta, que a habitará até ao fim dos seus dias. Entretanto a Fundação, que fora instituída para estudar e divulgar a sua obra, passou a promover encontros regulares de poetas e a editar osCadernos de Serrúbia, revista de estudos sobre poesia.
Cinco referências
duma obra maior
Na vasta e diversificada obra que Eugénio de Andrade nos deixa, há cinco volumes que merecem uma referência especial.
Cronologicamente, em 1948 sai o já citado As Mãos e os Frutos, que o próprio autor considera o seu «livro de estreia». É o primeiro marco de uma obra rutilante.
Segue-se Ostinato Rigore, em 1964, talvez o livro de poemas que se seguiu com impacto semelhante ao As Mãos e os Frutos e onde o Poeta dedilha «acordes» mais nocturnos na sua poesia eminentemente «solar».
Em 1971 surge Obscuro Domínio, onde surge o famoso «poema Ariadne» e é, por muitos, considerado um dos melhores livros do autor.
Aos 72 anos, prodigiosamente, surge com O Sal da Língua, um livro igualmente maior na sua obra tão grande, sobretudo em qualidade.
Finalmente, em 2000 edita Poesia, onde Eugénio de Andrade reuniu tudo o que quis conservar da sua obra poética, à excepção do livro Os Sulcos da Sede(2001), que já integrará a próxima edição, a sair em breve.
Entre 1943 e 1946 Eugénio de Andrade encontra-se em Coimbra, onde estabelece relações de amizade com alguns dos maiores vultos da literatura e do pensamento portugueses da época, como Miguel Torga, Carlos de Oliveira e Eduardo Lourenço. Em 1947 torna-se funcionário público, exercendo durante os 35 anos que se seguiram as funções de inspector administrativo do Ministério da Saúde.
Poeta consagrado, o autor não se limitou, contudo, à poesia, escrevendo diversos ensaios e prefácios, colaborando em numerosas publicações, traduzindo Garcia Lorca, organizando as Cartas Portuguesasatribuídas a Mariana Alcoforado, seleccionando poesia de diversos autores estrangeiros, prefaciando antologias temáticas, etc. etc.
Privou com os grandes nomes da literatura portuguesa, tanto da sua geração como das seguintes, tendo sido amigo íntimo de poetas de estéticas muito diversas, como Sophia de Mello Breyner, Mário Cesariny ou Luís Miguel Nava, tal como de críticos consagrados, como Oscar Lopes, António José Saraiva, João Gaspar Simões ou Arnaldo Saraiva.
Em 1948 publica As Mãos e os Frutos, a obra que ele próprio considera a sua verdadeira estreia literária, tinha então apenas 25 anos. Até hoje, este primeiro volume já mereceu cerca de 20 edições e continua a deslumbrar sucessivas gerações de leitores.
Entretanto, por essa altura já vivera e trabalhara intensamente. Passara alguns anos em Coimbra, onde conheceu Carlos de Oliveira, Miguel Torga e Eduardo Lourenço, já traduzira Garcia Lorca, viajara por Espanha e França, encontrara-se com Sophia de Mello Breyner e começara a trabalhar como inspector dos Serviços Médico-Sociais.
Em 1950, por razões de serviço na sua actividade de funcionário público do Ministério da Saúde, muda-se para o Porto, cidade que adoptará e que também por ela será adoptado, aí vivendo até ao fim dos seus dias, primeiro na Rua Duque de Palmela, 111, depois na «casa da Foz», que se tornará a sua residência até ao final. Esta casa tem uma história. Em finais de 1993, alguns amigos portuenses do Poeta criaram a Fundação Eugénio de Andrade, que abriu ao público em Janeiro de 1995. Situada na Foz do Douro, numa casa recuperada na esquina da Rua do Passeio Alegre com a Calçada de Serrúbia, a Fundação passou a servir também de residência do poeta, que a habitará até ao fim dos seus dias. Entretanto a Fundação, que fora instituída para estudar e divulgar a sua obra, passou a promover encontros regulares de poetas e a editar osCadernos de Serrúbia, revista de estudos sobre poesia.
Cinco referências
duma obra maior
Na vasta e diversificada obra que Eugénio de Andrade nos deixa, há cinco volumes que merecem uma referência especial.
Cronologicamente, em 1948 sai o já citado As Mãos e os Frutos, que o próprio autor considera o seu «livro de estreia». É o primeiro marco de uma obra rutilante.
Segue-se Ostinato Rigore, em 1964, talvez o livro de poemas que se seguiu com impacto semelhante ao As Mãos e os Frutos e onde o Poeta dedilha «acordes» mais nocturnos na sua poesia eminentemente «solar».
