23/02/2015

9.645.(23fev2015.7.11') Karl Jaspers

Nasceu a 23fev1883
e morreu a 26fev1969
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Biografia
23/2/1883, Oldenburg, Alemanha
26/2/1969, Basiléia, Suíça
[creditofoto]
http://educacao.uol.com.br/biografias/karl-jaspers.jhtm
"Qualquer objetificação, seja a formação de escolas, seja a de seitas, é a ruína da filosofia." A forte defesa da filosofia e da liberdade foi uma das marcas do pensamento de Karl Jaspers - um dos fundadores do existencialismo.

Filho de uma família abastada, Karl Jaspers pensou primeiramente em seguir a carreira de seu pai, que era jurista. Matriculou-se na faculdade de direito, mas, em 1902, transferiu-se para o curso de medicina.

Em 1909, já graduado em medicina, Jaspers começou a trabalhar no hospital psiquiátrico de Heidelberg. Insatisfeito com os procedimentos adotados para o tratamento dos doentes mentais, passou a pesquisar novos rumos para a psiquiatria. Seus pontos de vista foram reunidos em 1913 no livro "Psicopatologia Geral", um compêndio que se tornou clássico no diagnóstico das doenças mentais.

Nesse mesmo ano, Jaspers foi convidado para lecionar psicologia na Universidade de Heidelberg. Em 1919, publicou um novo volume, chamado "Psicologia das Concepções de Mundo".

Cada vez mais próximo dos estudos filosóficos, Jaspers passou a lecionar filosofia na Universidade de Heidelberg em 1922. Dez anos depois, lançou sua obra mais importante, "Filosofia", em três volumes, em que expõe suas principais teses filosóficas.

Nesse período, Jaspers foi professor da renomada filósofa Hanna Arendt, com quem manteve correspondência até o fim da vida.

Com o avanço do nazismo, a atividade profissional de Jaspers viu-se ameaçada. Em 1937, foi afastado da universidade. No ano seguinte, veio à luz "Existência", talvez o principal dos escritos filosóficos de Jaspers.
Em 1945, foi afastado, e por pouco escapou de ser mandado ao campo de concentração, por ser casado com uma judia.

Jaspers transferiu-se para a Universidade da Basiléia em 1948, onde passou a desenvolver seus estudos.

O filósofo faleceu em 1969, na Suíça. Jaspers é hoje reconhecido como um dos fundadores do existencialismo e um dos principais filósofos contemporâneos.
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Via
http://pauloqueiroz.net/citacoes-karl-jaspers/

Citações: Karl Jaspers

O conhecimento filosófico deve ser, antes de tudo, capaz de surpreender-se com o óbvio;
O homem não pode ser concebido com um ser imutável, encarnando reiteradamente aquelas formas de ser. Longe disso, a essência do homem é mutação: o homem não pode permanecer como é;
Tudo que sabemos do homem, tudo que cada um dos homens sabe de si mesmo não corresponde ao homem;
A reverência não eleva o homem ao nível da divindade. O homem humilíssimo e o grande homem são aparentados conosco;
A dignidade do homem reside no fato de ele ser indefinível. O homem é o que é, porque reconhece essa dignidade em si mesmo e nos outros homens. Kant o disse de maneira maravilhosamente simples: nenhum homem poder ser, para outro, apenas meio; cada homem é um fim em si mesmo;
Os políticos são diferentes. Oportunistas, facciosos, forjadores de mentiras e de intrigas. Inescrupulosos, agem em nome da liberdade contra a liberdade;
A divisão das responsabilidades gera a irresponsabilidade. A democracia degenera em oligarquia de partidos. O que se tem por cultura não passa de bolhas de sabão em salões literários. O espírito perde densidade.

Extraídas de introdução ao pensamento filosófico. S.Paulo: Cultrix, 2005.
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Via CITADOR

http://www.citador.pt/textos/o-futuro-do-homem-karl-jaspers
 in 'Iniciação Filosófica'

Precisamos do Outro para Encontrar a Verdade


Só alcançamos a verdade do nosso pensamento quando incansavelmente nos esforçamos por pensar colocando-nos no lugar de qualquer outro. É preciso conhecer o que é possível ao homem. Se tentamos pensar seriamente aquilo que outrem pensou aumentamos as possibilidades da nossa própria verdade, mesmo que nos recusemos a esse outro pensamento.
Só ousando integrar-nos totalmente nele o podemos conhecer. O mais remoto e estranho, o mais excessivo e excecpcional, mesmo o aberrativo, incitam-nos a não passar ao largo da verdade por omissão de algo de original, por cegueira ou por lapso. 

A Independência do Homem

Mal podemos acreditar no filósofo a quem tudo deixa indiferente; não acreditamos na tranquilidade do estóico, não desejamos sequer a impavidez, porque a própria condição humana nos lança na paixão e no medo, e são as lágrimas e o júbilo que nos permitem conhecer o que é. Eis por que somente o impulso ascendente nos liberta das perturbações anímicas e não é pela supressão que nos encontramos.
Temos, pois, que nos arriscar a ser homens e, enquanto homens, fazermos o que pudermos para alcançar a independência conquistada. Sofreremos então sem queixume, desesperar-nos-emos sem nos afundarmos, abalados mas nunca completamente derrubados quando suspensos à íntima independência que em nós se gera.
A filosofia, porém, é a escola dessa independência, não a sua posse. 
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Orientar Filosoficamente a Vida

