nasceu a 4mar1869
e morreu a 17ag1944
***
"é considerado o INTRODUTOR DO SIMBOLISMO EM PORTUGAL"
http://www.portaldaliteratura.com/autores.php?autor=231
***
Bibliografia activa:
Cristalizações da Morte (1884), Canções de Abril (1884), Jesus de Nazareth (1885), Per Umbram (1887), Horas Tristes (1888), Oaristos (1890), Horas (1891), Sylva (1894), Interlúnio (1894), Belkiss (1894), Tirésias (1895), Sagramor (1895), Salomé e Outros Poemas (1896), A Nereide de Harlém (1896), O Rei Galaor (1897), Saudades do Céu (1899), Constança (1900), Depois da Ceifa (1901), A Sombra do Quadrante (1906), O Anel de Polícrates (1907), A Fonte do Sátiro (1908), O Cavaleiro das Mãos Irresistíveis (1916), Camafeus Romanos (1921), tentação de São Macário (1922), Canções desta Negra Vida (1922), Cravos de Papel (1922), A mantilha de Medronhos (1923), A Caixinha das Cem Conchas (1923), Descendo a Encosta (1924), Chamas duma Candeia Velha (1925), Éclogas (1929), Últimos Versos (1938).
Em 1987 foi publicada uma Antologia, organizada por Albano Martins.
Eugénio de Castro foi, ainda, tradutor de obras de Goethe e da “Arte de Ler”, de Émile Faguet.
*http://tertuliabibliofila.blogspot.pt/2010/04/eugenio-de-castro-oaristos-e-o.html
***
04 de Março de 1869: Nasce o poeta e autor dramático, Eugénio de Castro
Poeta e autor dramático, nascido a 4 de março de 1869, em
Coimbra, e falecido a 17 de agosto de 1944, na mesma cidade. Formado pela
Faculdade de Letras de Coimbra, aí viria a desempenhar funções docentes e
diretivas. É ainda durante os estudos académicos que funda, em 1889, com João
Menezes e Francisco Bastos, a revista Os
Insubmissos, criada com um intuito deliberado de rivalizar com a revista
académica Boémia
Nova, recém-lançada por Alberto de Oliveira e António Nobre. Na polémica
entre as duas publicações serão colocadas questões de versificação (o problema
da cesura do alexandrino) que, se não têm a ver diretamente com o Simbolismo,
contribuirão para uma nova consciência da linguagem poética, afim das premissas
daquele movimento, cuja emergência é usual datar-se de 1890, data da publicação
do volume poéticoOaristos de
Eugénio de Castro. Deixando para trás quatro volumes de poesia (Canções
de abril, 1884; Jesus
de Nazaré, 1885; Per
Umbram, 1887; Horas
Tristes, 1888) pouco significativos na bibliografia do autor, se
considerados à luz da estética de que viria a ser porta-voz, na introdução a Oaristos,
o poeta acusaria os lugares-comuns sobre que assentava a poesia sua
contemporânea, quer ao nível de imagens, de rimas e de léxico, defendendo uma
nova expressão poética, que, reclamando a "liberdade do ritmo", o processo
estilístico daaliteração,
as "rimas raras", os "raros vocábulos", e um estilo "decadente",
se traduziria, neste, como em volumes posteriores, como Horas,
numa poética atenta ao valor sugestivo e musical do significante, alheia a
qualquer compromisso com a realidade social e defensora de uma poética de "arte
pela arte". Em 1895, Eugénio de Castro fundou a revista internacional A
Arte, que, anunciando a colaboração de autores como Paul Adam, Gabriele
d'Anunzio, Maurice Barrès, Gustave Khan, Maeterlinck, Stéphane Mallarmé, Jean
Moréas, Jules Renard, J. H. Rosny, ou Verlaine, pretendia constituir, ligando
alguma poesia portuguesa (sobretudo a do autor) à poesia europeia, um elo no
movimento simbolista internacional, com cujos representantes Eugénio de Castro
mantinha, aliás, correspondência. A sua poesia, seja nesta primeira fase, onde a
influência do simbolismo de matriz verlainiana é muito nítida, seja em fases
posteriores, de refluxo neoclassicista (A
Fonte do Sátiro e Outros Poemas, Camafeus Romanos, A Mantilha de Medronhos,
Descendo a Encosta), nunca se libertou do epíteto de esteticista e escolar,
sendo, no entanto, uma referência incontornável na análise do processo de
libertação da linguagem poética que viria a culminar com o modernismo. No
domínio da expressão dramática, peças como Belkiss inscrevem-se
numa compreensão do fenómeno teatral próxima do teatro simbolista de
Maeterlinck, a que se seguiriam outras tentativas, de pendor classicista,
como Constança.
