03/11/2015

7.933.(3noVEM2015.7.7') André Malraux

Nasceu a 3noVEM1901
e morreu a 23noVEM1976
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 escritor e político francês, herói da Resistência à ocupação nazi, durante a II Guerra Mundial, ministro da Cultura em 1960.
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Via Graça Silva:
In a Tentação do Ocidente
"Não posso conceber o homem independente da sua intensidade. Basta ler um tratado de psicologia para sentir quanto as nossas ideias gerais mais penetrantes se deturpam quando queremos empregá-las para compreender os nossos actos. O seu valor desaparece à medida que avançamos na nossa procura, e é então fatal o choque com o incompreensível, com o absurdo, quer dizer com o ponto extremo do particular. A chave deste absurdo não será a intensidade sempre diferente que caracteriza a vida?" 
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Via Citador

http://www.citador.pt/frases/citacoes/a/andre-malraux
Se compreendêssemos, nunca mais poderíamos julgar.
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São precisos 60 anos e não 9 meses para fazer um homem.
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O homem é aquilo que ele próprio faz.
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Só damos pelo envelhecimento dos outros.
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Os grandes artistas não são os copistas do mundo, são os seus rivais.
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A cultura, sob todas as formas de arte, de amor e de pensamento, através dos séculos, capacitou o homem a ser menos escravizado.
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Quem se mata corre atrás de uma imagem que forjou de si próprio: as pessoas matam-se sempre para existir.
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Aprendi que uma vida não vale nada, mas também que nada vale uma vida.
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Há algo maior que o poder que se chama justiça.
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Não há cinquenta maneiras de combater, há apenas uma: a do vencedor.
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A dor que não ajuda ninguém é absurda.
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O museu transforma a obra em objecto.
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A tragédia da morte consiste em que ela transforma a vida em destino.
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A arte é um antidestino.
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Vi as democracias intervirem contra quase tudo, salvo contra os fascismos.
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O comunismo destrói a democracia; mas a democracia também pode destruir o comunismo.
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A coragem pessoal de um chefe é tanto maior quanto tem uma má consciência de chefe.
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A Gioconda sorri porque todos os que lhe puseram bigodes estão mortos.
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Miséria deste século; não há muito eram as más acções que tinham de ser justificadas; hoje são as boas.
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Ele era naturalmente corajoso (...) como tantos tímidos.
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A revolução, as férias da vida.
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Não existe herói sem plateia.
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A coragem é uma coisa que se organiza.
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Há artistas desajeitados, não há estilos desajeitados.
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In O Tempo do Desprezo
Pode-se gostar que o sentido da palavra arte seja tentar dar aos homens a consciência da grandeza que ignoram neles mesmos.
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In Os Conquistadores
A esperança dos homens é a sua razão de viver e de morrer.
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In As Nogueiras de Altemburgo
A cultura não se herda, conquista-se.
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In O Triângulo negro
Se existe uma solidão em que o solitário é um abandonado, existe outra onde ele é solitário porque os homens ainda não se juntaram a ele.
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In Antimemórias
A verdade de um homem é em primeiro lugar aquilo que ele esconde.
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A verdadeira barbárie é Dachau; a verdadeira civilização é, antes de tudo, a parte do homem que os campos de extermínio quiseram destruir.
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Cada civilização é obcecada, visível ou invisivelmente, pelo que pensa sobre a morte.
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O que me importa o que só me importa a mim?
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in A Condição Humana
O pior sofrimento está na solidão que a acompanha.
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Só a música pode falar da morte.
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Conhecer pela inteligência é a tentação vã de deixar passar o tempo.
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In Les Voix du silence
À questão: 'O que é a arte?' somos levados a responder: 'Aquilo por meio do qual as formas se tornam estilo'.
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in A esperança
O difícil não é estar com os amigos quando têm razão, mas quando estão errados.
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Os homens só morrem pelo que não existe.
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Não se faz política com a moral, mas também não se faz mais sem ela.
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E Cristo? É um anarquista que teve êxito. O único.
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Não se ensina a estender a outra face a pessoas que, desde há dois mil anos, só têm recebido bofetões.
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É próprio das questões insolúveis serem gastas pela palavra.
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 in 'A Tentação do Ocidente'

O Cortejo Ingénuo dos Nossos Sonhos


Não desenhamos uma imagem ilusória de nós próprios, mas inúmeras imagens, das quais muitas são apenas esboços, e que o espírito repele com embaraço, mesmo quando porventura haja colaborado, ele próprio, na sua formação. Qualquer livro, qualquer conversa podem fazê-las surgir; renovadas por cada paixão nova, mudam com os nossos mais recentes prazeres e os nossos últimos desgostos. São, contudo, bastante fortes para deixarem, em nós, lembranças secretas que crescem até formarem um dos elementos mais importantes da nossa vida: a consciência que temos de nós mesmos tão velada, tão oposta a toda a razão, que o próprio esforço do espírito para a captar a faz anular-se.