Em 1971 surge Obscuro Domínio, onde surge o famoso «poema Ariadne» e é, por muitos, considerado um dos melhores livros do autor.
Aos 72 anos, prodigiosamente, surge com O Sal da Língua, um livro igualmente maior na sua obra tão grande, sobretudo em qualidade.
Finalmente, em 2000 edita Poesia, onde Eugénio de Andrade reuniu tudo o que quis conservar da sua obra poética, à excepção do livro Os Sulcos da Sede(2001), que já integrará a próxima edição, a sair em breve.
***
Pequena elegia chamada domingoO domingo era uma coisa pequena.
Uma coisa tão pequena
que cabia inteirinha nos teus olhos.
Nas tuas mãos
estavam os montes e os rios
e as nuvens.
Mas as rosas,
as rosas estavam na tua boca.
Hoje os montes e os rios
e as nuvens
não vêm nas tuas mãos.
(Se ao menos elas viessem
sem montes e sem nuvens
e sem rios...)
O domingo está apenas nos meus olhos
e é grande.
Os montes estão distantes e ocultam
os rios e as nuvens
e as rosas
***
https://www.facebook.com/349094905211303/photos/a.349115855209208.1073741828.349094905211303/563364707117654/?type=1&theater
Quase Nada
O amor
é uma ave a tremer
nas mãos de uma criança.
Serve-se de palavras
por ignorar
que as manhãs mais limpas
não têm voz.
***
Via Graça Silva:
Sei agora como nasceu a alegria, como nasce o vento entre barcos de papel, como nasce a água ou o amor quando a juventude não é uma lágrima. É primeiro só um rumor de espuma à roda do corpo que desperta, sílaba espessa, beijo acumulado, amanhecer de pássaros no sangue. É subitamente um grito, um grito apertado nos dentes, galope de cavalos num horizonte onde o mar é diurno e sem palavras. Falei de tudo quanto amei. De coisas que te dou para que tu as ames comigo: a juventude, o vento e as areias.
***
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Deixo ao Miguel as coisas da manhã –
a luz (se não estiver já corrompida)
a caminho do sul,
o chão limpo das dunas desertas,
um verso onde os seixos são
de porcelana,
o ardor quase animal
de uma romã aberta.
do livro "O Peso da Sombra" (1982)
Arte - Emanuele Dascanio
***
https://www.facebook.com/photo.php?fbid=662227757146275&set=a.559507790751606.1073741828.559343457434706&type=1&theater
Creio que foi o sorriso,
o sorriso foi quem abriu a porta.
Era um sorriso com muita luz
lá dentro, apetecia
entrar nele, tirar a roupa, ficar
nu dentro daquele sorriso.
Correr, navegar, morrer naquele sorriso.
in “O Outro Nome da Terra”
Aishwarya Rai - Imagem
***
https://www.facebook.com/349094905211303/photos/a.349115855209208.1073741828.349094905211303/534956096625182/?type=1&theater
***
https://www.facebook.com/imagensfaladas/photos/a.219921738189870.1073741828.219896998192344/273646536150723/?type=1&theater
Procuro a ternura súbita,
os olhos ou o sol por nascer
do tamanho do mundo,
o sangue que nenhuma espada viu,
o ar onde a respiração é doce,
um pássaro no bosque
com a forma de um grito de alegria.
***
https://www.facebook.com/
Ergue-te de mim,
substância pura do meu canto.
Luz terrestre, fragrância.
Ergue-te, jasmim.
Ergue-te, e aquece
a cal e a pedra,
as mãos e a alma.
Inunda, reina, amanhece.
Ao menos tu sê ave,
primavera excessiva.
Ergue-te de mim:
canta, delira, arde.
Coração do Dia
***
É apenas o começo. Só depois dói,
e se lhe dá nome.
Às vezes chamam-lhe paixão. Que pode
acontecer da maneira mais simples:
umas gotas de chuva no cabelo.Aproximas a mão, os dedos
desatam a arder inesperadamente,
recuas de medo. Aqueles cabelos,
as suas gotas de água são o começo,
apenas o começo. Antes
do fim terás de pegar no fogo
e fazeres do inverno
a mais ardente das estações.
(imagem: seducedby.tumblr.com)
***
Talvez a ternura
crepite no pulso,
talvez o vento
súbito se levante,
talvez a palavra
atinja o seu cume,
talvez um segredo
chegue ainda a tempo
__e desperte o lume.
"Tenho o nome de uma flor
quando me chamas.
