31/05/2013

6.633.(31maio2013.9.16') Encontro das esquerdas.30maio2013...Sampaio da Nóvoa...Mário Soares...João Ferreira (PCP)...

PCP pelo João Ferreira

http://www.pcp.pt/p%C3%B4r-fim-ao-pacto-de-agress%C3%A3o-e-aos-seus-resultados-dram%C3%A1ticos-para-o-povo-e-para-o-pa%C3%AD

Intervenção de João Ferreira, Deputado do PCP ao Parlamento Europeu, Lisboa, Debate «Libertar Portugal da austeridade»

Pôr fim ao Pacto de Agressão e aos seus resultados dramáticos para o povo e para o país

Minhas senhoras e meus senhores,
Estimados amigos,
Dois anos decorridos sobre a decisão de amarrar o país ao programa dito de ajustamento, assinado com a União Europeia e o Fundo Monetário Internacional, Portugal e os portugueses foram arrastados para o desastre económico e social.
A evolução da situação nacional reflecte os efeitos dramáticos do que a vida confirmou ser um autêntico Pacto de Agressão ao país e ao seu povo.
A realidade é documentada (se bem que não inteiramente traduzida) por números aterradores: quase um milhão e meio de desempregados; uma recessão acumulada de 5,5% do PIB; mais de 250 mil portugueses, na sua maioria jovens, forçados a emigrar; uma dívida pública impagável e imparável que, tendo aumentado 48 mil milhões de euros, atinge já os 127% do PIB.
Declínio económico, retrocesso social, empobrecimento e dependência. O país viu agravarem-se todos os seus problemas estruturais, mesmo aqueles que alegadamente teriam justificado esta intervenção. Não apenas cria hoje menos riqueza, como distribui de uma forma ainda mais injusta a riqueza que cria.
Expressão disso, os salários reais sofreram uma redução média de 9,2% – em termos relativos, portanto, bem acima da redução do PIB – e têm hoje um peso historicamente baixo no rendimento nacional: apenas 38%. Inocultável marca de classe desta política e do governo que a executa, opera-se uma significativa redistribuição do rendimento nacional, a favor do capital, em desfavor do trabalho.
A reconfiguração profunda e duradoura do Estado e do seu papel é o objectivo último.
Um programa deste calibre não pode ser implementado senão em confronto aberto com a Constituição da República. Em confronto com o projecto de desenvolvimento e de progresso social nela plasmado. Em confronto com o regular funcionamento das instituições e com os mais elementares princípios e valores democráticos. Em confronto com a vontade soberana do povo, incluindo dos muitos que se sentem hoje enganados pelas promessas e compromissos eleitorais de há dois anos.
Em circunstâncias normais, caberia ao Presidente da República dirimir este confronto. Porém, aquele que jurou defender, cumprir e fazer cumprir a Constituição quebrou ostensivamente esse compromisso, confirmando-se aos olhos do país como parte do problema, ao dar o apoio cúmplice à autêntica subversão do regime democrático-constitucional em curso.
Ao contrário do que alguns dizem, não é nem a Constituição, nem os portugueses – que o governo manda emigrar, que estão a mais no país. Quem está a mais é este governo ilegítimo e a política que executa. Quem está a mais é a maioria parlamentar que o sustenta e um Presidente que se assume como seu patrocinador.
A demissão do governo e a realização de eleições antecipadas constituem-se, assim, como um primeiro e imprescindível passo para resgatar o país do desastre.
Minhas senhoras e meus senhores,
A "austeridade" é a nova expressão verbal de um velho conceito.
Uma expressão disseminada, sobretudo, após a implementação daquela que foi a linha de resposta imediata ao agravamento da crise capitalista na Europa e nos EUA: a conversão de dívida privada em dívida pública.