Fontes: Infopédia
wikipédia (imagens)
Três Rosas
Sempre,
mas sobretudo nas brumosas
Horas
da tarde, quando acaba o dia,
Quando
se estrela o céu, tenho a mania
De
descobrir, de ver almas nas cousas.
Pendem
deste gomil três lindas rosas;
Uma
é rosada, a outra branca e fria,
Rubra
a terceira; e a minha fantasia
Torna-as
humanas, vivas, amorosas.
Sei
que são rosas, rosas só! mas nada
Impede,
enquanto cai lá fora a chuva,
Que
a minha mente a fantasiar se ponha:
Por
ser noiva a primeira, é que é rosada;
Branca
a segunda está, por ser viúva;
A
vermelha pecou ... e tem vergonha!
Eugénio
de Castro, in 'Antologia Poética'
https://estoriasdahistoria12.blogspot.com/2019/03/04-de-marco-de-1869-nasce-o-poeta-e.html?fbclid=IwAR3KvBFsCVjqY75PZNh549suWo9ynZWy5C0gWFcAeOWNOaAEGW_ecrq-6X0***
http://www.citador.pt/poemas/a/eugenio-de-castro
**
in 'Silva'
Engrinalda-me com os Teus Braços
Teu corpo de âmbar, gótico, afilado,
Sempre velado de cheirosos linhos,
Teu corpo, aprilino prado,
Por onde o meu desejo, pastor brando,
Risonho há-de viver, pastoreando
Meus beiços, desinquietos cordeirinhos,
Teu corpo é esbelto, ó zagaia esguia,
Como as harpas que o pai de Salomão tangia!
Teu corpo eléctrico, ogival,
Núbil, sequinho, perturbante,
É uma dispensa real:
Os teus olhos são duas cabacinhas
Cheias dum vinho estonteante
Os teus dentes são alvas camarinhas,
Os teus dedos, suavíssimos espargos,
E os teus seios, pêssegos verdes mas não amargos.
Lira de nervos, glória das trigueiras,
Como tu és graciosa! As laranjeiras,
Desde que viste o sol com esses sóis amados,
Só vinte vezes perfumaram noivados!
Nobre e graciosa és, morena das morenas,
Como as senhoras de olhos belos,
Que passeavam nos jardins de Atenas
Com uma cigarra de ouro nos cabelos!
Como tu, eu sou moço! e atrevido
Com Anceu, rei de Samos,
E jamais caçador me fez vencido,
Quando, caçando o javali, ando entre os ramos.
O meu peito é de jaspe, a minha voz macia,
Meus olhos ágeis e dourados como abelhas,
E, para que as colhas, minha boca sadia
E um orvalhado cabazinho de groselhas.
Novos e alegres somos! Ah! que em breve
Nossas bocas se colem voluptuosas;
Vamos sonhar e toucar-nos de rosas,
Enquanto há sol, enquanto não cai neve!
Não te demores,
Ó cheia de graça,
Que os dias correm voadores,
E a mocidade passa...
A mocidade passa... e, um dia, ó meus pecados,
A tua boca vermelha Será uma rosa velha,
E minhas mãos uns lírios fanados...
E então, velhinhos combalidos,
Como dois galhos ressequidos
Sem folhas e sem pomos,
Lembrar-nos-emos do que hoje somos,
Ó maravilha
De graciosidade!