Quando me tocas,
nem eu sei
se sou água, rapariga,
ou algum pomar que atravessei"
Arte - António Oliveira Tavares
ou algum pomar que atravessei"
Arte - António Oliveira Tavares
***
https://www.facebook.com/ photo.php?fbid= 611504428904517&set=a. 107207769334188.12956. 100001348957610&type=1&theater
O Silêncio
Quando a ternura
parece já do seu ofício fatigada,
e o sono, a mais incerta barca,
inda demora,
quando azuis irrompem
os teus olhos
e procuram
nos meus navegação segura,
é que eu te falo das palavras
desamparadas e desertas,
pelo silêncio fascinadas.
in "Obscuro Domínio"
*
imagem - Catrin Welz-Stein
e o sono, a mais incerta barca,
inda demora,
quando azuis irrompem
os teus olhos
e procuram
nos meus navegação segura,
é que eu te falo das palavras
desamparadas e desertas,
pelo silêncio fascinadas.
in "Obscuro Domínio"
*
imagem - Catrin Welz-Stein
***
Espera
Horas, horas sem fim,
pesadas, fundas,
esperarei por ti
até que todas as coisas sejam mudas.
Até que uma pedra irrompa
e floresça.
Até que um pássaro me saia da garganta
e no silêncio desapareça.
Arte - Donald Boyd
Horas, horas sem fim,
pesadas, fundas,
esperarei por ti
até que todas as coisas sejam mudas.
Até que uma pedra irrompa
e floresça.
Até que um pássaro me saia da garganta
e no silêncio desapareça.
Arte - Donald Boyd
***
Procura a maravilha.
Onde um beijo sabe
a barcos e bruma.
No brilho redondo
e jovem dos joelhos.
Na noite inclinada
de melancolia.
Procura.
Procura a maravilha.
Onde um beijo sabe
a barcos e bruma.
No brilho redondo
e jovem dos joelhos.
Na noite inclinada
de melancolia.
Procura.
Procura a maravilha.
***
Que música escutas tão atentamente
que não dás por mim?
Que bosque, ou rio, ou mar?
Ou é dentro de ti
que tudo canta ainda?
Queria falar contigo,
dizer-te apenas que estou aqui,
mas tenho medo,
medo que toda a música cesse
e tu não possas mais olhar as rosas.
Medo de quebrar o fio
com que teces os dias sem memória.
Com que palavras ou beijos ou lágrimas
se acordam os mortos sem os ferir,
sem os trazer a esta espuma negra
onde corpos e corpos se repetem,
parcimoniosamente, no meio de sombras?
Deixa-te estar assim,
ó cheia de doçura,
sentada, olhando as rosas,
e tão alheia
que nem dás por mim...
Arte - Jose Miguel Roman Frances
***
Que bosque, ou rio, ou mar?
Ou é dentro de ti
que tudo canta ainda?
Queria falar contigo,
dizer-te apenas que estou aqui,
mas tenho medo,
medo que toda a música cesse
e tu não possas mais olhar as rosas.
Medo de quebrar o fio
com que teces os dias sem memória.
Com que palavras ou beijos ou lágrimas
se acordam os mortos sem os ferir,
sem os trazer a esta espuma negra
onde corpos e corpos se repetem,
parcimoniosamente, no meio de sombras?
Deixa-te estar assim,
ó cheia de doçura,
sentada, olhando as rosas,
e tão alheia
que nem dás por mim...
Arte - Jose Miguel Roman Frances
***
Beber-te a sede e partir
- eu sou de tão longe.
***
O meu país sabe às amoras bravas
no verão.
Ninguém ignora que não é grande,
nem inteligente, nem elegante o meu país,
mas tem esta voz doce
de quem acorda cedo para cantar nas silvas.
Raramente falei do meu país, talvez
nem goste dele, mas quando um amigo
me traz amoras bravas
os seus muros parecem-me brancos,
reparo que também no meu país o céu é azul.
in "O Outro Nome da Terra"
Nastya Zhidkova - Fotografia
***
no verão.
Ninguém ignora que não é grande,
nem inteligente, nem elegante o meu país,
mas tem esta voz doce
de quem acorda cedo para cantar nas silvas.
Raramente falei do meu país, talvez
nem goste dele, mas quando um amigo
me traz amoras bravas
os seus muros parecem-me brancos,
reparo que também no meu país o céu é azul.
in "O Outro Nome da Terra"
Nastya Zhidkova - Fotografia
***
Aqui cantaste nua.
Aqui bebeste a planície, a lua,
e ao vento deste os olhos a beber.