Nada de definido, nem que nos permita definir-nos; uma espécie de potência latente... como se houvesse apenas faltado a ocasião para cumprirmos no mundo real os gestos dos nossos sonhos, conservamos a impressão confusa, não de os ter realizado, mas de termos sido capazes de os realizar. Sentimos esta potência em nós como o atleta conhece a sua força sem pensar nela. Actores miseráveis que já não querem deixar os seus papéis gloriosos, somos, para nós mesmos, seres nos quais dorme, amalgamado, o cortejo ingénuo das possibilidades das nossas acções e dos nossos sonhos. 
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biografia
Via Aida Nuno
http://filantropia.blogs.sapo.pt/7167.html
Para a maioria dos escritores a infância é objecto de recordações nostálgicas e maravilhosas.  André Malraux  empregou toda a sua energia para a esquecer : "Presque tous les écrivains que je connais aiment leur enfance, je déteste la mienne" escreve nas suas anti memórias em 1967.
Nasceu em 1903 em Montmartre – Paris. Depois da separação de seus pais Malraux foi criado por três mulheres: sua avó, sua mãe e sua tia. Começou nessa altura a descobrir o mundo através de livros e de museus. Dotado de uma grande curiosidade e de uma memória prodigiosa muito novo começou a frequentar meios literários e artísticos avant-garde. Malraux torna-se num apaixonado pela pintura cubista.
Em 1921 é editado o seu primeiro livro “Luas de Papel”.
Mais tarde conhece Clara Goldschmidt, rica herdeira de uma família alemã emigrada. Clara é imediatamente seduzida por este homem elegante e de uma inteligência brilhante. Depois de casados Malraux joga a fortuna de sua mulher na bolsa e perde. O casal fica arruinado.
Para reconstruir rapidamente o património André Malraux toma a estranha decisão de ir buscar algumas estátuas khmères à selva do Cambodja para as vender no Ocidente. A expedição é um desastre. No Natal de 1923 chegam a Phnom-Penh. André Malraux é condenado a três anos de prisão. Sua mulher e cerca de vinte grandes escritores franceses mobilizam-se e conseguem a sua libertação.
Esta experiência incute-lhe o vírus da aventura e o seu interesse pela acção política. Malraux retorna à Ásia. Torna-se num anti-colonialista o que lhe traz vários problemas com a justiça. Como redactor e chefe de uma publicação clandestina “L’Indochine Enchainée” foca os acontecimentos da revolução chinesa, principalmente de Cantão em 1925.
Regressa a França onde publica os seus primeiros romances: A Tentação do Ocidente (1926); A Estrada Real (1930- Prémio Interallié);  A Condição Humana (Prémio Concourt-1933).
Convicto antifascista participa na Guerra Civil de Espanha ao lado dos republicanos em 1936. Este acontecimento inspira-o para um grande romance “A Esperança” (1937) e um filme “Serra de Terruel” (1939).
Durante a segunda guerra mundial entra tardiamente na resistência (1943) sob o nome de Coronel Berger. Passa por grandes dificuldades junto dos gaulistas e comunistas. Em 1944 cai numa emboscada em Toulouse. Ferido Malraux é preso, interrogado e transferido para a prisão de Saint-Michel de Toulouse. Deve a sua libertação, em Agosto, quando da retirada precipitada dos alemães.
Separa-se de Clara Goldschmidt em 1938 e passa a viver exclusivamente com Josette Clotes com quem se tinha relacionado desde 1933 e de quem tem dois filhos. Em 1944 Josette morre acidentalmente.
Posteriormente casa com Madeleine viúva de seu meio-irmão Roland preso e executado em 1944, como resistente.
Em 1945 ele reencontra o General De Gaulle.   Uma grande admiração recíproca é criada entre os dois. Malraux aceita o convite para seu conselheiro técnico da Cultura e será por um curto espaço de tempo Ministro da Informação (Novembro 1945 – Janeiro 1946).
Nunca mais deixará o General De Gaulle. Em 1958 é nomeado Ministro do Estado encarregado de Assuntos Culturais. O militante revolucionário torna-se em militante Gaulista.
Posteriormente Malraux publicou várias obras entre elas  A Voz do Silêncio em 1951.
Em 1961 perde os seus dois filhos. “A morte é a prova irrefutável do absurdo da vida” cita Malraux.
A Metamorfose dos Deuses (1957-1976), e Anti memórias (1967) são obras notáveis deste homem de grande intelecto.