Como dum filho e duma filha
Que nos morressem na flor da idade!
**Sempre velado de cheirosos linhos,
Teu corpo, aprilino prado,
Por onde o meu desejo, pastor brando,
Risonho há-de viver, pastoreando
Meus beiços, desinquietos cordeirinhos,
Teu corpo é esbelto, ó zagaia esguia,
Como as harpas que o pai de Salomão tangia!
Teu corpo eléctrico, ogival,
Núbil, sequinho, perturbante,
É uma dispensa real:
Os teus olhos são duas cabacinhas
Cheias dum vinho estonteante
Os teus dentes são alvas camarinhas,
Os teus dedos, suavíssimos espargos,
E os teus seios, pêssegos verdes mas não amargos.
Lira de nervos, glória das trigueiras,
Como tu és graciosa! As laranjeiras,
Desde que viste o sol com esses sóis amados,
Só vinte vezes perfumaram noivados!
Nobre e graciosa és, morena das morenas,
Como as senhoras de olhos belos,
Que passeavam nos jardins de Atenas
Com uma cigarra de ouro nos cabelos!
Como tu, eu sou moço! e atrevido
Com Anceu, rei de Samos,
E jamais caçador me fez vencido,
Quando, caçando o javali, ando entre os ramos.
O meu peito é de jaspe, a minha voz macia,
Meus olhos ágeis e dourados como abelhas,
E, para que as colhas, minha boca sadia
E um orvalhado cabazinho de groselhas.
Novos e alegres somos! Ah! que em breve
Nossas bocas se colem voluptuosas;
Vamos sonhar e toucar-nos de rosas,
Enquanto há sol, enquanto não cai neve!
Não te demores,
Ó cheia de graça,
Que os dias correm voadores,
E a mocidade passa...
A mocidade passa... e, um dia, ó meus pecados,
A tua boca vermelha Será uma rosa velha,
E minhas mãos uns lírios fanados...
E então, velhinhos combalidos,
Como dois galhos ressequidos
Sem folhas e sem pomos,
Lembrar-nos-emos do que hoje somos,
Ó maravilha
De graciosidade!
Como dum filho e duma filha
Que nos morressem na flor da idade!
in 'Camafeus Romanos'
O Anel de Corina
Enquanto espera a hora combinada
De o remeter com flores a Corina,
Ovídio oscúla o anel que lhe destina
E em que uma gema fulge bem gravada.
— « Como eu te invejo, ó prenda afortunada !
« Com ela vais dormir, mimosa e fina,
« Com ela has-de banhar-te na piscina
« Donde sairá, qual Venus, orvalhada,
« O dorso e o seio lhe verás de rosas,
« E selarás as cartas deliciosas
« Com que em minh'alma alento e esp'rança verte...
« E temendo (suprema f'licidade!)
« Que a cera adira á pedra, ai! então ha-de
« Com a ponta da língua humedecer-te! »
**De o remeter com flores a Corina,
Ovídio oscúla o anel que lhe destina
E em que uma gema fulge bem gravada.
— « Como eu te invejo, ó prenda afortunada !
« Com ela vais dormir, mimosa e fina,
« Com ela has-de banhar-te na piscina
« Donde sairá, qual Venus, orvalhada,
« O dorso e o seio lhe verás de rosas,
« E selarás as cartas deliciosas
« Com que em minh'alma alento e esp'rança verte...
« E temendo (suprema f'licidade!)
« Que a cera adira á pedra, ai! então ha-de
« Com a ponta da língua humedecer-te! »
in 'Antologia Poética'
Amor Verdadeiro
Tua frieza aumenta o meu desejo:
fecho os meus olhos para te esquecer,
mas quanto mais procuro não te ver,
quanto mais fecho os olhos mais te vejo.
Humildemente atrás de ti rastejo,
humildemente, sem te convencer,
enquanto sinto para mim crescer
dos teus desdéns o frígido cortejo.