Aqui abandonaste as mãos
a tudo o que não chega a acontecer.
Fábrica de Escrita
(imagem: © Terra Kate)
Aqui bebeste a planície, a lua,
e ao vento deste os olhos a beber.
Aqui abandonaste as mãos
a tudo o que não chega a acontecer.
Fábrica de Escrita
(imagem: © Terra Kate)
***
***
Na música que é tua,
meus lábios torrenciais
caem pesados, duros.
E nunca mais.
Despenham-se a prumo:
vidros ou punhais.
Arrastam-te ao fundo.
E nunca mais.
Eugénio de Andrade
— com Laura Schneidermeus lábios torrenciais
caem pesados, duros.
E nunca mais.
Despenham-se a prumo:
vidros ou punhais.
Arrastam-te ao fundo.
E nunca mais.
Eugénio de Andrade
Húmido de beijos e de lágrimas,
ardor da terra com sabor a mar,
o teu corpo perdia-se no meu.
(Vontade de ser barco ou de cantar.)
______
imagem
For the Love,for the Death and the Poetry
(Vontade de ser barco ou de cantar.)
______
imagem
For the Love,for the Death and the Poetry
***
Não canto porque sonho.
Canto porque és real.
Canto o teu olhar maduro,
O teu sorriso puro,
A tua graça animal.
Canto porque sou homem.
Se não cantasse seria
somente um bicho sadio
embriagado na alegria
da tua vinha sem vinha.
Canto porque o amor apetece.
Porque o feno amadurece
nos teus braços deslumbrados.
Porque o meu corpo estremece
Por vê-los nus e suados.
(em As Mãos e os Frutos)
***
***
Via Célia D:
"Passamos pelas coisas sem as ver,
gastos, como animais envelhecidos:
se alguém chama por nós não respondemos,
se alguém nos pede amor não estremecemos,
como frutos de sombra sem sabor,
vamos caindo ao chão, apodrecidos."
***
Tudo era claro:
céu, lábios, areias.
O mar estava perto,
Fremente de espumas.
Corpos ou ondas:
iam, vinham, iam,
dóceis, leves, só
alma e brancura.
Felizes, cantam;
serenos, dormem;
despertos, amam,
exaltam o silêncio.
Tudo era claro,
jovem, alado.
O mar estava perto,
puríssimo, doirado.
in “Mar de Setembro”
© Mario Testino - Imagem
**
https://www.facebook.com/photo.php?fbid=813423745337375&set=a.462529847093435.111436.462489187097501&type=1&theater
Nos teus dedos nasceram horizontes
e aves verdes vieram desvairadas
beber neles julgando serem fontes.
in As mãos e os frutos
(imagem: words to say por quadratiges, Flickr)
**********
Via Lídia F
AS PALAVRAS
São como um cristal,
as palavras.
Algumas, um punhal,
um incêndio.
Outras,
orvalho apenas.
as palavras.
Algumas, um punhal,
um incêndio.
Outras,
orvalho apenas.
Secretas vêm, cheias de memória.
Inseguras navegam:
barcos ou beijos,
as águas estremecem.
Inseguras navegam:
barcos ou beijos,
as águas estremecem.
Desamparadas, inocentes,
leves.
Tecidas são de luz
e são a noite.
E mesmo pálidas
verdes paraísos lembram ainda.
leves.
Tecidas são de luz
e são a noite.
E mesmo pálidas
verdes paraísos lembram ainda.
Quem as escuta? Quem
as recolhe, assim,
cruéis, desfeitas,
nas suas conchas puras?
*****
Respiro o teu corpo
Respiro o teu corpo:
sabe a lua-de-água
ao amanhecer,
sabe a cal molhada,
sabe a luz mordida,
sabe a brisa nua,
ao sangue dos rios,
sabe a rosa louca,
ao cair da noite
sabe a pedra amarga,
sabe à minha boca
***
o primeiro disco publicado por Fausto depois da Revolução dos Cravos:
Pr'ó Que Der e Vier.
http://www.youtube.com/watch?v=QmFCUH9B398
,,,,,,,,,,,,,,,,
letra de Eugénio de Andrade e música de António Pedro Braga e Fausto Bordalo Dias.
......
já agora Eugénio Andrade escreveu:
Acordar, ser na manhã de Abril
a brancura desta cerejeira;
arder das folhas à raiz,
dar versos ou florir desta maneira.
Abrir os braços, acolher nos ramos
o vento, a luz, ou o quer que seja;
sentir o tempo, fibra a fibra,
a tecer o coração de uma cereja.