Em 1970, publica “Chênes que l'on Abat”, a última homenagem ao General De Gaulle.
Morre em 1976 no Hospital Henri-Mondor de Créteil com uma congestão pulmonar.
Jean d'Ormesson escreve sobre Malraux: ...”É dentro do coração e na memória que sobrevivem os escritores. - Malraux amou a Arte, a Revolução e o General De Gaulle.”
Estrada Real é o relato quase iniciático da revelação do destino do homem, obtida através da sua luta contra a natureza e os outros homens. André Malraux finaliza esta narrativa com a terrível descoberta de que a morte é uma experiência individual e infinitamente solitária.
A ESTRADA REAL de André Malraux (excertos)
Este maravilhoso livro é iniciado por uma troca de palavras entre Perken e Claude a respeito de alguns aspectos mais sombrios do erotismo:
“...Os homens mais novos não entendem o...como é que vocês dizem?...o erotismo.
Até aos quarenta, caímos sempre no mesmo erro, não sabemos libertar-nos do amor; um homem que, em vez de pensar numa mulher como complemento de um sexo, pensa no sexo como complemento de uma mulher, está pronto para o amor: tanto pior para ele. Mas há pior; a época em que a obsessão do sexo, a obsessão da adolescência, regressa, mais forte ainda alimentando-se de toda a espécie de recordações...”
Claude, ao sentir o cheiro do pó, a cânhamo e a cotão entranhado na sua roupa, tornou a ver a cortina de sacas ligeiramente repuxada atrás da qual um braço estendido lhe tinha mostrado, havia pouco, uma adolescente negra, nua (depilada), com uma ofuscante mancha de sol no seio direito espetado; e a prega das pálpebras grossas que tão bem exprimia o erotismo, o desejo maníaco, “o desejo de trazer os nervos à flor da pele”, dizia Perken... E este continuava:
- Vão-se transformando as recordações...A imaginação é uma coisa extraordinária! Em si mesma,  estranha a si mesma...A imaginação...compensa sempre...
“...- O que quer dizer com isso, ao certo?
- Você há-de compreender por si, mais tarde ou mais cedo...os bordéis somalis estão cheios de surpresas...
Claude conhecia bem aquela ironia rancorosa que um homem raramente emprega a não ser contra si ou contra o seu destino.”
Claude é um jovem de 26 anos que decide aventurar-se à busca, nas florestas da Indochina, de templos perdidos que se dispersavam ao longo da Antiga Estrada Real Khmer, que liga Angkor e os lagos à bacia de Menão.
Perken é uma espécie de alto funcionário siamês que vai explorar os mesmos caminhos em busca de Grabot, um presumível desertor. Tendo um passado estranho sente-se prisioneiro da sua própria vida.
É nesta expedição que entre eles se gera uma amizade e profunda fraternidade nascida do próprio sentido de aventura e da consciência do perigo.
“...Nunca se faz nada da vida, diz Perken.
- Mas ela faz alguma coisa por nós, responde Claude.
- Nem sempre... O que espera você da sua?
Claude não respondeu logo. O passado daquele homem transformara-se em experiência, em pensamento apenas sugerido, em olhar, que a sua biografia perdia toda a importância. Só restava entre eles – para os ligar – aquilo que os entes têm de mais profundo.
- Penso que sei sobretudo o que não espero dela...
- De cada vez que você teve de optar, não se...
- Não sou eu que opto: é aquilo que resiste.
- Mas o quê?
Tantas vezes fizera a si próprio essa pergunta que pôde responder imediatamente:
- A consciência da morte.
- A verdadeira morte é a decadência.
Perken olhava agora no espelho o seu próprio rosto.
- É tão mais grave, envelhecer! – Aceitarmos o nosso destino, a nossa função, a casota de cão erguida na nossa vida única... Não se sabe o que é a morte quando se é novo...
E de repente, Claude descobriu o que o ligava àquele homem que o aceitara sem que ele percebesse bem porquê: “a obsessão da morte.”
Percorremos com o escritor as florestas da Indochina, sentimos a esperança, a inquietação e o cansaço dos personagens. A vontade de vencerem, o instinto de viver para além das dificuldades, o espírito de gratidão ao descobrir a primeira figura esculpida...A consciência, a procura, o desalento passam pelos nossos olhos de uma maneira tão absoluta que não distinguimos o bem do mal. Só sentimos o homem e a sua condição humana.