Sei que jamais hei de possuir-te, sei
que outro feliz, ditoso como um rei
enlaçará teu virgem corpo em flor.
Meu coração no entanto não se cansa:
amam metade os que amam com espr'ança,
amar sem espr'ança é o verdadeiro amor.
*
in 'Depois da Ceifa'
fecho os meus olhos para te esquecer,
mas quanto mais procuro não te ver,
quanto mais fecho os olhos mais te vejo.
Humildemente atrás de ti rastejo,
humildemente, sem te convencer,
enquanto sinto para mim crescer
dos teus desdéns o frígido cortejo.
Sei que jamais hei de possuir-te, sei
que outro feliz, ditoso como um rei
enlaçará teu virgem corpo em flor.
Meu coração no entanto não se cansa:
amam metade os que amam com espr'ança,
amar sem espr'ança é o verdadeiro amor.
*
Três Rosas
Sempre, mas sobretudo nas brumosas
Horas da tarde, quando acaba o dia,
Quando se estrela o céu, tenho a mania
De descobrir, de ver almas nas cousas.
Pendem deste gomil três lindas rosas;
Uma é rosada, a outra branca e fria,
Rubra a terceira; e a minha fantasia
Torna-as humanas, vivas, amorosas.
Sei que são rosas, rosas só! mas nada
Impede, enquanto cai lá fora a chuva,
Que a minha mente a fantasiar se ponha:
Por ser noiva a primeira, é que é rosada;
Branca a segunda está, por ser viúva;
A vermelha pecou ... e tem vergonha!
*Horas da tarde, quando acaba o dia,
Quando se estrela o céu, tenho a mania
De descobrir, de ver almas nas cousas.
Pendem deste gomil três lindas rosas;
Uma é rosada, a outra branca e fria,
Rubra a terceira; e a minha fantasia
Torna-as humanas, vivas, amorosas.
Sei que são rosas, rosas só! mas nada
Impede, enquanto cai lá fora a chuva,
Que a minha mente a fantasiar se ponha:
Por ser noiva a primeira, é que é rosada;
Branca a segunda está, por ser viúva;
A vermelha pecou ... e tem vergonha!
A Laís
À ciprina Laís, de quem sou tributário.
A Laís que possui compridas tranças pretas,
P'lo meu escravo mandei, no seu aniversário,
Um cacho moscatel num cabaz de violetas.
Os amantes, que dão às suas namoradas
Fulgurantes anéis de riqueza estupenda,
Luminosos rocais e redes consteladas,
Hão-de sorrir, bem sei da minha humilde of'renda.
Pensei em dar-lhe, é certo, um precioso colar
E um anel com mais luz do que o incêndio de Tróia,
Mas reconsiderei de pronto, ao atentar
Que ainda ninguém viu dar jóias a uma jóia...
*
**A Laís que possui compridas tranças pretas,
P'lo meu escravo mandei, no seu aniversário,
Um cacho moscatel num cabaz de violetas.
Os amantes, que dão às suas namoradas
Fulgurantes anéis de riqueza estupenda,
Luminosos rocais e redes consteladas,
Hão-de sorrir, bem sei da minha humilde of'renda.
Pensei em dar-lhe, é certo, um precioso colar
E um anel com mais luz do que o incêndio de Tróia,
Mas reconsiderei de pronto, ao atentar
Que ainda ninguém viu dar jóias a uma jóia...
*
Amores
a Jean Moréas
Judite, a loura e magra que ora vive
Entre palmas e mirra, nas novenas;
Dulce, a de peitos de hidromel e penas,
Com quem libidinosas noites tive;
Maria a ingénua, a plácida e macia,
Ingénua como um pintassilgo e pura
Como um mês de Maria;
Lídia, a trigueira hostil, severa e dura,
E Fábia, a de olhos perturbantes, lassos,
E de morenas, aprilinas pomas,
Fábia, cujos abraços
Me vestiam de aromas
Todas adorei,
Todas me adoraram
Quando as desprezei.