Eugénio de Andrade,
As mãos e os frutos (1948)
***
Noite Transfigurada
Criança adormecida, ó minha noite,
noite perfeita e embalada
folha a folha,
noite transfigurada,
ó noite mais pequena do que as fontes,
pura alucinação da madrugada
– chegaste,
nem eu sei de que horizontes.
Hoje vens ao meu encontro
nimbada de astros,
alta e despida
de soluços e lágrimas e gritos
– ó minha noite, namorada
de vagabundos e aflitos.
Chegaste, noite minha,
de pálpebras descidas;
leve no ar que respiramos,
nítida no ângulo das esquinas
– ó noite mais pequena do que a morte:
nas mãos abertas onde me fechaste
ponho os meus versos e a própria sorte.
Eugénio de Andrade, do livro " As mãos e os frutos" 1948
***
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Urgentemente
É urgente o amor
É urgente um barco no mar
É urgente destruir certas palavras,
ódio, solidão e crueldade,
alguns lamentos, muitas espadas.
É urgente inventar alegria,
multiplicar os beijos, as searas,
é urgente descobrir rosas e rios
e manhãs claras.
Cai o silêncio nos ombros e a luz
impura, até doer.
É urgente o amor, é urgente
permanecer.
***
Ergue-te de mim,
substância pura do meu canto.
Luz terrestre, fragrância.
Ergue-te, jasmim.
Ergue-te, e aquece
a cal e a pedra,
as mãos e a alma.
Inunda, reina, amanhece.
Ao menos tu sê ave,
primavera excessiva.
Ergue-te de mim:
canta, delira, arde.
(Coração do Dia)
***
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É apenas o começo. Só depois dói,
e se lhe dá nome.
Às vezes chamam-lhe paixão. Que pode
acontecer da maneira mais simples:
umas gotas de chuva no cabelo.
Aproximas a mão, os dedos
desatam a arder inesperadamente,
recuas de medo. Aqueles cabelos,
as suas gotas de água são o começo,
apenas o começo. Antes
do fim terás de pegar no fogo
e fazeres do inverno
a mais ardente das estações.
e se lhe dá nome.
Às vezes chamam-lhe paixão. Que pode
acontecer da maneira mais simples:
umas gotas de chuva no cabelo.
Aproximas a mão, os dedos
desatam a arder inesperadamente,
recuas de medo. Aqueles cabelos,
as suas gotas de água são o começo,
apenas o começo. Antes
do fim terás de pegar no fogo
e fazeres do inverno
a mais ardente das estações.
***
Talvez a ternura
crepite no pulso,
talvez o vento
súbito se levante,
talvez a palavra
atinja o seu cume,
talvez um segredo
chegue ainda a tempo
__e desperte o lume.
crepite no pulso,
talvez o vento
súbito se levante,
talvez a palavra
atinja o seu cume,
talvez um segredo
chegue ainda a tempo
__e desperte o lume.
***
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***
"Tenho o nome de uma flor
quando me chamas.
Quando me tocas,
nem eu sei
se sou água, rapariga,
ou algum pomar que atravessei"
quando me chamas.
Quando me tocas,
nem eu sei
se sou água, rapariga,
ou algum pomar que atravessei"
***
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e o sono, a mais incerta barca,
inda demora,
quando azuis irrompem
os teus olhos
e procuram
nos meus navegação segura,
é que eu te falo das palavras
desamparadas e desertas,
pelo silêncio fascinadas.
in "Obscuro Domínio"
O Silêncio
Quando a ternura
parece já do seu ofício fatigada, e o sono, a mais incerta barca,
inda demora,
quando azuis irrompem
os teus olhos
e procuram
nos meus navegação segura,
é que eu te falo das palavras
desamparadas e desertas,
pelo silêncio fascinadas.
in "Obscuro Domínio"
***
https://www.facebook.com/ 349094905211303/photos/a. 349115855209208.1073741828. 349094905211303/ 527483610705764/?type=1& theater
Espera
Horas, horas sem fim,
pesadas, fundas,
esperarei por ti
até que todas as coisas sejam mudas.
Até que uma pedra irrompa
e floresça.
Até que um pássaro me saia da garganta
e no silêncio desapareça.
até que todas as coisas sejam mudas.
Até que uma pedra irrompa
e floresça.
Até que um pássaro me saia da garganta
e no silêncio desapareça.
***
PROCURA A MARAVILHA
Procura a maravilha.
Onde um beijo sabe
a barcos e bruma.
No brilho redondo
e jovem dos joelhos.
Na noite inclinada
de melancolia.
Procura.
Procura a maravilha.
Procura a maravilha.