“A unidade da floresta, agora, impunha-se; havia seis dias que Claude renunciara a separar os seres das formas, a vida que se move da vida que ressuma; uma potência desconhecida ligava os fungos às árvores, fazia formigar todas estas coisas provisórias sobre um solo semelhante à espuma dos pântanos, nestas florestas fumegantes do começo do Mundo. Que acto humano tinha aqui sentido? Que vontade conservava a sua força? Tudo se ramificava, amolecia, procurava adaptar-se a este mundo ao mesmo tempo ignóbil e cativante, como o olhar dos idiotas, e que minava os nervos com a mesma força abjecta que essas aranhas suspensas entre os ramos, de que Claude a princípio tanta dificuldade tivera em desviar os olhos.”
A luta em desbravar, levar o que lhes não pertence, a passagem pelas aldeias em troca de missangas, de álcool, e do medo que, por vezes inspiram, toca-nos e transportam-nos para um mundo desconhecido.
 “...A noite, agora fechada, mergulhava até às mais longínquas terras da Ásia, restabelecida, a par do silêncio, sobre os ermos. Acima do fraco ruído das fogueiras, elevavam-se as vozes de dois indígenas, claras e monótonas, mas sem alcance, prisioneiras: mesmo ao lado deles, um robusto despertador media com precisão o silêncio sem fim da selva.
Mais do que as fogueiras, mais do que as vozes, era esse tiquetaque que ligava Claude à vida dos homens, pela sua constância, pela sua clareza, pelo que há de invencível em todo o objecto mecânico. O seu pensamento vinha à superfície, mas alimentado de abismos de onde brotava, dominado ainda pela força do sobrenatural que se elevava da noite e da terra queimada, como se tudo, até mesmo a terra, se tivesse encarregado de o convencer da miséria humana.
- E a outra morte, aquela que está em nós?
-Existir contra tudo isto (Perken indicava com o olhar a maçadora majestade da noite), você compreende o que isso significa? Existir contra a morte é a mesma coisa. Ás vezes parece que represento o meu próprio papel nessa hora. E talvez tudo se resolva muito em breve, com uma flecha mais ou menos repugnante...
...Eu estive quase a morrer: você Claude não conhece a exaltação que vem do absurdo da vida, quando estamos diante dela como diante de uma mulher des... Fez o gesto de arrancar.
- Despida. Nua, de repente...
Claude já não conseguia desviar os olhos das estrelas:
- Falhamos quase todos a nossa morte...
-Eu passo a minha vida a vê-la. E aquilo que você quer dizer - porque também você tem medo - é verdade: é possível que eu seja mais fraco do que a minha. Tanto pior! Também há qualquer coisa de...satisfatório na destruição da vida...
- Você nunca pensou seriamente em matar-se? Pergunta Claude
- Não é para morrer que eu penso na minha morte, é para viver.
Aquela tensão da voz era a desta paixão e de nenhuma outra: uma alegria lancinante, sem esperança, como o destroço de um navio içado de profundezas tão longínquas como a das trevas.”
Perken recupera Grabot martirizado e doente. Há os interesses do caminho de ferro, a ocupação militar... A aventura transforma-se em pânico... Perken é ferido de morte... sente-se um condenado sem esperança. O seu pior adversário é a sua decadência.
“Já não tinha mão, já não tinha por corpo mais do que senão a sua dor; o que significava a palavra “decadência”?...
...Claude viu o sangue surgir entre os lábios de Perken, mas o sofrimento protegia o amigo contra a morte: enquanto sofresse estava vivo. De repente, a imaginação colocou-o no lugar de Perken: nunca se sentira tão preso à vida que não amava.
...Claude lembrou-se, com ódio, da frase da sua infância:
“Senhor, valei-nos na nossa agonia...” Exprimir com as mãos e os olhos, senão com palavras, essa fraternidade desesperada que o projectava para fora de si próprio! Estreitou-lhe os ombros.
Perken olhava aquela testemunha, estranho a ela, como a um ser de outro mundo.”
Nota pessoal
Génio entre os génios André Malraux é uma das mais vivas forças intelectuais do século XX. Foi um fervoroso defensor da dignidade humana.
Principalmente este livro foca a amizade profunda entre dois homens que se encontram, se ajudam e se interrogam.
A morte enterra-se em nós e faz-nos meditar sobre as culpas, sobre os direitos, sobre a alma humana e as suas fragilidades.
Somos seres derrotados perante o abismo de uma morte lúcida. É como uma espera para nascer, uma dor profunda perante a visão do que ainda não se vislumbra, como o parto natural de um ser...
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Via JERO.Lusa
 
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 "A cultura capacitou o homem a ser menos escravizado"
era um escritor, teórico de arte francês e ministro de Assuntos Culturais. O romance de Malraux La Condition Humaine (O destino do homem) (1933), ganhou o Prix Goncourt. Ele foi nomeado pelo presidente Charles de Gaulle como Ministro da Informação (1945-1946) e, posteriormente, como o primeiro ministro de Assuntos Culturais da França durante a presidência de de Gaulle (1.959-1.969).