Antes de as possuir, antes de as subjugar
Co’a força do meu verbo e a luz do meu olhar,
Em cada uma eu via o céu aberto;
Mas apenas ao peito as comprimia,
O meu entusiasmo arrefecia
E o céu sonhado transformava-se em deserto…
Ante a posse, os desejos esmorecem;
Do amor na amarga pugna,
Fui como os doentes que tudo apetecem
E a quem tudo repugna
Judite, a loura e magra que ora vive
Entre palmas e mirra, nas novenas;
Dulce, a de peitos de hidromel e penas,
Com quem libidinosas noites tive;
Maria a ingénua, a plácida e macia,
Ingénua como um pintassilgo e pura
Como um mês de Maria;
Lídia, a trigueira hostil, severa e dura,
E Fábia, a de olhos perturbantes, lassos,
E de morenas, aprilinas pomas,
Fábia, cujos abraços
Me vestiam de aromas
Todas adorei,
Todas me adoraram
Quando as desprezei.
Antes de as possuir, antes de as subjugar
Co’a força do meu verbo e a luz do meu olhar,
Em cada uma eu via o céu aberto;
Mas apenas ao peito as comprimia,
O meu entusiasmo arrefecia
E o céu sonhado transformava-se em deserto…
Ante a posse, os desejos esmorecem;
Do amor na amarga pugna,
Fui como os doentes que tudo apetecem
E a quem tudo repugna
in 'Depois da Ceifa'
Em que Emprego o Meu Tempo?
Em que emprego o meu tempo? Vou e venho,
Sem dar conta de mim nem dos pastores,
Que deixam de cantar os seus amores,
Quando passo e lhes mostro a dor que tenho.
É de tristezas o torrão que amanho,
Amasso o negro pão com dissabores,
Em ribeiros de pranto pesco dores,
E guardo de saudades um rebanho.
Meu coração à doce paz resiste,
E, embora fiqueis crendo que motejo,
Alegre vivo por viver tão triste!
Amor se mostra nesta dor que abrigo:
Quero triste viver, pois vos não vejo,
Nem sequer muito ao longe vos lobrigo.
**Sem dar conta de mim nem dos pastores,
Que deixam de cantar os seus amores,
Quando passo e lhes mostro a dor que tenho.
É de tristezas o torrão que amanho,
Amasso o negro pão com dissabores,
Em ribeiros de pranto pesco dores,
E guardo de saudades um rebanho.
Meu coração à doce paz resiste,
E, embora fiqueis crendo que motejo,
Alegre vivo por viver tão triste!
Amor se mostra nesta dor que abrigo:
Quero triste viver, pois vos não vejo,
Nem sequer muito ao longe vos lobrigo.
in 'Saudades do Céu'
O Dilúvio
Há muitos dias já, há já bem longas noites
que o estalar dos vulcões e o atroar das torrentes
ribombam com furor, quais rábidos açoites,
ao crebro rutilar dos coriscos ardentes.
Pradarias, vergéis, hortos, vinhedos, matos,
tudo desapar'ceu ao rude desabar
das constantes, hostis, raivosas cataratas,
que fizeram da Terra um grande e torvo mar.
À flor do torvo mar, verde como as gangrenas,
onde homens e leões bóiam agonizantes,
imprecando com fúria e angústia, erguem-se apenas,
quais monstros colossais, as montanhas gigantes.
É aí que, ululando, os homens como as feras
refugiar-se vão em trágicos cardumes,
O mar sobe, o mar cresce. e os homens e as panteras,
crianças e reptis caminham para os cumes.
Os fortes, sem haver piedade que os sujeite,
arremessam ao chão pobres velhos cansados.
e as mães largam. cruéis, os filhinhos de leite,
que os que seguem depois pisam, alucinados.
Um sinistro pavor; crescente e sufocante,
desnorteia, asfixia a turba pertinaz:
ouvem-se urros de dor, e os que vão adiante
lançam pedras brutais aos que ficam pra trás.
Raivoso, o touro estripa os míseros humanos
que o estorvam, ao correr em fuga desnorteada,
e pelo ar tenebroso as águias e os milhanos
fogem, com vivo horror, daquela estropeada.