Onde um beijo sabe
a barcos e bruma.
No brilho redondo
e jovem dos joelhos.
Na noite inclinada
de melancolia.
Procura.
Procura a maravilha.
***
Que música escutas tão atentamente
que não dás por mim?
Que bosque, ou rio, ou mar?
Ou é dentro de ti
que tudo canta ainda?
Queria falar contigo,
dizer-te apenas que estou aqui,
mas tenho medo,
medo que toda a música cesse
e tu não possas mais olhar as rosas.
Medo de quebrar o fio
com que teces os dias sem memória.
Com que palavras ou beijos ou lágrimas
se acordam os mortos sem os ferir,
sem os trazer a esta espuma negra
onde corpos e corpos se repetem,
parcimoniosamente, no meio de sombras?
Deixa-te estar assim,
ó cheia de doçura,
sentada, olhando as rosas,
e tão alheia
que nem dás por mim...
que não dás por mim?
Que bosque, ou rio, ou mar?
Ou é dentro de ti
que tudo canta ainda?
Queria falar contigo,
dizer-te apenas que estou aqui,
mas tenho medo,
medo que toda a música cesse
e tu não possas mais olhar as rosas.
Medo de quebrar o fio
com que teces os dias sem memória.
Com que palavras ou beijos ou lágrimas
se acordam os mortos sem os ferir,
sem os trazer a esta espuma negra
onde corpos e corpos se repetem,
parcimoniosamente, no meio de sombras?
Deixa-te estar assim,
ó cheia de doçura,
sentada, olhando as rosas,
e tão alheia
que nem dás por mim...
***
Beber-te a sede e partir
- eu sou de tão longe
- eu sou de tão longe
***
https://www.facebook.com/ photo.php?fbid= 655051364530581&set=a. 559507790751606.1073741828. 559343457434706&type=1&theater
O meu país sabe às amoras bravas
no verão.
Ninguém ignora que não é grande,
nem inteligente, nem elegante o meu país,
mas tem esta voz doce
de quem acorda cedo para cantar nas silvas.
Raramente falei do meu país, talvez
nem goste dele, mas quando um amigo
me traz amoras bravas
os seus muros parecem-me brancos,
reparo que também no meu país o céu é azul.
Eugénio de Andrade in "O Outro Nome da Terra"
Nastya Zhidkova - Fotografia
nem inteligente, nem elegante o meu país,
mas tem esta voz doce
de quem acorda cedo para cantar nas silvas.
Raramente falei do meu país, talvez
nem goste dele, mas quando um amigo
me traz amoras bravas
os seus muros parecem-me brancos,
reparo que também no meu país o céu é azul.
Eugénio de Andrade in "O Outro Nome da Terra"
Nastya Zhidkova - Fotografia
***
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(Vontade de ser barco ou de cantar.)
_____
imagem
For the Love,for the Death and the Poetry
Aqui cantaste nua.
Aqui bebeste a planície, a lua,
e ao vento deste os olhos a beber.
Aqui abandonaste as mãos
a tudo o que não chega a acontecer.
***
Na música que é tua,
meus lábios torrenciais
caem pesados, duros.
E nunca mais.
Despenham-se a prumo:
vidros ou punhais.
Arrastam-te ao fundo.
E nunca mais.
***
meus lábios torrenciais
caem pesados, duros.
E nunca mais.
Despenham-se a prumo:
vidros ou punhais.
Arrastam-te ao fundo.
E nunca mais.
***
Húmido de beijos e de lágrimas,
ardor da terra com sabor a mar,
o teu corpo perdia-se no meu.(Vontade de ser barco ou de cantar.)
_____
imagem
For the Love,for the Death and the Poetry
***
***
15noVEMbro2011
hj x AQUI rELEVO euGÉNIO andrade e "Heart Tixt" + 1 belo espaço facebookiano
https://www.facebook.com/photo.php?fbid=271650922865794&set=a.178416622189225.40450.100000626653762&type=3&theater
Há um pequeno sismo em qualquer parte
ao dizeres o meu nome.
Elevas-me à altura da tua boca
lentamente
para não me desfolhares.
Tremo como se tivera
quinze anos e toda a terra
fosse leve.
Ó indizível primavera!
15noVEMbro2011
hj x AQUI rELEVO euGÉNIO andrade e "Heart Tixt" + 1 belo espaço facebookiano
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Há um pequeno sismo em qualquer parte
ao dizeres o meu nome.
Elevas-me à altura da tua boca
lentamente
para não me desfolhares.
Tremo como se tivera
quinze anos e toda a terra
fosse leve.
Ó indizível primavera!