Seguiu-se uma consabida mistificação: a de que a dívida pública resultou de um Estado sobredimensionado, que vive "acima das suas possibilidades".
Mistificação que procura não apenas obnubilar este processo de conversão de dívida privada em dívida pública, mas também esconder que o aumento da dívida pública, em Portugal como noutros países, acompanhou a tendência, especialmente nítida nas últimas duas décadas, para o recuo do Estado num conjunto de áreas da vida económica e social; esconder que esse aumento da dívida pública se deu a par de uma monumental transferência de recursos públicos para os grupos económicos e financeiros – por meios diversos: privatizações, concessões diversas, parcerias público-privado, isenções e perdões fiscais, entre outros.
Querem esconder também que esta dívida se auto-alimenta e auto-sustenta, desde logo graças ao processo de extorsão montado a partir do serviço da dívida e da especulação sobre os seus juros – um processo viabilizado por decisões políticas que deixaram o Estado refém dos mercados financeiros.
A “austeridade” vertida no programa da troika incorpora o essencial das medidas que têm vindo a ser preconizadas ao nível da União Europeia. Antes dele, já o “Pacto para o Euro Mais” e a chamada “Governação Económica” tinham apontado o caminho.
Um caminho que se articula em torno de dois objectivos centrais: 1º. o embaratecimento dos custos unitários do trabalho e o aumento da taxa de exploração, sendo a manutenção do desemprego em patamares elevados uma variável estratégica para impor esta desvalorização da força de trabalho; e 2º. o alargamento das áreas em que se pode exercer o processo de acumulação de capital, retirando à esfera pública ainda mais sectores da vida económica e social.
Nada de novo, portanto. Tudo velho.
Na sua essência, o “memorando da troika” não difere qualitativamente nem dos PECs que o antecederam, nem dos programas de ajustamento que o FMI anda há décadas a aplicar pelos quatro cantos do mundo, com resultados conhecidos.
Por esta cristalina razão, não há renegociação ou redesenho possíveis do memorando. A essência deste programa é para servir os objectivos que serve e não pode ter outras consequências.
Essência que o novo tratado europeu, o chamado Tratado Orçamental, quer inscrever na pedra. Aprovado, tal como os que o antecederam, nas costas dos povos, fugindo ao debate e ao escrutínio público democrático, a sua intenção é clara. A chanceler Merkel tratou de a enunciar oportunamente, Cavaco Silva veio relembrá-la recentemente: garantir que mudando os governos, não mude a política. Garantir, com troika ou sem troika, a institucionalização do neoliberalismo e a eternização da dita austeridade. Para alcançar este desiderato, prevêem-se mecanismos de autêntico recorte neocolonial, bem embrulhados na retórica da “maior integração política” e na exigência de um aprofundamento do federalismo.
Estimados amigos,
A ruptura com a política de direita – a política que conduziu o país ao desastre – insere-se na necessidade de uma ruptura mais ampla, com a submissão do país às orientações prevalecentes no seio da União Europeia, com a ideologia que as inspira e com as perigosas motivações que lhes subjazem.
Esta ruptura – um imperativo democrático e patriótico – coloca na ordem do dia a questão crucial da alternativa. Da política alternativa e da alternativa política que a concretize.
No actual contexto, essa alternativa passa, tem de passar, por uma política patriótica e de esquerda e por um governo que a concretize.
Uma política patriótica que recuse a ideia atávica de que a solução para os nossos problemas sempre dependerá de terceiros, ou pior, a ideia de que essa solução passa por aprofundar os caminhos que nos conduziram a muitos desses problemas.