Cresce a treva infernal nos cavos horizontes;
o oceano sobe e muge em raivas cavernosas,
e as ondas, a trepar pelos visos dos montes,
fazem de cada vez cem vítimas chorosas!
Os negros vagalhões, nos bosques mais cimeiros.
silvam e marram já, em golpes iracundos;
resplendem raios mil em rútilos chuveiros,
e os corvos, a grasnar, desolham moribundos.
Blasfémias, maldições elevam-se à porfia;
fustigado plo raio, aumenta o furacão;
cada ruga do mar acusa uma agonia,
cada bolha, ao estalar, solta uma imprecação.
Cresce no mar, sobe o mar... e traga, rudemente.
da mais alta montanha o píncaro nevado.
e um tremendo trovão aplaude a vaga arlente,
que envolve, ao despenhar-se, o último condenado.
Cresce o mar, sobe o mar, que já topeta os céus:
e, levada plo fero e desabrido norte,
sua espuma, a ferver, molha o rosto de Deus,
que lhe encontra um sabor nauseabundo de morte...
Cresce o mar, sobe o mar... Cada vaga é uma torre!
No céu, o próprio Deus melancólico pasma...
E, pelos vagalhões acastelados, corre
a Arca de Noé, qual navio-fantasma...
*
que o estalar dos vulcões e o atroar das torrentes
ribombam com furor, quais rábidos açoites,
ao crebro rutilar dos coriscos ardentes.
Pradarias, vergéis, hortos, vinhedos, matos,
tudo desapar'ceu ao rude desabar
das constantes, hostis, raivosas cataratas,
que fizeram da Terra um grande e torvo mar.
À flor do torvo mar, verde como as gangrenas,
onde homens e leões bóiam agonizantes,
imprecando com fúria e angústia, erguem-se apenas,
quais monstros colossais, as montanhas gigantes.
É aí que, ululando, os homens como as feras
refugiar-se vão em trágicos cardumes,
O mar sobe, o mar cresce. e os homens e as panteras,
crianças e reptis caminham para os cumes.
Os fortes, sem haver piedade que os sujeite,
arremessam ao chão pobres velhos cansados.
e as mães largam. cruéis, os filhinhos de leite,
que os que seguem depois pisam, alucinados.
Um sinistro pavor; crescente e sufocante,
desnorteia, asfixia a turba pertinaz:
ouvem-se urros de dor, e os que vão adiante
lançam pedras brutais aos que ficam pra trás.
Raivoso, o touro estripa os míseros humanos
que o estorvam, ao correr em fuga desnorteada,
e pelo ar tenebroso as águias e os milhanos
fogem, com vivo horror, daquela estropeada.
Cresce a treva infernal nos cavos horizontes;
o oceano sobe e muge em raivas cavernosas,
e as ondas, a trepar pelos visos dos montes,
fazem de cada vez cem vítimas chorosas!
Os negros vagalhões, nos bosques mais cimeiros.
silvam e marram já, em golpes iracundos;
resplendem raios mil em rútilos chuveiros,
e os corvos, a grasnar, desolham moribundos.
Blasfémias, maldições elevam-se à porfia;
fustigado plo raio, aumenta o furacão;
cada ruga do mar acusa uma agonia,
cada bolha, ao estalar, solta uma imprecação.
Cresce no mar, sobe o mar... e traga, rudemente.
da mais alta montanha o píncaro nevado.
e um tremendo trovão aplaude a vaga arlente,
que envolve, ao despenhar-se, o último condenado.
Cresce o mar, sobe o mar, que já topeta os céus:
e, levada plo fero e desabrido norte,
sua espuma, a ferver, molha o rosto de Deus,
que lhe encontra um sabor nauseabundo de morte...
Cresce o mar, sobe o mar... Cada vaga é uma torre!
No céu, o próprio Deus melancólico pasma...
E, pelos vagalhões acastelados, corre
a Arca de Noé, qual navio-fantasma...
*