***
https://estoriasdahistoria12.blogspot.com/2019/01/19-de-janeiro-de-1923-nasce-o-poeta.html?fbclid=IwAR3wxLaOWWBtGTeLKKpeO6L3WVFK0wmi6Q10XVipbyIy2jnHLUxupjnIYiM
***
19 de Janeiro de 1923: Nasce o poeta Eugénio de Andrade
Poeta
português, Eugénio de
Andrade, pseudónimo de
José Fontinhas, nasceu
a 19 de Janeiro de 1923 no Fundão, e faleceu a 13 de Junho de 2005,
no Porto. Em
1947 ingressou na
função pública, como
funcionário dos Serviços Médico-Sociais, e em 1950 fixou residência no Porto. Manteve sempre uma postura de independência
relativamente aos vários movimentos literários
com que a
sua obra coexistiu
ao longo de
mais de cinquenta
anos de actividade poética. Revelando-se
em 1948, com
As Mãos
e os Frutos, a que
se seguiria, em
1950, Os
Amantes sem Dinheiro, o seu
nome não se
encontra vinculado a
nenhuma das publicações
que marcaram, enquanto
lugar de reflexão
sobre opções e
tradições estéticas, a
poesia contemporânea, embora tenha editado um
dos seus volumes,
As Palavras
Interditas, na colecção "Cancioneiro
Geral" e tenha
colaborado em publicações como Árvore,
Cadernos do Meio-Dia
ou Cadernos de Poesia. É, aliás,
nesta última publicação, editada nos anos
quarenta, que se
firmam algumas das
vozes independentes, como Ruy Cinatti, Sophia de Mello Breyner
Andresen ou Jorge
de Sena, que
inaugurariam, no século
XX, essa linhagem
de lirismo depurado,
exigente, atento ao
poder da palavra
no conhecimento ou
na fundação de
um real dificilmente
dizível ou inteligível,
em que Eugénio
de Andrade se
inscreve. Foi um
dos poetas portugueses
mais lidos e
traduzidos, mantendo ao
longo de uma
longa e fecunda
carreira uma certa
unidade de temas
e de recursos
formais.
A
escolha dos inofensivos
substantivos "pureza" e
"leveza" para referir
a sua obra
derivará talvez da
noção do impulso
de purificação que
a sua poética
confere às palavras
através da exploração
de um léxico
essencial até à
exaltação. Quando Maria
Alzira Seixo fala
do caminho que
esta poesia percorre
"na senda do
rigor da lápide"
("Every poem is
an epitaph", já
dizia Eliot) levanta
o véu de
um dos pontos
fulcrais desta poesia
que, nas palavras
do próprio Eugénio
de Andrade (Rosto Precário), se afirma como
o "lugar onde
o desejo ousa
fitar a morte
nos olhos". Falar
desta obra como
morada da "leveza"
e da "pureza"
é encobrir o
que nela há
de ofício
de paciência e
de desesperada busca.
Talvez seja preferível
falar da força
básica de um
léxico de tal
maneira investido da
radicação do corpo
do objecto amado
no mundo e
na sua paisagem
que é capaz
de impor o
desejo da luz
no coração das
trevas da mortalidade.
Eugénio de Andrade
surgirá, assim, como
o poeta da
"correlação do corpo
com a palavra"
(Carlos Mendes de
Sousa), da sexualidade
trabalhada verbalmente até atingir uma "zona gramatical cega"
(Joaquim Manuel Magalhães) onde o referido
sexual não tem
género gramatical referente porque o discurso em que vive
pertence já a
uma dimensão cuja
musicalidade representa a recuperação de uma voz materna
intemporal.
Eugénio de Andrade foi
elemento da Academia
Mallarmé (Paris) e
membro fundador da
Academia Internacional "Mihail Eminescu" (Roménia).
Para além de
tradutor de vários
autores, cujas obras
recriou poeticamente (García Lorca, Safo, Borges), e organizador de
várias antologias poéticas, é autor de
obras como Os Afluentes do
Silêncio (1968), Rosto Precário
(1979), À
Sombra da Memória
(1993) (em prosa),
As Mãos
e os Frutos
(1948), As
Palavras Interditas
(1951), Ostinato
Rigore (1964), Limiar dos Pássaros (1976), Rente
ao Dizer (1992),
Ofício da
Paciência (1994), O Sal da
Língua (1995) e
Os Lugares
do Lume (1998).