Uma política patriótica, que recupere imprescindíveis instrumentos de soberania económica, monetária e orçamental e se proponha vencer atrasos, bloqueios e défices crónicos do país, aproveitando de forma sustentada o seu potencial endógeno; reconhecendo que para dever menos é necessário produzir mais e promovendo, dessa forma, a produção nacional.
Uma política patriótica e um governo patriótico que rejeite de imediato o programa da troika, subscrito por PS, PSD e CDS, e que encete uma renegociação da dívida pública, nos seus montantes, juros, prazos e condições de pagamento. Uma renegociação que rejeite a componente ilegítima da dívida e que assuma a necessidade de uma moratória, negociada ou unilateral, com a redução do serviço da dívida para um nível compatível com o crescimento económico e com a melhoria das condições de vida dos trabalhadores e do povo português. Assim se libertaria uma parte substancial dos 8 mil milhões de euros que o país está a entregar aos “credores” – verba indispensável à dinamização e recuperação económicas. Assim se colocaria a vida à frente da dívida e não, como prevê o Tratado Orçamental, a dívida antes de tudo o resto.
Uma política de esquerda, que valorize o trabalho, os trabalhadores e os seus direitos; que valorize os salários e as pensões e que assuma o compromisso explícito de devolver ao povo os seus direitos, salários e rendimentos, ilegitimamente retirados.
Uma política orçamental que combata o despesismo, a despesa sumptuária, e se baseie numa componente fiscal de aumento da tributação dos dividendos e lucros do grande capital e de alívio dos trabalhadores e das pequenas e médias empresas, garantindo uma justa distribuição da riqueza e, bem assim, as verbas necessárias ao funcionamento eficaz do Estado e do investimento público.
Uma política de esquerda que defenda e valorize os serviços públicos, em particular nas funções sociais do Estado – saúde, educação e segurança social, – como elemento essencial à concretização de direitos e ao desenvolvimento do país.
Uma política que recupere para a esfera pública o controlo de sectores estratégicos da economia, como o sector financeiro, indispensáveis à dinamização económica e, também eles, necessários para a anulação do fosso entre uma minoria que acumula fortunas colossais e uma imensa maioria que vê as suas condições de vida degradarem-se a cada dia.
A política alternativa de que o país precisa é inseparável da luta dos trabalhadores e do povo, do exercício pleno dos seus direitos constitucionais, incluindo o direito de resistência, da defesa da democracia e das liberdades.
A situação do país e a solução para os problemas nacionais reclama a convergência das forças, sectores e personalidades democráticas que, sem prejuízo de posicionamentos diferenciados e admitindo essas diferenças, partilhem o objectivo de romper com a política de direita, que há mais de 30 anos vem avolumando os problemas nacionais, e que se manifestem genuinamente empenhados na construção de uma política alternativa, patriótica e de esquerda. Uma política que se vincule aos valores de Abril e os projecte no presente e no futuro de Portugal.
Obrigado.
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Sampaio da Nóvoa
"Um encontro de união de reunião...Podemos agir em conjunto!!!"
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Cecília Honório
BE
http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=u3Z1qW0981w
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até Pacheco Pereira enviou uma mensagem:

Mensagem enviada ao encontro da Aula Magna

José Pacheco PereiraCaro Presidente Mário Soares,
Não podendo estar presente nesta iniciativa, apoio o seu objectivo de contribuir para combater a “inevitabilidade” do empobrecimento em que nos querem colocar, matando a política e as suas escolhas, sem as quais não há democracia. Gostaria no entanto de, por seu intermédio, expressar com mais detalhe a minha posição.
A ideia de que para alguém do PSD, para um social-democrata, lhe caem os parentes na lama por estar aqui, só tem sentido para quem esqueceu, contrariando o que sempre explicitamente, insisto, explicitamente, Sá Carneiro disse: que os sociais democratas em Portugal não são a “direita”. E esqueceu também o que ele sempre repetiu: de que acima do partido e das suas circunstancias, está Portugal.
Não. Os parentes caem na lama é por outras coisas, é por outras companhias, é por outras cumplicidades, é por se renegar o sentido programático, constitutivo de um partido que tem a dignidade humana, o valor do trabalho e a justiça social inscritos na sua génese, a partir de fontes como a doutrina social da Igreja, a tradição reformista da social-democracia europeia e o liberalismo político de homens como Herculano e Garrett. Os que o esquecem, esses é que são as más companhias que arrastam os parentes para a lama da vergonha e da injustiça.
Não me preocupam muito as classificações de direita ou de esquerda, nem sequer os problemas internos de “unidade” que a esquerda possa ter. Não é por isso que apoio esta iniciativa. O acantonamento de grupos, facções ou partidos, debaixo desta ou daquela velha bandeira, não contribui por si só para nos ajudar a sair desta situação. Há gente num e noutro espectro político, preocupada com as mesmas coisas, indignada pelas mesmas injustiças, incomodada pelas desigualdades de sacrifícios, com a mesma cidadania activa e o mesmo sentido de decência que é o que mais falta nos dias de hoje.
A política, a política em nome da cidadania, do bom governo, e da melhoria social, é que é decisiva. O que está a acontecer em Portugal é a conjugação da herança de uma governação desleixada e aventureira, arrogante e despesista, que nos conduziu às portas da bancarrota, com a exploração dos efeitos dessa política para implementar um programa de engenharia cultural, social e política, que faz dos portugueses ratos de laboratório de meia dúzia de ideias feitas que passam por ser ideologia. Tudo isto associado a um desprezo por Portugal e pelos portugueses de carne e osso, que existem e que não encaixam nos paradigmas de “modernidade” lampeira, feita de muita ignorância e incompetência a que acresce um sentimento de impunidade feito de carreiras políticas intra-partidárias, conhecendo todos os favores, trocas, submissões, conspirações e intrigas de que se faz uma carreira profissionalizada num partido político em que tudo se combina e em que tudo assenta no poder interno e no controlo do aparelho partidário.
Durante dois anos, o actual governo usou a oportunidade do memorando para ajustar contas com o passado, como se, desde que acabou o ouro do Brasil, a pátria estivesse à espera dos seus novos salvadores que, em nome do “ajustamento” do défice e da dívida, iriam punir os portugueses pelos seus maus hábitos de terem direitos, salários, empregos, pensões e, acima de tudo, de terem melhorado a sua condição de vida nos últimos anos, à custa do seu trabalho e do seu esforço. O “ajustamento” é apenas o empobrecimento, feito na desigualdade, atingindo somente “os de baixo”, poupando a elite político-financeira, atirando milhares para o desemprego entendido como um dano colateral não só inevitável como bem vindo para corrigir o mercado de trabalho, “flexibilizar” a mão de obra, baixar os salários. Para um social-democrata poucas coisas mais ofensivas existem do que esta desvalorização da dignidade do trabalho, tratado como uma culpa e um custo não como uma condição, um direito e um valor.
Vieram para punir os portugueses por aquilo que consideram ser o mau hábito de viver “acima das suas posses”, numa arrogância política que agravou consideravelmente a crise que tinham herdado e que deu cabo da vida de centenas de milhares de pessoas, que estão, em 2013, muitas a meio da sua vida, outras no fim, outras no princípio, sem presente e sem futuro.
Para o conseguir desenvolveram um discurso de divisão dos portugueses que é um verdadeiro discurso de guerra civil, inaceitável em democracia, cujos efeitos de envenenamento das relações entre os portugueses permanecerão muito para além desta fátua experiência governativa. Numa altura em que o empobrecimento favorece a inveja e o isolamento social, em que muitos portugueses tem vergonha da vida que estão a ter, em que a perda de sentido colectivo e patriótico leva ao salve-se quem puder, em que se colocam novos contra velhos, empregados contra desempregados, trabalhadores do sector privado contra os funcionários públicos, contribuintes da segurança social contra os reformados e pensionistas, pobres contra remediados, .permitir esta divisão é um crime contra Portugal como comunidade, para a nossa Pátria. Este discurso deixará marcas profundas e estragos que demorarão muito tempo a recompor.
O sentido que dou à minha participação neste encontro é o de apelar à recusa completa de qualquer complacência com este discurso de guerra civil, agindo sem sectarismos, sem tibiezas e sem meias tintas, para que não se rompa a solidariedade com os portugueses que sofrem, que estão a perder quase tudo, para que a democracia, tão fragilizada pela nossa perda de soberania e pela ruptura entre governantes e governados, não corra riscos maiores.
Precisamos de ajudar a restaurar na vida pública, um sentido de decência que nos una e mobilize. Na verdade, não é preciso ir muito longe na escolha de termos, nem complicar os programas, nem intenções. Os portugueses sabem muito bem o que isso significa. A decência basta.