A ânsia de uma orientação filosófica da vida nasce da obscuridade em que cada um se encontra, do desamparo que sente quando, em carência de amor, fica o vazio, do esquecimento de si quando, devorado pelo afadigamento, súbito acorda assustado e pergunta: que sou eu, que estou descurando, que deverei fazer?
O auto-esquecimento é fomentado pelo mundo da técnica. Pautado pelo cronómetro, dividido em trabalhos absorventes ou esgotantes que cada vez menos satisfazem o homem enquanto homem, leva-o ao extremo de se sentir peça imóvel e insubstituivel de um maquinismo de tal modo que, liberto da engrenagem, nada é e não sabe o que há-de fazer de si. E, mal começa a tomar consciência, logo esse colosso o arrasta novamente para a voragem do trabalho inane e da inane distracção das horas de ócio.
Porém, o pendor para o auto-esquecimento é inerente à condição humana. O homem precisa de se arrancar a si próprio para não se perder no mundo e em hábitos, em irreflectidas trivialidades e rotinas fixas.
Filosofar é decidirmo-nos a despertar em nós a origem, é reencontrarmo-nos e agir, ajudando-nos a nós próprios com todas as forças.
Na verdade a existência é o que palpavelmente está em primeiro lugar: as tarefas materiais que nos submetem às exigências do dia-a-dia. Não se satisfazer com elas, porém, e entender essa diluição nos fins como via para o auto-esquecimento, e, portanto, como negligência e culpa, eis o anelo de uma vida filosóficamente orientada. E, além disso, tomar a sério a experiência do convívio com os homens: a alegria e a ofensa, o êxito e o revés, a obscuridade e a confusão. Orientar filosoficamente a vida não é esquecer, é assimilar, não é desviar-se, é recriar intimamente, não é julgar tudo resolvido, é clarificar.
São dois os seus caminhos: a meditação solitária por todos os meios de consciencialização e a comunicação com o semelhante por todos os meios da recíproca compreensão, no convívio da acção, do colóquio ou do silêncio.
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 in 'Panorama das Ideias Contemporâneas'

O Futuro do Homem

O homem pode sempre mais e coisa diversa daquilo que se esperaria dele. O homem é inacabado e inacabável e sempre aberto ao futuro. Não há homem total e não o haverá jamais. Por isso há dois modos de pensar o futuro do homem. Posso concebê-lo como um processo natural, análogo àquele que respeita aos objectos, e formular probabilidades. Ou então posso imaginar as situações que vão ocorrer sem saber a resposta que lhes dará o homem, sem saber como, através delas, mas espontaneamente, ele se encontrará a si próprio. No primeiro caso, aguardo um desenrolar necessário que poderia conhecer em princípio, mesmo se não o conheço. No segundo caso, o futuro, longe de ser o desenvolvimento de necessidades causais implicadas pela realidade dada, depende do que será realizado e vivido em liberdade. As inúmeras pequenas acções dos indivíduos, todas as suas livres decisões, todas as coisas que realizam, têm um alcance ilimitado. No primeiro caso submeto-me a uma necessidade contra a qual nada posso. No segundo procuro a fonte original que está na base da liberdade humana. Faço um apelo à vontade.
Caminhamos para um futuro que não pode ser conhecido, que, na sua totalidade, não está decidido. A imagem que dele temos é incessantemente corrigida pela experiência. O conhecimento do ser na sua totalidade continua a ser-nos inacessível. O saber que temos da superabundante realidade não mais se completa. A nossa consciência está sempre em marcha. A uma consciência que desejaria ter-se por definitiva opõe-se a realidade do ser que não deixa de se mostrar novo, diferente, através dos fenómenos que surgem incessantemente, forçando assim a nossa consciência a transformar-se indefinidamente. Predizer verdadeiramente o futuro do homem seria já realizá-lo. Aqui predizer significa produzir.
Se conseguissemos certificar-nos do que é a condição humana, com as definidas perspectivas das suas possibilidades infinitas, nunca mais poderemos desesperar definitivamente do homem. Simbólicamente: o homem foi criado por Deus à sua imagem: por muito perdido que ele esteja, tal semelhança não pode desaparecer completamente. (...)
É incontestável, em primeiro lugar, que não nos criámos a nós mesmos e que estamos no mundo graças a alguma coisa que não somos nós. Tomamos consciência deste facto quando pensamos simplesmente que seria possível não existirmos.
É incontestável, em segundo lugar, que não somos livres graças a nós próprios, mas sim graças ao que, no fundo da nossa liberdade, se nos oferece a nós próprios: ainda que o queiramos, isso não chega para nos tornarmos livres. No auge da liberdade ganhamos consciência do facto de sermos para nós um dom: a nossa liberdade faz-nos viver, mas não podemos nós próprios consegui-la pela força.
Essa coisa pouca que não podemos conquistar - nem pela «revolta de Prometeu», nem isolando o nosso «eu» até torná-lo o centro do ser, nem arrancando-nos nós ao pântano pelos próprios cabelos, como Munchhausen -, de onde pode ela vir-nos? E de onde o socorro?
Este não se manifesta como um processo do mundo. Não vem do exterior. Porque, sentimo-lo, é no mais profundo de nós que nós nos encontramos quando nos tornamos nós próprios. Em parte alguma a transcendência fala de maneira directa, ninguém a tem diante de si, ela não se deixa captar. Deus não fala senão através da nossa liberdade. A decisão fundamental é aquela de que depende a maneira de apreender conscientemente a nossa condição de homem. Enquanto homem, não nos bastamos nunca, não somos o nosso único fim. Estamos vinculados à transcendência. Ela exalta-nos e, ao mesmo tempo, torna-nos transparentes a nós próprios, dando-nos consciência do pouquinho que somos.
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