Recebeu
ao longo da
sua vida vários
prémios: Pen Clube
(1986), Associação
Internacional dos Críticos Literários (1986), Dom Dinis (1988), Grande Prémio da Associação Portuguesa de
Escritores (1989), Jean
Malrieu (França, 1989),
APCA (Brasil,1991), Prémio Europeu de Poesia da Comunidade de
Varchatz (República da
Sérvia, 1996), Prémio
Vida Literária atribuído pela APE (2000)
e, em maio
de 2001, o
primeiro prémio de
poesia "Celso Emilio
Ferreiro" atribuído em
Orense, na Galiza.
Em 2001, a
10 de maio,
Eugénio de Andrade
foi homenageado na
Universidade de Bordéus
por altura da
realização do "Carrefour des Littératures",
tendo sido considerado
um dos mais
importantes escritores do século XX. Estiveram presentes várias
ilustres personalidades, entre elas o Presidente da República Portuguesa Jorge Sampaio. A
10 de Julho foi distinguido
com o Prémio
Camões e, ainda
no mesmo ano,
foi lançado um
CD com poemas
recitados pelo próprio
autor. Em 2002,
foram atribuídos os
prémios PEN 2001
e Eugénio de
Andrade recebeu o
prémio da área
da poesia pela
sua obra Os Sulcos da
Sede. No
dia em que
comemorou o seu
octogésimo aniversário foi homenageado na
Biblioteca Almeida Garrett do Porto.
Em
1991, foi criada
na cidade do
Porto a Fundação
Eugénio de Andrade.
Para além de
ter servido de
residência ao poeta,
esta instituição tem
como principais objectivos o estudo e a divulgação da
obra do autor
assim como a
organização de diversos
eventos como, por
exemplo, lançamentos de
livros, recitais e
encontros de poesia.
A
22 de Março de 2005 foi
distinguido, juntamente com a escritora Agustina Bessa-Luís, com o doutoramento "Honoris
Causa", atribuído pela
Universidade do Porto
durante a cerimónia
do 94.º aniversário
da sua fundação
Eugénio de Andrade. In Infopédia [Em
linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2013.
Poema
à Mãe
No
mais fundo de ti,
eu sei que traí, mãe
Tudo porque já não sou
o retrato adormecido
no fundo dos teus olhos.
Tudo porque tu ignoras
que há leitos onde o frio não se demora
e noites rumorosas de águas matinais.
Por isso, às vezes, as palavras que te digo
são duras, mãe,
e o nosso amor é infeliz.
Tudo porque perdi as rosas brancas
que apertava junto ao coração
no retrato da moldura.
Se soubesses como ainda amo as rosas,
talvez não enchesses as horas de pesadelos.
Mas tu esqueceste muita coisa;
esqueceste que as minhas pernas cresceram,
que todo o meu corpo cresceu,
e até o meu coração
ficou enorme, mãe!
Olha — queres ouvir-me? —
às vezes ainda sou o menino
que adormeceu nos teus olhos;
ainda aperto contra o coração
rosas tão brancas
como as que tens na moldura;
ainda oiço a tua voz:
Era uma vez uma princesa
no meio de um laranjal...
Mas — tu sabes — a noite é enorme,
e todo o meu corpo cresceu.
Eu saí da moldura,
dei às aves os meus olhos a beber,
Não me esqueci de nada, mãe.
Guardo a tua voz dentro de mim.
E deixo-te as rosas.
Boa noite. Eu vou com as aves.
eu sei que traí, mãe
Tudo porque já não sou
o retrato adormecido
no fundo dos teus olhos.
Tudo porque tu ignoras
que há leitos onde o frio não se demora
e noites rumorosas de águas matinais.
Por isso, às vezes, as palavras que te digo
são duras, mãe,
e o nosso amor é infeliz.
Tudo porque perdi as rosas brancas
que apertava junto ao coração
no retrato da moldura.
Se soubesses como ainda amo as rosas,
talvez não enchesses as horas de pesadelos.
Mas tu esqueceste muita coisa;
esqueceste que as minhas pernas cresceram,
que todo o meu corpo cresceu,
e até o meu coração
ficou enorme, mãe!
Olha — queres ouvir-me? —
às vezes ainda sou o menino
que adormeceu nos teus olhos;
ainda aperto contra o coração
rosas tão brancas
como as que tens na moldura;
ainda oiço a tua voz:
Era uma vez uma princesa
no meio de um laranjal...
Mas — tu sabes — a noite é enorme,
e todo o meu corpo cresceu.
Eu saí da moldura,
dei às aves os meus olhos a beber,
Não me esqueci de nada, mãe.
Guardo a tua voz dentro de mim.
E deixo-te as rosas.
Boa noite. Eu vou com as aves.
***